Obrigatório nas escolas públicas desde 2012, o ensino de música anda a passos lentos no Brasil. O maior entrave é a falta de estrutura: instrumentos musicais e professores com capacitação técnica para lecionar este campo da arte não só com qualidade, mas com atributos pedagógicos adequados. Em países em que esta etapa já foi vencida, o desafio passa a ser o que ensinar e com qual propósito.
Os franceses são grandes responsáveis por técnicas arrojadas e inovadoras no ensino da música. Mas na hora de ensinar suas crianças, a França é tradicionalista: o canto é afinado ao modo ocidental e os instrumentos são classificados conforme a divisão da orquestra sinfônica, conta o professor de música da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Guilherme Romanelli.
Lei não obriga que professor seja especializado na área
- Naiady Piva
Uma das polêmicas na regulamentação do ensino de música no Brasil é a obrigatoriedade de que o professor da área seja bacharel em Música, o que não consta na legislação atual. O arte-educador Nélio Sprea lamenta. “O especialista conhece o universo da experiência musical [e pode] trabalhar com uma proposta de construção do conhecimento em música. Vai bem além do que um professor generalista pode fazer”, defende.
Um dos problemas é de ordem prática. Formar professores de música para as vagas do ensino público nacional levaria 140 anos, com o número de graduações que hoje existem, segundo o professor Guilherme Romanelli, da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Outro é conceitual. Romanelli defende não um professor, mas um tutor musical para os anos iniciais do ensino fundamental e o ensino infantil.
Como a “música é a linguagem natural das crianças, a primeira aprendizagem, que já começa três meses antes de ela nascer”, ela não pode estar restrita a uma disciplina, mas deve perpassar a totalidade do ensino nesta fase, defende Romanelli.
Sobre esta dinâmica da música na amplitude do espaço escolar, Sprea concorda. “É preciso trabalhar uma proposta de construção do conhecimento em música”, que inclui saber brincar com a criança, trabalhar de uma maneira prazerosa.
“Se o professor de música não desperta paixão, vai ter a mesma dificuldade do professor de matemática [em conquistar a turma]”, argumenta.
Já na Argentina, a música é uma das disciplinas obrigatórias na Educação Artística desde o ensino primário, segundo informações do Ministério da Educação local. No equivalente ao ensino médio, os alunos cursam nos primeiros anos um ciclo comum e depois partem para uma espécie de ensino técnico. Entre os diplomas disponíveis, está o de Bacharel em Artes. Além das disciplinas tradicionais, o aluno foca no estudo de quatro grandes áreas artísticas: música, teatro, literatura e danças.
Os norte-americanos são mais performáticos. Nos Estados Unidos, o que prevalece “é a ideia do caça-talentos. Se você tiver jeito para a música, vai tocar. Se não, desista. Porque você não vai aprender mesmo”, resume Guilherme Romanelli.
Estudioso da forma como as crianças produzem música (obrigadas ou não) na escola, o professor considera emblemático o caso da Lituânia, no Leste Europeu. “Cantar e dominar a música folclórica, para eles, é tão importante quanto é o futebol para uma criança brasileira”.
O tradicionalismo francês é ainda mais forte em seus vizinhos da Suíça. E era mais ainda há três décadas atrás, quando Edith Camargo começava seus estudos em uma escola pública na região de St. Gallen, no Leste do país. O currículo era rigoroso: aulas de canto uma vez por semana, dos menores aos maiores.
Há vinte anos, Edith veio para Curitiba fazer um curso de Música Popular Brasileira e por aqui se estabeleceu. A experiência como professora de canto e a paixão pela MPB faz com que ela tenha um olhar menos pessimista em relação à situação da musicalidade local. “A criança brasileira é muito livre, você vê ela sambando, se desenvolvendo corporalmente. Na educação musical escolar, isso é um ingrediente muito rico. Prova disso é que temos muito instrumentistas com ouvido ótimo e que só depois vão aprender [no ensino formal]”.
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