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Regina Pinto e José Rodolfo de Lacerda na mercearia herdada por Gabriel Zequinão (atrás do balcão) | Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo
Regina Pinto e José Rodolfo de Lacerda na mercearia herdada por Gabriel Zequinão (atrás do balcão) (Foto: Aniele Nascimento/ Gazeta do Povo)
Veja quais são os bairros de Curitiba em que os idosos já são 20% ou mais da população |

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Veja quais são os bairros de Curitiba em que os idosos já são 20% ou mais da população

Os bairros de Curitiba estão envelhecendo. Uma pes­­­­quisa divulgada em julho pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostra que em nove, dos 75 bairros da capital, pessoas com mais de 60 anos representam no mínimo um quinto do total de mo­­radores. No topo da lista está o Jardim Social, com 27,4%, e em nono lugar, o Juvevê, com 20,1%. O Jardim Botânico, que figura em 10.° lugar, está quase lá: os idosos já representam 19,7% de sua população.Situados em sua maioria na Zona Norte da cidade, para onde a cidade se expandiu a partir do Centro, os bairros têm em comum o fato de serem os de ocupação mais antiga, como explica o professor do Departamento de Geografia da Universidade Federal do Paraná Francisco de Assis Mendonça. Entre as décadas de 50 e 70, quando se iniciou a ocupação desses espaços, o país vivia um boom econômico que possibilitou a muitos casais jovens adquirir uma residência, na qual vivem até hoje.

"Eram residências de alto padrão, baratas e com amplos espaços, em locais calmos e planejados", afirma o professor. A ocupação era estimulada por empreendimentos e serviços que começavam a surgir ao redor desses bairros – caso do Palácio Iguaçu (inaugurado em 1953), no Centro Cívico, e da construção da BR-116 (finalizada em 1961), nas proximidades do Jardim Social. "Com o tempo, foram incorporados a uma malha urbana eficiente e a uma rede de serviços que valorizaram as casas."

Outra explicação para o alto índice de idosos é a saída dos filhos de casa – o que justifica a perda de população por seis dos nove bairros da lista. O Jardim Social, em dez anos, teve sua população encolhida em 6,4%. A partida dos filhos, no entanto, como lembra Mendonça, é compensada pelas relações duradouras estabelecidas com vizinhos, também moradores antigos, e com o próprio bairro, o que impede a migração para outros locais, pelo menos até o idoso atingir a velhice avançada e se tornar mais dependente.

Desafios

O envelhecimento dos bairros, no entanto, traz desafios: é preciso pensar em espaços públicos mais amigáveis ao idoso. Em Curitiba, assim como em outras cidades do país, isso está longe de acontecer, como opina o professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Pontifícia Universidade Católica do Paraná Fábio Duarte. Ele afirma que a questão da caminhabilidade (dar condições de deslocamento aos pedestres) ainda é uma área negligenciada.

Entre as obras urgentes está a recuperação de calçadas, que oferecem riscos de queda a idosos e pessoas com deficiência. Além de buracos e piso irregular, faltam também rampas para cadeiras de rodas. Os semáforos são outro problema. "Nesses bairros, deveria haver um semáforo em cada esquina, com um tempo hábil para o idoso atravessar as faixas", diz Duarte. "O problema é que o poder público só coloca semáforo onde há risco de colisão entre veículos, não entre veículos e pessoas", critica.

A presença do comércio também é uma questão complexa. O ideal seria que os bairros com mais idosos oferecessem uma gama variada de serviços, para evitar grandes deslocamentos e o uso de carro. Isso, no entanto, por outro lado. pode acabar por "expulsar" os moradores mais antigos do local, que se veem tentados ou obrigados a vender suas residências para empreendimentos comerciais.

Moradores viram Jardim Social crescer

Uma tarde de bate-papo com os moradores mais an­­ti­­gos do Jardim Social – o bairro curitibano com maior número proporcional de idosos em sua população – é sinônimo de conhecer também a história do local, desde o início de sua ocupação, quando a região era vista como um mundo à parte, sem asfalto e longe de tudo. Tudo, no caso, era o Centro.

"A cidade acabava na caixa d’água [da Sanepar, no Alto da XV]. A gente morava no mato, como diziam os parentes", brinca a professora aposentada Regina Seixas Pinto, 67 anos, moradora do bairro há 38 anos. Quando ela chegou ao local, recém-casada, sua casa figurava solitária na paisagem. Os vizinhos mais próximos ficavam a metros de distância.

Uma década mais tarde, quando ela se estabeleceu na Avenida Fagundes Varela, uma das principais vias do bairro, ainda não havia sequer asfalto. Os carros que hoje passam "voando" pela rua eram figuras raríssimas. "Meus filhos andavam de bicicleta e jogavam bola no meio da rua, e eu não precisava me preocupar", relembra.

O comerciante Gabriel Alceu Zequinão, 77 anos, mora no bairro há três anos, mas frequenta a esquina da Fagundes Varela com a Manoel Correia de Freitas desde que nasceu. Lá funciona uma mercearia herdada por ele dos pais. Para Zequinão, a relação de confiança estabelecida entre os mais velhos é o diferencial do bairro. A reclamação fica por conta do tráfego intenso. "Tem dias que eu levo 10 minutos para atravessar a rua. Às seis da tarde piora. Precisamos de um semáforo aqui".

O engenheiro civil José Rodolfo de Lacerda, de 69 anos, que mora no local há 39 anos, cita as ruas largas, a grande quantidade de árvores e o fato de o Jardim Social ter sido um bairro planejado como os fatores que atraíram e mantiveram as pessoas no mesmo local até chegar à terceira idade.

O problema, hoje, segundo ele, é a segurança, que começa a incomodar. "Conheço muitos vizinhos que já foram assaltados. O sossego tem seu lado bom, mas também chama a atenção dos bandidos". Os mais velhos, diz ele, acabam sendo alvo fácil de criminosos, por isso o bairro deveria receber mais atenção da polícia. "Precisamos de uma ronda ostensiva e mais iluminação".

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