Rio de Janeiro - Um levantamento divulgado ontem pela Defesa Civil do Rio de Janeiro deu uma dimensão da tragédia causada pelas chuvas que afetam o estado desde segunda-feira: 212 mortos e pelo menos 50 mil pessoas desalojadas ou desabrigadas. Ontem, 26 corpos foram resgatados no Morro do Bumba, em Niterói, onde houve um deslizamento na noite de quarta-feira, e 16 deles aguardavam reconhecimento para liberação. O Corpo de Bombeiros estima que 150 pessoas ainda estejam soterradas.
Com a tragédia, as autoridades passaram a usar a garagem de uma empresa de ônibus, no pé do morro, como necrotério improvisado. A ideia é acelerar os enterros. "Temos hora para começar, mas não sabemos quando vamos terminar. Funcionaremos em diversos turnos, para que o serviço esteja disponível 24 horas", disse o coordenador-geral da Defensoria Pública do Estado, Petrúcio Malafaia.
Antes da implementação do IML improvisado, os corpos estavam sendo divididos entre os necrotérios de Niterói e do Rio. O corpo do tio do motoboy Alan Silva, por exemplo, foi enviado para a capital. Ele não sabia como iria fazer para reconhecê-lo, já que todos os documentos da família ficaram soterrados na área do desabamento. "Como vou provar que ele é meu tio?", indagava.
Desde a manhã de ontem, uma fila de vítimas do desabamento já se formava no entorno da garagem. Além do reconhecimento dos corpos, o serviço de emissão de segunda via de documentos era um dos mais aguardados.
Para acelerar os sepultamentos, a Polícia Civil enviou dez servidores ao local, entre peritos e papiloscopistas, para trabalhar na liberação dos corpos. Da garagem os corpos seguirão direto para o Cemitério de Maruí, onde a prefeitura de Niterói liberou enterros gratuitos para os familiares das vítimas das chuvas. O prédio do IML de Niterói está fechado há dois anos.
A falta de documentos dificulta o reconhecimento de corpos das vítimas. Para dar assistência jurídica às famílias e pedir alvarás para sepultar os corpos que não podem ser identificados, a Defensoria Pública do Rio destacou um plantão de defensores. Eles ficarão durante todo o fim de semana no IML.
Niterói entrou em colapso depois de segunda-feira: o Hospital Azevedo Lima, o único em que o Setor de Emergência funciona, não tem mais leitos disponíveis. No Hospital Universitário Antônio Pedro, o pronto-socorro está fechado há três anos. Moradores do Morro do Céu, próximo do Morro do Bumba e também construído sobre um antigo lixão, disseram que várias casas estão afundando e uma igreja desabou à tarde. Ninguém ficou ferido.
Áreas de risco
O prefeito do Rio, Eduardo Paes, afirmou ontem que, se for preciso, a prefeitura poderá chamar a força policial para retirar as famílias das áreas de risco. "Prefiro uma pessoa com raiva de mim na rua, mas viva, do que uma pessoa feliz porque a prefeitura deixou ela ficar nessa área, mas morta depois por causa de um deslizamento", disse. O governador Sérgio Cabral também defendeu as remoções, mesmo à revelia dos moradores.
Já o Ministério Público (MP) estadual instaurou inquéritos civis para apurar a implementação e a regularidade de plano de identificação, monitoramento e contenção de áreas de risco por parte do poder público nos municípios. O MP quer identificar problemas de drenagem urbana, controle de ocupações e áreas de risco e à destinação do lixo. Também será apurada a responsabilidade dos agentes públicos nos desastres e fiscalizados os contratos e recursos que serão usados na reestruturação dos locais atingidos.
As Forças Armadas auxiliarão no socorro às vítimas das chuvas com homens e dois hospitais de campanha, que serão montados em São Gonçalo para atender os feridos. Militares do Exército e da Marinha também auxiliarão no resgate dos corpos soterrados em morros.