Curitiba – De um lado, milhares de trabalhadores sem-terra. Do outro, terrenos improdutivos às moscas. No reverso da moeda, proprietários amargam invasões em terras produtivas. Nas cidades, quem foge do campo e não encontra trabalho incrementa as favelas da periferia e os índices de desemprego e violência.

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O desafio é complexo. E as ocupações prometidas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e outros grupos como o Movimento das Mulheres Camponeses ou a Via Campesina não deixarão o próximo presidente esquecer que ele existe.

"Este não é só um problema para o próximo presidente, mas também para os outros que virão depois dele. A reforma agrária no Brasil não é um projeto que possa ser realizado em um ou dois governos. E não é uma questão que se resolva com a política econômica que temos. Porque a cada família assentada, duas perdem a terra", afirma o geógrafo Bernardo Mançano Fernandes, coordenador do Núcleo de Estudos em Reforma Agrária da Unesp, em Presidente Prudente.

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Isso acontece, de acordo com o especialista, porque ainda não há um programa viável para inserir o pequeno agricultor no mercado. "A lógica de nosso sistema continua a ser hoje a de expropriar a agricultura camponesa para privilegiar o agronegócio, é preciso mudar isso", diz.

Outro aspecto que não poderá passar despercebido ao próximo presidente é a revisão dos índices de produtividade que definem se uma propriedade pode ser desapropriada. De acordo com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) do Paraná, os parâmetros, definidos em 1975, são incompatíveis com o atual perfil do campo.

As alterações devem ser feitas por meio de uma portaria conjunta do Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). Atualmente existe uma proposta do MDA em tramitação no Mapa que é alvo de pressões tanto de representantes dos grandes proprietários quanto dos sem-terra.

Enquanto a reforma agrária engatinha, os movimentos de agricultores sem-terra prometem continuar a "conquistar" novos assentamentos, de forma legal ou não. Enquanto os sem-terra esperam do governo a descriminalização das invasões em áreas improdutivas, proprietários exigem mecanismos governamentais de defesa das suas terras enquanto tentam provar que as áreas são produtivas. Esta escolha depende do próximo presidente. "Queremos uma aliança com o governo, com os camponeses e com a sociedade para enfrentar o problema do campo de forma massiva e rápida", defende Roberto Baggio, integrante da coordenação nacional do MST e da Via Campesina.

O filósofo Denis Rosenfield, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, autor de livros sobre os sem-terra e especialista no tema, alerta que a violência promovida por alguns movimentos ameaça a democracia. "Reforma agrária é uma coisa e sem-terra movidos pela política, outra. Alguns grupos arregimentam pessoas nas cidades apenas para fazer parte de uma massa de manobra política. Há acampamentos que funcionam apenas nos finais de semana", lembra Rosenfield.

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