O número de denúncias de violência contra crianças e adolescentes em Curitiba aumentou 143% no primeiro trimestre deste ano em relação ao mesmo período do ano passado. Foram 233 notificações nos três últimos meses contra 96 em 2005, segundo o Núcleo de Proteção à Criança e ao Adolescente Vítima de Crimes (Nucria), da Polícia Civil. No total, 653 ocorrências contra menores de idade foram registradas no ano passado.

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"Se houve aumento na quantidade de crimes, provavelmente foi muito pequeno. O que aconteceu foi que mais denúncias foram feitas e mais encaminhamentos nos foram passados por outros órgãos de atendimento a crianças e adolescentes", explica a delegada do Nucria, Ana Cláudia Machado. A delegacia especializada começou a funcionar em outubro de 2004. O que aparece nas estatísticas do núcleo, diz Ana Cláudia, é apenas uma pequena amostra da realidade. "A estimativa é de que, para cada denúncia de violência contra criança, 20 casos deixam de ser informados", afirma a delegada, citando um estudo do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (USP).

A quantidade nem precisaria ser maior para a situação ser mais chocante. Por trás dos números, há casos de pais que mantêm relações sexuais com os filhos, bebês com menos de um ano vítimas de estupro, recém-nascidos espancados por alguém que deveria estar cuidando deles. O endereço mais comum dos crimes é a própria casa da vítima ou seus arredores. Segundo a delegada do Nucria, 80% dos casos envolvem pessoas bem próximas à criança. "O fato da violência acontecer no ambiente doméstico é o que mais dificulta que os casos venham à tona. Em muitas situações, a menina só relata o que está acontecendo quando uma irmã mais nova começa a sofrer o abuso. Algumas vezes, a própria mãe sabe e não faz nada por medo de perder o companheiro", conta a promotora da Vara da Infância e Juventude, Carla Moretto Maccarini.

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Ter uma delegacia especializada para o atendimento deste tipo de crime facilita um aumento no número de denúncias, avalia a promotora, mas ainda é necessária uma mobilização maior da população em relação ao assunto. "Vizinhos, parentes distantes, amigos devem encorajar a vítima a fazer a queixa na polícia ou denunciar o caso mesmo que anonimamente", alerta Carla.

A médica Maria Cristina Marcelo da Silveira, do Hospital Pequeno Príncipe, também apela para a mobilização de quem reconhece sinais de anormalidade na rotina das crianças e adolescentes. "Se as pessoas não têm coragem de aparecer, que façam a denúncia anônima. Ou se não querem procurar um órgão oficial, que falem com diretores de creches, escolas ou coordenadores de postos de saúde", propõe. Somente este ano, 85 casos de violência contra criança já foram registrados pelo hospital.

Normalmente, informa a delegada do Nucria, são os casos mais graves – como estupro, lesão corporal, maus-tratos e atentado violento ao pudor – que vêm à tona. "As pessoas costumam não dar muita atenção aos crimes praticados contra a criança. Só quando a situação é muito grave chega até a polícia", afirma Ana Cláudia. O resultado desta violência são crianças, adolescentes e, posteriormente, adultos violentos e com problemas de relacionamento social, afetivo e dificuldade de aprendizado. "São pessoas que fazem com os filhos aquilo que sofreram quando eram crianças. Muitas vezes, os pais não têm idéia de que aquela repressão é muito rigorosa, porque eles viveram em um padrão de forte violência", diz a psicóloga do Hospital Pequeno Príncipe, Daniela Carla Prestes.