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Políticas públicas

“O Fundeb é uma ajuda pequena”

Curitiba – O senador Cristóvam Buarque (PDT) passou longe de se eleger presidente. Fez 2,5 milhões de votos, o que não o elegeria nem mesmo governador nos maiores estados brasileiros. No entanto, conseguiu se tornar uma referência nacional tanto na área da política quanto na da educação. Politicamente, já havia dado um salto ao se tornar ministro da Educação do governo Lula, ultrapassando os limites do Distrito Federal, que governou de 1995 a 1998. A candidatura à Presidência, no entanto, aumentou ainda mais o seu cacife eleitoral.

Na educação, a proposta para uma "revolução doce" cativou muita gente. E botou seu nome na boca dos educadores do país. Nesta semana, por exemplo, o senador veio a Curitiba não para uma missão política, mas sim para participar de uma banca de um projeto de mestrado. A mestranda era a promotora Maria Teresa Uille Gomes, ex-procuradora-geral de Justiça do Paraná. E o tema, obviamente, era educação.

Na saída, antes de ir a um encontro com o senador Osmar Dias, deu a seguinte entrevista à Gazeta do Povo:

O governo aprovou recentemente o Fundeb. O que o senhor, que teve sua campanha presidencial toda voltada para a área de educação, tem a dizer sobre o programa?O que eu mais temo é a ilusão que o governo está criando de que esse programa vai resolver os problemas da educação brasileira. É bom que o programa exista. Mas é uma ajuda pequena. Até porque há pontos que são questionáveis. O governo diz, por exemplo, que vai colocar R$ 2 bilhões no primeiro ano. Mas R$ 800 milhões foram tirados de outras rubricas da educação. Não é dinheiro novo. Mas mesmo que fossem R$ 2 bilhões. Divida isso por mais de 2 milhões de professores. Dá mil reais. Agora divida por 13 salários. Dá menos de R$ 100 por mês para cada professor. Não é isso que vai solucionar a educação brasileira. E eu vou a Brasília hoje (terça-feira) para fazer esses questionamentos.

O censo universitário brasileiro, divulgado neste mês, mostra que 10,9% dos brasileiros jovens estão na universidade. O governo fala em chegar a 30% em 10 anos. Isso é possível?A pergunta não é se isso é possível, mas sim se é isso que queremos. Se colocássemos 30% na universidade, isso significaria que todos os jovens que saem do Ensino Médio entrariam na universidade. Porque hoje só 33% dos brasileiros terminam o Ensino Médio. É isso que precisaríamos mudar. O problema é que o governo Lula é um governo das corporações. Não existe sindicato do ensino fundamental, do ensino médio. Existe sindicato dos universitários. Eles é que geram a demanda. Dá para pôr 30% na universidade. Mas nem sei se todos os alunos que terminam o Ensino Médio estão aptos a freqüentar uma faculdade. Acho que só 18% estão preparados hoje. Insisto: o governo ouve quem demanda, que é quem já está dentro. Quem está fora, que necessita, não demanda. E por isso não é atendido.

O governo deveria se preocupar mais com a base, então?Eu quero ver se no ano que vem vou ao Quênia, na África. Lá, o presidente [Mwai Kibaki, eleito em 2002] chegou ao poder dizendo que ia transformar a escola estatal em gratuita. Era paga, antes. Todo mundo disse que não ia dar. Mas ele fez. No primeiro ano, foi um caos. Alunos de pé na sala, faltava material, faltava tudo. Mas essa é a diferença entre demanda e necessidade. Antes as crianças tinham necessidade, porque não iam para a escola, mas isso não era visível. Quando elas ficaram de pé na sala de aula, se tornou uma demanda. E as pessoas tiveram que se virar para dar um jeito naquilo. Porque o problema apareceu. E agora parece que tudo está funcionando melhor por lá. Era isso que eu esperava do Lula, que transformasse necessidades em demandas. Mas eu propus um projeto ao José Dirceu que previa: "Toda criança tem direito a freqüentar a escola mais perto de sua casa." Ele falou que ia ter criança em pé, por falta de lugar. Eu disse que era melhor em pé na sala de aula do que deitado na rua. Mas ele não quis atender porque ia complicar para os prefeitos e prejudicar o governo politicamente.

O senhor, como crítico do governo, ficou numa saia-justa depois de o PDT entrar na coalizão do governo Lula?Dá para andar de saia-justa (risos). Mas o governo ganha muito pouco com a entrada do PDT. Os deputados e senadores do partido iriam votar de qualquer maneira a favor das boas propostas. E iriam votar contra as ruins. E isso vai continuar acontecendo.

E o PDT? Ganha?Acho que o PDT pode perder a chance de se tornar a alternativa para o pós-Lula. Porque a população mostrou nessa eleição que não quer mais o pré-Lula, ou seja, o PSDB e o PFL. E daqui a quatro anos não haverá mais o Lula como opção. Por isso, é necessário preparar o pós-Lula. E nós temos a chance de nos firmarmos como essa alternativa.

A votação da sua campanha não diminui a possibilidade de que o PDT tem a chance de se tornar essa alternativa?Não. Até porque esse não é um projeto para hoje. Mas veja. Primeiro, lançamos a candidatura muito tarde, com um cenário que já tinha três candidatos. Quem era contra o Lula, votava no Alckmin. Quem era contra o Alckmin, votava no Lula. E quem era contra os dois, votava na Heloísa Helena. Tinha um partido que não é estruturado em todo o país. Não era conhecido nacionalmente. Vim do Distrito Federal, o menor colégio eleitoral do país. Tinha pouco tempo de tevê. Nem sei como consegui 2 milhões e meio de votos. O desafio agora é transformar todos esses eleitores em militantes de uma causa, a causa da revolução pela educação.

O que o senhor pensa sobre o aumento dos salários dos deputados federais e senadores?Almocei com o senador Osmar Dias (PDT-PR) e conversei com nossos outros senadores. Queremos propor que o reajuste seja igual à inflação do período. Aumentar o salário em 91% reduz a credibilidade dos políticos em 91%. É como aumentar o salário de um médico e tirar o bisturi dele.

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