Ponta Grossa - O casamento de Maria Odete Oliveira, 54 anos, e José da Rosa, 61 anos, foi um capítulo à parte na vida dos dois. Viúva havia mais de dez anos, Odete não tinha planos de procurar um novo parceiro e estava seguindo a ideia à risca. Ainda abatido na época pela perda recente da esposa, José também não esperava engatar um novo relacionamento. "Falei para os meus filhos que ia viver só para os netos. E então eu a conheci", relata, apaixonado.
Juntos desde outubro do ano passado, o casal representa algumas diferenças comuns entre homens e mulheres no modo de encarar a viuvez. A experiência tende a ser ainda mais difícil na terceira idade, quando o falecimento indica a ruptura de décadas de união e parceria. Odete foi casada por 27 anos; José, por 38. Ambos tiveram filhos com os antigos companheiros.
"A reação do idoso à viuvez depende de como a família encara a dor e o sofrimento", explica o psicólogo e gerontólogo Guilherme Falcão, da seção paranaense da Sociedade Brasileira de Geriatra e Gerontologia (SBGG). As diferenças de gênero são a característica mais visível do processo. Embora elas estejam em maioria entre os idosos viúvos só o Brasil tem 3 milhões de mulheres a mais do que homens, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) , são eles que mantêm ativa a tradição de subir ao altar.
Dos mais de 25 mil casamentos com pessoas viúvas de todas as idades nos últimos anos, 16 mil tinham como um dos noivos um homem viúvo. Destes, pouco mais da metade tinha mais de 60 anos quando partiu para a segunda ou terceira união. Ou seja: enquanto 8 mil homens se uniram de novo a outras mulheres, em sua maioria solteiras, a maior parte das viúvas idosas continuou só (veja box).
É o caso de Sônia Ferreira, 63 anos. Ela perdeu o marido aos 48 anos. "Meu marido se acidentou. Foi uma viuvez precoce e eu não estava preparada", conta. A superação do luto veio acompanhada das responsabilidades com a família. "O meu caçula tinha acabado de entrar na faculdade na época. Eu tive de lutar com unhas e dentes e mandar ver", relata Sônia, que trabalhava como costureira.
Hoje, com os três filhos já formados, ela participa de projetos de voluntariado e diz que não pretende se casar novamente. O calendário de atividades é dividido entre visitas a pessoas carentes como uma das líderes das pastorais da Criança e da Pessoa Idosa, os cuidados à saúde do pai e as antigas costuras. Quando não está com os amigos ou a família, Sônia também se dedica a cuidar da casa, onde mora sozinha. "Tenho minha vida própria", afirma.
Eles por elas
O psicólogo Guilherme Falcão explica que a diferença de comportamento entre homens e mulheres tem características que se acentuam na terceira idade. "O homem tem mais dificuldade de interagir socialmente. Ou ele casa mais rápido ou ele fica preso no panorama familiar", analisa Falcão. "Já a mulher tem o baque da perda, mas busca outras coisas para fazer. Ela procura se ocupar para trabalhar a dor que ela está sentindo e amplia a participação social", relata.
Para Falcão, independentemente da variação entre os gêneros e dos planos a seguir, o idoso precisa entender a morte como algo natural. Segundo ele, compreender que a viuvez é parte do processo da vida é o primeiro passo para obter a segurança necessária para trilhar novos caminhos. Essa forma de comportamento ajuda, inclusive, a manter a saúde do idoso em dia. "A medicina psicossomática explica isso. Se a gente fica emocionalmente fragilizado, o nosso organismo também fica. Daí o aparecimento de algumas doenças".
Os filhos e netos também têm papel fundamental para a superação do luto. O especialista recomenda que os familiares não passem a fazer tudo pelo viúvo só por causa dessa situação. "Esse fazer tudo só piora a saúde do idoso, que precisa de autonomia", alerta o gerontólogo.
Unidos como nunca, Odete e José acabam de formar uma nova família com base nesses conselhos. O casamento foi celebrado com pompa e circunstância. Só não teve mesmo sol e chuva, na contramão do provérbio popular. "Mas teve dama de honra na igreja e tudo", brinca a noiva.
O novo "sim"
O casamento de idosos viúvos é diferente entre homens e mulheres. Eles, em geral, partem para a segunda ou terceira união muito mais rápido do que elas. Veja os dados da pesquisa de Registro Civil feito pelo Instituto Brasileiro de Estatística e Geografia (IBGE), em 2007:
Homens
16.294 foi o total de casamentos com homens viúvos, de todas as idades, registrados no último levantamento do IBGE. Destes, 8.877 homens tinham mais de 60 anos quando decidiram se casar de novo. Pelo menos metade desse grupo escolheu para a união mulheres solteiras. O restante se dividiu entre viúvas e divorciadas.
Mulheres
No mesmo estudo, só 3.478 mulheres viúvas com mais de 60 anos casaram de novo. E 60% delas ou 2.023 subiram ao altar com homens também viúvos. A pesquisa ainda mostra que elas têm outras particularidades. Enquanto eles casaram com mulheres de idades variadas, elas preferem homens com mais 60 anos.
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Longas uniões e a idade avançada tornam a viuvez mais dolorida para casais de terceira idade?
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