A arquitetura circular, com as salas voltadas para o pátio, dá só uma primeira pista de que o Centro de Educação João Paulo II não é uma escola convencional. A grande diferença, no entanto, diz respeito aos seus 282 alunos, cujos horizontes estariam limitados se estivessem encostados numa dessas escolas públicas de qualidade duvidosa ou se continuassem a esmo nas ruas da periferia de Piraquara, nos costados de Curitiba. Por sorte, eles são os herdeiros do afeto de um homem que um dia sonhou dar às crianças pobres as mesmas oportunidades que pôde dar aos filhos.
O advogado e educador Belmiro Valverde Jobim Castor morreu em março, vítima de um mal súbito no coração, mas ainda hoje uma criança ou outra ainda pergunta pelo avô ao cruzar o portão. Era essa a relação de Belmiro com os meninos e as meninas para os quais ergueu a escola com ajuda de amigos e voluntários. Ele próprio os tinha como netos, e dizia com orgulho nas reuniões do conselho da escola que tinha dois filhos e dois netos de sangue e mais 282 adotivos. E era um avô bastante zeloso, como lembra a viúva, Elizabeth Bettega Castor.
Belmiro estava convencido de que era possível dar às classes mais pobres uma educação melhor do que a da rede pública. Mobilizou empresários e profissionais liberais para investir numa escola modelo. Desde abril de 2010 o Centro de Educação João Paulo II oferece ensino gratuito e de qualidade a crianças carentes de 3 a 14 anos. Dos matriculados, 64 estão no ensino infantil e 218 no fundamental, que fazem o contraturno escolar. E a família de Belmiro e Elizabeth vai crescer. A meta é chegar a 300 no ano que vem.
Cada aluno custa R$ 430 por mês. Ou seja, uma despesa total de R$ 1,5 milhão por ano. É mais ou menos o que o Estado gasta numa escola pública, mas é nesse ponto que as diferenças se acentuam. Ali, o aluno tem uma jornada de estudo de oito horas e recebe três refeições diárias. Tudo de graça. Entre os 31 profissionais contratados, 12 são professores com nível universitário especializados em educação infantil. O Sesi-PR cede mais cinco professores com formação superior para as atividades de contraturno, as extracurriculares e os programas comunitários.
A associação criada para gerir a escola não tem fins lucrativos, os dirigentes e associados não são remunerados, mas mantê-la aberta é um desafio. Todos os gastos da escola são cobertos por doações, o que dá uma ideia do tamanho do milagre. Às contas. Cento e vinte doadores fixos contribuem com R$ 100 por mês. Ainda assim, há um desequilíbrio financeiro todo o mês. Cabe ao conselho administrativo bater à porta das empresas em busca de contribuições. Apesar do sufoco, por enquanto tem dado certo. Houve dois momentos, no entanto, em que a água bateu no pescoço.
A primeira vez, ano passado, a escola chegou ao dia 15 com dinheiro apenas para chegar até o fim do mês. Belmiro iniciou a romaria atrás das empresas para doações. Conseguiu recursos para fechar o ano. O segundo sufoco se deu logo após a morte dele. Foi a vez dos 14 integrantes do conselho administrativo se unirem numa força-tarefa. Salvaram o ano. Para evitar novas tribulações, o grupo trabalha para atrair pessoas e organizações dispostas a contribuir regularmente com pelo menos R$ 100 por mês.
"É um custo pequeno, em termos individuais, mas de grande impacto para o universo de crianças atendidas", diz Elizabeth. Empresas também podem contribuir para o Fundo de Infância e à Adolescência de Piraquara com a destinação de parte do Imposto de Renda. Pelo ineditismo e importância social, o Centro de Educação João Paulo II foi escolhido pela Universidade de Yale (EUA), como um dos três projetos brasileiros para receber o apoio da instituição.