“Ela fugia bastante, tínhamos de ficar o tempo todo de olho. De repente, ficava agressiva e violenta, batia em quem estava por perto, gritava. Nós não sabíamos o que fazer. Acabávamos ficando reféns, não podíamos sair de casa, não conseguíamos estabelecer uma ligação com ela. Quem está de fora não entende o peso dessa rotina para quem convive diariamente com o doente.”
Instituto Alzheimer Brasil (IAB)
Encontros: no último sábado de cada mês. Horário: 9h30 às 12h.
Local: Salão Paroquial da Igreja Sagrados Corações.
Endereço: Rua Presidente Rodrigo Otávio, 1.650, Alto da XV.
Contato: (41) 9138-0454
O relato de Paulo de Sousa sobre a rotina vivida com a sogra diagnosticada com Alzheimer é representativo dos desafios enfrentados por todos aqueles que têm de lidar com a doença. Solidão, isolamento social e insegurança sobre como reagir às expressões do Alzheimer são alguns dos problemas relatados por cuidadores.
Ao testemunhar duas grandes amigas passarem por essas dificuldades ao cuidarem de suas mães, a pedagoga e especialista em neuropsicologia Elizabeth Piovezan decidiu fundar o Instituto Alzheimer Brasil. O IAB foi criado para oferecer orientação e apoio aos cuidadores de pessoas com Alzheimer.
Incentivos
Cuidar de uma pessoa com Alzheimer requer não apenas conhecimento sobre a doença, mas paciência e disposição para os desafios da convivência diária. O Instituto Alzheimer Brasil dá algumas dicas importantes:
- Não perca a paciência e não brigue. Pessoas com Alzheimer perdem, gradativamente, a capacidade de discernimento e de realizar certas tarefas. Recriminar pode até piorar o seu comportamento.
- Ajude-o a criar e manter uma rotina de atividades diárias como banho, higiene bucal e alimentação.
- Desenvolva atividades através das quais ele possa exercitar habilidades que ainda estejam preservadas – mas não exija os resultados de antigamente.
- Estimule o contato com música.
- Converse sobre suas memórias antigas.
“Convivi com muitos cuidadores e percebi que não temos estrutura emocional para lidar com os efeitos do Alzheimer. Porque é um tratamento que não é curativo, mas paliativo. Não falamos mais em cura, mas em tornar a vida do paciente mais confortável. Também falta informação sobre como agir, como estimular o paciente”, explica. Além de palestras sobre a doença e dicas para aplicar no dia a dia com o doente, o IAB também realiza um trabalho visando a atenção e o bem-estar do cuidador. Segundo Elizabeth, a maioria dos cuidadores que busca o IAB é mulher, sozinha e idosa.
“São pessoas que já precisariam elas mesmas de maior atenção, de companhia, mas têm de cuidar de seus pais, maridos ou irmãos. Uma das maiores queixas é a solidão imposta por essa responsabilidade. Porque o doente não pode ficar sozinho e, ao mesmo tempo, não é mais a mesma pessoa de sempre. Então o cuidador fica isolado, muitos ficam dias sem ter uma conversa”, conta.
Para amenizar o impacto que a doença provoca no cotidiano dos cuidadores, o IAB promove um encontro mensal para que eles possam compartilhar experiências e trocar informações. Na sequência, é ministrada uma palestra sobre tema correlato – neste ano já foram abordadas estratégias para administrar os comportamentos difíceis típicos da doença; fases do Alzheimer e como conseguir a medicação na rede pública de saúde.
Por fim, uma equipe multidisciplinar voluntária do IAB esclarece dúvidas trazidas pelos cuidadores. A próxima meta do instituto é oferecer atendimento individual.
Além das reuniões mensais, o IAB também organiza campanhas de conscientização e sensibilização sobre a doença com adolescentes e adultos. Entre os projetos, destaca-se o “Dedinho de prosa”, no qual profissionais voluntários palestram sobre o Alzheimer em escolas de Curitiba e realizam um exercício de empatia com os alunos, que são levados a sentir “na pele” a impaciência destinada a muitos pacientes por seus próprios familiares, que não entendem as limitações impostas pela doença.
“Realizamos diversas ações de conscientização para públicos-alvo específicos, como estudantes e profissionais da saúde. Já organizamos seminários sobre demências e neurociência e campanhas sobre golpes contra pessoas idosas e vulneráveis”, conta Elizabeth.
“Eles não lembram quem são, mas você lembra”
A mudança na personalidade da mãe diagnosticada com Alzheimer aos 90 anos foi o que mais surpreendeu Lia Kucera, 65 anos. “É como se você fosse perdendo a pessoa aos pouquinhos. A transformação na personalidade é curiosa, de repente ela ficava desconfiada, ou agressiva, beliscava, batia com a bengala, xingava com palavras que nunca havia escutado saírem da boca dela. Ela não lembrava que eu era a filha, mas eu lembrava que ela era minha mãe”, recorda.
É como se você fosse perdendo a pessoa aos pouquinhos (...) Ela não lembrava que eu era a filha, mas eu lembrava que ela era minha mãe.
Lia Kucera, 65 anos e filha de dona Laurita, diagnosticada com Alzheimer.
Quando dona Laurita foi diagnosticada, a doença já estava em estágio avançado. Os sintomas manifestados até então eram interpretados pelos familiares como típicos da idade, conta Lia. Depois do veredito dos médicos, o comportamento mudou cada vez mais rápido e a necessidade de lidar melhor com esse cenário levou Lia a procurar o IAB. “Se você não entende a doença, não consegue cuidar. Até então, não sabia o que fazer, como cuidar, achava que certas situações aconteciam só conosco. As reuniões clarearam muita coisa, ajudaram a entender que era aquilo mesmo e que os sintomas iriam piorar. Ouvir outras experiências também serviu como orientação sobre como agir melhor.”
Dona Laurita faleceu em setembro passado, mas Lia continua frequentando o IAB, agora como voluntária. Ela acredita que o país precisa capacitar mais cuidadores e que os cuidadores precisam receber atenção e suporte emocional.
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