A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de reconhecer nesta semana a união afetiva entre pessoas do mesmo sexo gera polêmica sobre o papel da corte suprema na legislação do país. Os críticos argumentam que o STF extrapolou as barreiras e legislou sobre um tema que deveria ficar restrito ao Congresso Nacional. Em outros temas a intervenção dos magistrados também foi decisiva, como nas ações sobre demarcação de terras indígenas e pesquisas com células-tronco embrionárias.
Quem defende o posicionamento dos ministros afirma que eles não poderiam negar uma resposta por terem sido questionados. Por trás desse investimento no Judiciário em detrimento do Legislativo está o conservadorismo dos congressistas. Para especialistas, a Câmara dos Deputados e o Senado demorariam décadas para aprovar alguma lei sobre o direito dos homossexuais. "Há projetos nesta área desde 1995 e até hoje não houve avanços. O Judiciário agiu em face à omissão do legislador", argumenta a desembargadora aposentada Maria Berenice Dias, uma das maiores juristas no país sobre direito homoafetivo.
O Judiciário tende a ser mais progressista em assuntos polêmicos. Como os políticos dependem do voto da maioria, geralmente são cautelosos ao expor suas opiniões, como ocorreu nas eleições de 2010 com o controverso tema do aborto. As mudanças na sociedade ocorrem e o Congresso deixa de dar respostas legais, o que provoca ressonância entre os magistrados.
Conservadorismo
Para o autor do livro A cabeça do brasileiro, Alberto Carlos Almeida, o Congresso representa o brasileiro médio, que tende a ser mais conservador. Já os integrantes do Judiciário vêm de camadas mais escolarizadas. Para ele, o Legislativo também é mais conservador do que o Executivo. "Isso ocorre em função do elemento cultural e da baixa escolarização", diz.
O diretor do curso de Teologia da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, César Kuzma, afirma que a questão julgada pelo STF envolve o direito da pessoa humana e a liberdade constitucional. Ele argumenta que os ministros da corte não estão impondo que as igrejas passem a casar homossexuais, e sim garantiram direitos civis. "Cada igreja tem seus mandamentos e continuará resguardando-os. A meu ver, como teólogo cristão e católico, não há impacto para a religião. Continuaremos com nossos princípios e normas", diz.
Maria Berenice também acredita que não haverá grandes transformações. "A família não vai acabar. Não haverá mais uma parcela da população condenada à invisibilidade e exclusão de direitos."
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