Desenvolvimento
Sesmarias doadas a parentes de precursor viraram cidades
A distância entre os vilarejos, a dificuldade de locomoção - feita normalmente à cavalo e o grande número de filhos de cada casal fazia com que surgissem casamentos entre parentes. "Era comum primo casar-se com prima, sobrinha com tio", exemplifica a autora Cirlei Francisca Gomes Carneiro.
Com tantos familiares e com a ordem da Coroa de se povoar o Paraná para evitar a invasão de outros povos, o português João Rodrigues de França ganhou sesmarias do reino e colocou seus parentes para governá-las. "Se fosse hoje em dia chamariam de nepotismo", brinca a Cirlei.
Um dos genros de França Luiz Tigre fica na sesmaria que hoje corresponde ao município de Campo Largo e povoa a região a partir da capela de Tamanduá. Numa colina do atual município de Balsa Nova, ela resiste ao tempo. A igreja, construída no início do século 19, foi restaurada há 35 anos e tombada como patrimônio histórico do Paraná em 1970. A capela é hoje visitada pelo menos uma vez por mês, quando a igreja é aberta para missas.
O casal que também descende de França Veríssimo Carneiro dos Santos e Rita Maria do Nascimento Prestes ficou responsável pela sesmaria onde hoje existe o município de Palmeira. Nos campos da região, eles constroem a fazenda Cancella. Cirlei conta que Veríssimo era militar e viajava muito em missões. Rita ficou conhecida como Rita da Cancella e dirigia os negócios da fazenda, como a venda de gado.
Em 1951, a fazenda é vendida para os imigrantes russos-alemães que formaram a colônia Witmarsum. A sede da antiga fazenda virou um museu da imigração dos menonitas e não faz referência à colonização portuguesa na região. O museu é aberto à visitação.
Os Campos Gerais de Curitiba como era chamada a região acima da Serra do Mar no Paraná ganharam uma nova configuração a partir do século 17. Os indígenas que habitavam os sertões paranaenses viram aos poucos o surgimento de núcleos familiares formados por descendentes de portugueses que escolheram o Paraná um pedaço do Brasil Meridional para se estabelecer.
As linhagens dos precursores João Rodrigues de França, nos séculos 17 e 18, e de Antônio Rolim de Moura, nos séculos 19 e 20, foram responsáveis por parte da colonização da região que hoje vai de Campo Largo a Piraí do Sul. As duas origens, que mais tarde, no século 20, se ramificaram na família Rolim Carneiro, já passaram da décima geração no Paraná.
Uma das descendentes é a historiadora Cirlei Francisca Gomes Carneiro. Ela uniu o interesse pela história da genealogia da sua família às origens da colonização do Paraná. Durante dez anos, fez diversas pesquisas para escrever o livro De Portugal a Paranaguá: uma história de colonização dos Campos Gerais do Paraná. A obra, editada em dois volumes pela editora Chain, foi lançada no último dia 12 em Castro.
De João Rodrigues de França, um militar designado pela Coroa Portuguesa para administrar Paranaguá no século 17, até Antônio Rolim de Moura, paulista que veio para o Paraná no século 19, passaram vários homens e mulheres de famílias abastadas. Muitos foram militares ou fazendeiros que negociavam gados e muares que movimentaram a economia do Brasil que estava em formação.
O Paraná era a Quinta Comarca de São Paulo quando França veio ao estado e se casou duas vezes, tendo 12 filhos. A primeira esposa se chamava Francisca Pinheiro e a segunda, Maria da Conceição. Dos dois casamentos surgiram as famílias Godinho, Gomes da Silva, Carneiro dos Santos, Nascimento Carneiro, Costa Filgueira e Siqueira Cortes.
O crescimento só não foi maior porque dos 12 filhos do militar, seis viraram padres. Segundo Cirlei, há relatos de que os parentes originados nos dois casamentos tinham um bom relacionamento.
A segunda esposa, Maria da Conceição, não tinha um sobrenome definido. Por isso, as pesquisas anteriores à de Cirlei levantam a hipótese de ela ter sido uma escrava. Um detalhe curioso é que entre os fazendeiros campeiros como eram chamados os moradores dos Campos Gerais de Curitiba estava Luciano Carneiro Lobo, que é descendente de Maria da Conceição. Ele é citado como dono das maiores fazendas da Região dos Campos Gerais e, por consequência, dono de uma grande leva de escravos, perpetuando assim o regime do qual a matriarca Maria da Conceição pode ter pertencido.
LinhagemMistura entre famílias consolidou colonização
Paralelamente à expansão dessas famílias pesquisadas, o Paraná viveu o ciclo do tropeirismo com a instalação de outras famílias no interior do Paraná que propiciaram o surgimento de cidades pelo interior. Cirlei Francisca Gomes Carneiro resgatou na obra as famílias Marcondes Carneiro e Rolim de Moura como principais precursoras dos Campos Gerais.
A linhagem Marcondes Carneiro surgiu no século 19 através de uma das filhas do primeiro casamento de João Rodrigues de França a Maria da Ascenção que se casou duas vezes. Dos núcleos familiares saíram fazendeiros e militares, todos homens e mulheres que tinham forte influência política na região.
Concomitantemente à expansão da descendência de França, vinha para o Brasil o português com descendência inglesa Antônio Rolim de Moura Tavarez. A família Rawlins, que surgiu no século 11 na Inglaterra, se transformou em Rolim, no Brasil, para facilitar a pronúncia dos brasileiros. Ele constituiu uma numerosa família no Brasil e voltou para Portugal sem parentes, pois tinha honrarias reais portuguesas e, por isso, não poderia voltar casado para a Europa.
Um dos descendentes que ele deixou no Brasil foi Antônio Rolim de Moura. Ele nasceu em Sorocaba, numa rica família, e após casar-se passou a morar em Piraí do Sul ainda no século 19. Como Piraí do Sul era fruto de uma sesmaria criada por França, havia descendentes do precursor na região. Numa das uniões entre os descendentes de Antônio Rolim de Moura e de João Rodrigues de França surge a família Rolim Carneiro, que se fixou principalmente em Piraí do Sul e expandiu a colonização na região.
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