Com uma taxa de 25,2 homicídios por 100 mil habitantes, o Brasil é o 16.º país mais violento do mundo, segundo a Organização das Nações Unidas (ONU). Os adolescentes, entretanto, não são os principais responsáveis por esse quadro. De 2012 até setembro de 2014, 136 homicídios e latrocínios foram imputados a menores de 18 anos em Curitiba – apenas 8,7 % do total de casos da cidade. Em todo o país, esse porcentual foi de 3% em 2012 – último ano com dados disponíveis.
Esses dados foram o ponto de partida de uma série de reportagens da Gazeta do Povo publicada em outubro do ano passado, de autoria de Raphael Marchiori e Carolina Pompeo, que mostrou os números por trás dos crimes cometidos por adolescentes. Além do baixa parcela de responsabilidade dos jovens no total de crimes, a série também discutiu as falhas do sistema atual de ressocialização do país, entre elas a falta de um tratamento adequado para a grande parcela deles que sofre de transtornos mentais. Relembrar o assunto é fundamental na semana em que a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 171-A/93, que reúne uma série de outros projetos apensados e sugere a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos no país, passou na Comissão de Cidadania e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados e conquista seu primeiro avanço em mais de 20 anos tramitando na Casa.
À época a série, alguns especialistas ouvidos pela reportagem creditaram o discurso a favor da redução da maioridade penal aos casos emblemáticos, de grande repercussão na mídia, e à desinformação. “A sociedade tem duas opções: resgatar o jovem ou entregá-lo definitivamente à criminalidade ao encarcerá-lo em penitenciárias. A adolescência é a fase de formação para nossos filhos, mas para os dos outros, principalmente aqueles de famílias menos favorecidas, a infração torna-se questão de má índole”, disse, na ocasião, o procurador de Justiça Olympio de Sá Sotto Maior Neto.
Alçadas à condição de “masmorras” pelo próprio ministro da Justiça, Eduardo Cardozo, as penitenciárias brasileiras têm números até piores do que centros de socioeducação para adolescentes. Segundo a Secretaria da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos do Paraná (Seju), a reincidência no sistema prisional do estado é de 40%. Entre as unidades para adolescentes, a reincidência foi de 22% em 2013, segundo a Secretaria da Família e Desenvolvimento Social do Paraná (Seds).
O clamor popular pela mudança na Constituição, no entanto, existe. Uma pesquisa encomendada pela Gazeta do Povo e publicada pelo jornal em julho de 2013 revelou que 90,4% dos brasileiros são favoráveis à redução da maioridade penal. “Mais uma vez, o jovem é tornado em bode expiatório da derrocada dos governos e falência das políticas públicas que eles representam. É transformar a vítima em réu”, disse o coordenador do Núcleo de Estudos de Violência da UFPR, Pedro Bodê, à epoca da divulgação do levantamento.
A aprovação na CCJ é apenas o primeiro passo para o trâmite da PEC 171-A/93 no Congresso. O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), prometeu criar a comissão especial que analisará o mérito da proposta até a próxima semana.
Depois de formada, a comissão terá até 40 sessões plenárias (cerca de três meses) para apreciar o tema. Cunha tem, porém, prerrogativa para chamar a proposta ao plenário se a comissão não conseguir deliberar a questão em um prazo razoável.
Para a aprovação da mudança constitucional no plenário são necessários no mínimo 308 votos, em dois turnos de votação. Se for aprovada na Câmara, a PEC segue para apreciação e votação no Senado.
Nesse meio tempo, entidades como o Ministério Público Federal, a Ordem dos Advogados do Brasil, entre outras, prometem se articular para impedir que a PEC avance. A primeira ofensiva deve ocorrer ainda entre os parlamentares.
Deputados contrários à tramitação da proposta prometeram ainda na terça-feira (31) entrar com um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal para travar a votação do tema pelos parlamentares e deixar a decisão com o Judiciário.
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