Passados 22 anos do último caso de raiva humana registrado no Paraná, o risco de transmissão da doença ainda preocupa as autoridades de saúde do estado. Já naquela época, a ameaça não era mais o "cachorro louco". Os morcegos segundo grupo de mamíferos em número de espécies, atrás apenas dos roedores são o principal vetor do vírus da raiva, uma doença que tem mortalidade de quase 100%.
Diferentemente do que possa parecer para o senso comum, não são apenas os morcegos hematófagos, aqueles que se alimentam de sangue, que representam perigo. Nas áreas urbanas, é cada vez maior a presença de morcegos comedores de insetos e frutas. Como todo mamífero, eles podem contrair, incubar e transmitir o vírus rábico.
"Com o desmatamento, os morcegos insetívoros e frugívoros estão migrando para as cidades, onde encontram árvores frutíferas e grande oferta de insetos, que são atraídos pela iluminação", explica o chefe da Divisão Ambiental da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), Natal Jataí de Camargo.
Ao encontrar um morcego caído, a ordem é jamais tocá-lo com as mãos. "Morcegos gostam de voar, portanto, se um deles estiver no chão, é muito provável que esteja doente", alerta o médico. "Mesmo que se trate de uma espécie insetívora ou frugívora, se for tocado ele pode morder para se defender."
Nesses casos, se o animal for encontrado em áreas rurais, o correto é chamar a Secretaria de Estado da Agricultura e do Abastecimento (Seab). Em áreas urbanas, deve-se acionar a Vigilância Sanitária Municipal. Munidos de luvas, os técnicos capturam o morcego, o guardam em uma caixa fechada e o encaminham a um laboratório para confirmar se ele é portador do vírus.
Segundo o consultor ambiental e pesquisador João Marcelo Deliberador Miranda, doutor em Zoologia pela Universidade Federal do Paraná, mais de 90% dos casos de transmissão da doença se dão pela mordida. Mas outras formas de contaminação são possíveis. Morcegos têm o costume de se lamber. Se o animal estiver doente, pode espalhar o vírus, presente na saliva, por toda a pelagem. Para quem tocar no morcego, um eventual ferimento pré-existente pode servir de porta de entrada para o vírus.
Morcegos hematófagos
Das cerca de mil espécies de morcegos existentes no mundo, apenas três são hematófagas e todas são encontradas no Brasil. Duas delas estão ameaçadas de extinção: o Diaemus youngi, que prefere o sangue de aves, e o Diphylla ecaudata, que ataca quase exclusivamente aves. O único morcego que se alimenta do sangue de outros mamíferos é o morcego-vampiro (Desmodus rotundus), responsável pelos casos de raiva registrados em animais de criação nas áreas rurais do Paraná.
Neste ano, a Seab registrou a ocorrência de 90 casos de raiva em bovinos, 190 em equinos e 18 em caprinos. "No Paraná todo, temos mais de 800 abrigos de morcegos cadastrados", conta a médica veterinária Elzira Pierre, responsável pela área de raiva da Divisão de Defesa Sanitária Animal da Seab.