O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), divulgado este ano, mostra que o desempenho dos alunos brasileiros que frequentam a rede pública de ensino desce um degrau do primeiro para o segundo ciclo do ensino fundamental. No Paraná, a média dos estudantes do 5.º ano (último do ciclo inicial) foi 5,4. Já os alunos do 9.º ano (último do ciclo final) ficaram com 4,1. Diferenças na gestão escolar das redes municipal e estadual estão entre as causas para a queda de rendimento.
A maior parte das escolas das séries iniciais é administrada pelos municípios, que, até pela proximidade, têm condições mais favoráveis para implantar políticas voltadas à educação e colher bons resultados. Já as escolas que atendem do 6.º ao 9.º ano são, na maior parte, ligadas ao governo do estado, que encontra dificuldades para administrar, a distância, 2.134 unidades, espalhadas nos 399 municípios do Paraná.
Em Foz do Iguaçu, cidade que foi destaque no Ideb deste ano, o degrau entre um ciclo e outro é mais visível. A escola municipal mais bem pontuada da cidade teve nota 8,6, enquanto a melhor da rede estadual ficou com 5,8.
Para conseguir um resultado de ponta no Ideb, a rede municipal de Foz estabeleceu a política de reforço no contraturno para os alunos que fizeram a prova, aplicou simulados e remunerou com 14.º salário os professores cujas escolas tiveram nota alta, entre outras iniciativas.
Condições de trabalho
Para a pesquisadora Araci Asinelli da Luz, professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), a desigualdade entre as gestões do estado e do município pode ser avaliada a partir da disparidade das condições de trabalho dos professores. Nos municípios, diz Araci, os professores têm melhores salários, recebem mais capacitação e trabalham com menos alunos, em relação à rede estadual, onde a média é de 40 estudantes por sala. "Os professores da rede estadual vivem outra rotina. Para começar, eles têm de lutar por melhorias na hora-atividade. Tudo isso ajuda a diminuir a qualidade do trabalho docente."
Adolescência
A etapa de vida do estudante também interfere no seu desempenho escolar. Nas séries iniciais, o processo de motivação da criança é mais intenso, diz Araci. "A criança tem todo um imaginário quando chega à escola. Nesta fase é mais propício o estabelecimento de vínculos entre professores e alunos, o que facilita o aprendizado."
Já na adolescência, que coincide com o ciclo da rede estadual, o estudante já "reconheceu que a escola não é tudo aquilo que falaram para ele". Por isso, ele tende a associar o colégio a um espaço repressor e negativo. "Há dificuldade de se estabelecer um processo de aprendizagem mais adequado e individualizado. Ao se somar isso à problemática familiar, a escola se torna um espaço de angústia para muitos adolescentes", analisa.
Foco no Ideb pode mascarar desempenho
Especialista em políticas educacionais, a professora da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste), Silvana Aparecida de Souza, diz que a rede municipal tem mais condições de implantar uma política voltada ao Ideb, embora isso não implique necessariamente em melhoria na qualidade de ensino. Situações artificiais podem ser criadas pelos municípios para elevar o índice, como dispensar alunos considerados mais fracos no dia da prova, fazer cursinho pré-Ideb e estabelecer diretrizes para dificultar a reprovação escolar a taxa de aprovação também tem peso na nota do Ideb.
No estado, diz a professora, a prova é mais espontânea. "Não tem cursinho pré-Ideb, não tem dispensa do aluno, ou seja, o índice do Ideb reflete uma situação mais real." Além disso, na rede estadual é difícil estabelecer uma política linear para os 399 municípios, até porque há mais resistência por parte dos professores que são mais organizados no âmbito sindical em relação aos dos municípios. Por isso, até mesmo a proposta de uma política de cursinho pró-Ideb teria resistência, na opinião da especialista.
Percepção
Para professores da rede estadual, a percepção sobre os efeitos positivos do bom desempenho no Ideb não é tão clara. Pedagoga da rede estadual de ensino, mas com uma experiência anterior de 10 anos na rede municipal em Foz do Iguaçu, Cláudia Galleert confirma que no município o trabalho das escolas está focado no Ideb, enquanto na rede estadual não haveria preocupação com índices.
Uma das críticas da pedagoga é quanto ao que deixa de ser enfatizado durante a preparação para o Ideb. "Se fixa Português e Matemática e um estilo de prova. As demais disciplinas não são prioridade." A professora de História do Colégio Jorge Schimmelpfeng, Vera Nichetti, concorda: "O foco em duas disciplinas deixa as demais em desvantagem. Não se valoriza áreas como História e Geografia".
Outras professoras da rede estadual consultadas pela Gazeta do Povo disseram que há casos de alunos egressos da rede municipal com bom desempenho em Português e Matemática, mas com dificuldades em idiomas, por não ter tido contato anterior e com noções fracas de lateralidade, conteúdo trabalhado na disciplina de Educação Física, que também não é ofertada na totalidade das escolas municipais de Foz do Iguaçu.