Perfil

• 1907 – Caio Prado Junior nasce no dia 11 de fevereiro, em São Paulo (SP). Seu pai, Caio da Silva Prado, e sua mãe, Antonietta Penteado da Silva Prado faziam parte de uma das familias mais influentes e ricas da cidade.

• 1928 – Durante seu último ano no curso de Direito na USP, inscreve-se no Partido Democrático.

• 1931 – Muda para o Partido Comunista do Brasil e começa a estudar Marx e Engels.

• 1933 – Lança o seu primeiro livro, Evolução Política do Brasil. A cadeia de acontecimentos históricos é reinterpretada com ferramentas marxistas, características de todas as suas outras obras.

• 1935 – Participava ativamente da Associação dos Geógrafos Brasileiros e era vice-presidente da Aliança Nacional Libertadora. Teve início de sua mais longa prisão, que só terminou em 1937.

• 1937 a 1939 – Exila-se em Paris e atua nas manifestações de solidariedade aos refugiados da Guerra Civil Espanhola.

• 1943 – Funda a Editora Brasiliense, com publicações voltadas para obras de médicos, sanitaristas e especialistas das mais diversas áreas científicas.

• 1947 – Elege-se deputado estadual por São Paulo, mas tem o mandato cassado devido ao cancelamento do registro do Partido Comunista do Brasil. Lança a polêmica Revista Brasiliense, que fica em circulação até 1964.

• 1970 – Foge do Brasil e obtém asilo no Chile. Volta ao Brasil ainda na mesma década para seu julgamento e é condenado pelo Tribunal Militar. No ano seguinte é absolvido pelo Supremo Tribunal por unanimidade.

• 1990 – Morre em 23 de novembro.

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Curitiba – Aos dez anos ele fez a experiência de dormir no chão. Nascido em uma família de elite de São Paulo, queria sentir as mesmas dificuldades dos meninos das classes pobres da sua idade. O fato, pitoresco, revela os sentimentos insistentes na vida de Caio Prado Júnior, que completaria 100 anos hoje, um dos mais polêmicos intelectuais de esquerda do Brasil.

Reconhecido como um grande idealista, até por seus opositores – da esquerda à direita –, Caio Prado viveu o sonho de adaptar o comunismo ao Brasil. "Ele faz parte dos representantes do marxismo ingênuo da época, pessoas de grande integridade moral, sinceras", analisa o crítico Gilberto de Mello Kujawski, jornalista e escritor, que conviveu com o pensador.

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Formado em Direito pela Universidade de São Paulo (USP), se aventurou nos papéis de historiador, cientista social, filósofo, escritor, geógrafo, economista e político. Escreveu inúmeras obras e artigos. Os livros mais conhecidos são a Evolução Política do Brasil, a Formação do Brasil Contemporâneo e a História Econômica do Brasil. Fundou ainda a Editora Brasiliense. "Ele tinha uma característica importante que é a de tratar problemas muito profundos e sérios com uma escrita bem elaborada e acessível", observa o antropólogo Edgard de Assis Carvalho, professor titular da PUC-SP.

Militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) – chegou a ser eleito deputado estadual em São Paulo pela legenda – não correspondia às principais diretrizes do partido. "Caio não concordava com a tentativa de enquadrar o comunismo no Brasil nos mesmos moldes vividos pela Europa, como se aqui tivéssemos tido, por exemplo, um feudalismo. Enxergava o país não só por meio de grandes teóricos interpretativos marxistas, mas desenvolvia isso na própria realidade. Uma das coisas que ele fez foi viajar pelo país, fazendo retratos dos cenários, escrevendo suas impressões para depois delinear seus livros", explica o historiador Paulo Iumatti, professor da USP e autor de uma biografia do pensador.

Fiel ao marxismo, não se pode entender seus textos sem colocar o redutor ótico da suposta necessidade da "luta de classes" e do "determinismo histórico", pelo qual o homem não seria livre para empreender o seu futuro, mas apenas refém dos meios de produção. Dessa forma, a atividade produtiva, na sua época predominantemente agrícola, determinava, para Caio, o perfil do brasileiro. Nessa linha, foi criticado por alguns filósofos e economistas por não ter se detido tanto na questão da industrialização do Brasil, ter ignorado outros aspectos importantes da conjuntura brasileira e, por vezes, trazer uma visão unilateral demais em suas análises.

Como o intelectual alemão Karl Marx (1818–1883), converteu o conceito de "classe" de uma manifestação sociológica complexa a quase um mito. Segundo Caio Prado, era preciso definir bem as camadas sociais, tendo em conta que não poderia haver acerto sem o conflito entre elas – idéia hoje ultrapassada na Europa, mas que tenta recrudescer na América Latina.

"Para Caio Prado a questão agrária, os conflitos rurais, o problema da exploração desumana no campo, eram assuntos prioritários. O estudo em relação à sua visão da industrialização deve ser colocado no seu lugar certo. Não era um avesso ao progresso e sim da dependência do país ao capital externo", define Iumatti.

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A prisão foi uma constante na sua vida. Caio Prado foi detido pela primeira vez por gritar um "viva" em uma manifestação favorável a Getúlio Vargas, antes do início do primeiro mandato do presidente. Pouco tempo depois, decepcionado com o político, vai para a cadeia novamente por ser contrário ao getulismo. Passa pelas prisões ainda outras vezes, sendo que na última, durante a ditadura militar, na década de 1970, aproveita para escrever a desconhecida obra Estruturalismo e marxismo, uma análise ao antropólogo belga Claude Lévi-Strauss.

"Essa obra mostra como Caio Prado está incluído na linhagem de pensadores que são abrangentes e fazem questão de utilizar vários registros do conhecimento. Mesmo tendo em conta que, nesse caso, ele foi um pouco forte demais ao avaliar Levi-Strauss", afirma o antropólogo Assis Carvalho, da PUC-SP.

Mas o principal legado de Caio Prado é a sua coerência. "Foi o mesmo do começo ao fim, o filho da família rica com olhos nos pobres. Não se pode esquecer dessa perspectiva ao analisá-lo", conclui Kujawski.