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Brasília – No comando da CPI dos Correios, o senador Delcídio Amaral (PT-MS) ganhou projeção e teve de enfrentar a fúria do próprio partido para garantir a aprovação do relatório final do deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR).

Na última semana, ele pediu licença do cargo para se dedicar integralmente à campanha para governador de Mato Grosso do Sul. Não esconde a decepção com as absolvições dos mensaleiros aprovadas no plenário da Câmara e também com o próprio PT, que adiou o julgamento dos petistas envolvidos no escândalo do mensalão para depois das eleições.

Delcídio diz que o PT nunca mais será o mesmo depois de tudo o que aconteceu no último ano e que se iludem os que acreditam que, absolvidos na Câmara, receberão também salvo-conduto nas urnas.

A crise completou um ano. O que mudou efetivamente no país?

Delcídio Amaral – Sobretudo o senso crítico da população. Se algum político acha que a população não enxergou ou não percebeu o que aconteceu, 1°. de outubro está aí para mostrar efetivamente o que aconteceu com os corações e as mentes dos cidadãos brasileiros.

O presidente Lula saiu ileso, embora as denúncias tenham atingido o PT e o núcleo central do governo. A que o senhor atribui isso?

À respeitabilidade que a população tem pelo presidente, por sua biografia e história. Ele é quadro partidário e um líder político, cuja imagem já se consolidou no país. As pessoas identificam os partidos políticos, o Congresso Nacional e mesmo executivos do governo neste palco de denúncias a que o Brasil assistiu, mas ele soube se desplugar muito bem disso.

O presidente não foi protegido pela CPI dos Correios?

Não. Sua posição sempre foi de isenção. Ele nunca fez qualquer tipo de pressão para alterar os rumos da Comissão Parlamentar de Inquérito. Deu autonomia para eu agir como presidente da CPI. Basta ver que nosso trabalho foi ratificado pelo procurador-geral da República, também indicado pelo presidente Lula, que também o isentou.

Como o senhor analisa a entrevista do ex-secretário-geral do PT Sílvio Pereira?

São afirmações que merecem investigações mais aprofundadas. Do meu ponto de vista, quem mais poderá contribuir para que essa apuração seja feita o mais rapidamente possível são a Polícia Federal e o Ministério Público.

Que tipo de impacto isso deve ter na campanha deste ano?

Tudo vai ser explorado na campanha, vai ser relembrado. Nas eleições presidenciais, pelo que indicam até agora as pesquisas, o impacto não tem sido grande.

Como o senhor avalia o comportamento do PT ao longo dessa crise?

Tem uma história do Fernando Pessoa que diz que quem questiona muito a vida, não entende. Eu não sei se entendo, mas parei de questionar. Houve altos e baixos do partido ao longo da crise. Em algumas situações o partido foi muito lúcido, em outras isso não ocorreu. Nada do que aconteceu pode ser generalizado. Agora é bola para a frente e tentar aprender com todos os erros.

O PT tem chance de voltar a ser o que foi no passado?

O PT jamais vai poder ser o mesmo. Até porque o partido assumiu o governo e nenhum partido depois de assumir o poder continua o mesmo. Uma coisa é fazer oposição e adotar uma postura crítica frente a vários governos, outra coisa é se sentar na cadeira. Depois dessa experiência de governo e em meio às denúncias que surgiram, o PT não será mais o mesmo.

O PT perdeu algumas de suas bandeiras, como a da ética?

Não digo que perdeu, mas sofreu um desgaste muito grande. E vai precisar resgatar essas bandeiras. Todo mundo aprende com os erros, e com o Partido dos Trabalhadores não será diferente.

O que o senhor achou de o PT adiar para depois da eleição o julgamento dos petistas envolvidos no escândalo?

Hoje vemos um misto de decepção e tristeza nas pessoas que acompanharam tudo isso. Essas avaliações deveriam ocorrer o mais rapidamente possível para virar uma página e toda essa história que expôs muitas pessoas, prejudicou a imagem da maioria dos partidos. Uma das formas de corrigir o que aconteceu na Câmara é abrir o voto. Já o Partido dos Trabalhadores deveria ter enfrentado isso de imediato para não ser acusado de estar procrastinando ou de não ter pulso.

Valeu a pena enfrentar as pressões no decorrer da CPI?

Tudo vale a pena se a alma não é pequena, diz o poeta. A despeito das dificuldades e das conseqüências ao longo desses escândalos, valeu a pena porque a CPI dos Correios fez um bom trabalho. Cumprimos nosso papel e não decepcionamos a sociedade, quando se esperava uma tremenda pizza. Talvez se houvesse um comportamento diferente de outras instituições, do próprio Congresso, o impacto seria ainda maior.

O senhor se licenciou para se dedicar à campanha eleitoral. Fica alguma mágoa dos três anos e meio no Senado?

Não levo mágoa no coração. Às vezes posso levar comigo algumas decepções. Mas faz parte do jogo. Não podemos esperar que tudo aconteça dentro do que esperamos. Tenho algumas decepções, mas é da vida. Essas vieram agora e outras virão. Num embate como este, seria surpreendente se isso não ocorresse.

Que decepções foram essas e qual é a lembrança boa?

Primeiro a lembrança boa: a CPI dos Correios revelou parlamentares que vão ser de grande projeção no Congresso, que são jovens e têm uma forma de atuar muito mais pragmática, a despeito da ideologia que defendem. Prefiro não citar nomes. Já a maior decepção foi constatar em muitas ocasiões que as vaidades se sobrepõem ao objetivo comum, que era investigar. Em alguns casos, verifiquei comportamentos de absoluta irracionalidade que me fizeram lembrar Nélson Rodrigues quando ele dizia que a coisa mais difícil de explicar era o óbvio. E eu convivi com esse dilema em muitas ocasiões.

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