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Silvinei Vasques
Silvinei Vasques foi preso preventivamente em operação que apura interferência no segundo turno das eleições presidenciais de 2022.| Foto: Bruno Spada/Câmara dos Deputados

A Operação Constituição Cidadã, da Polícia Federal (PF), prendeu em Florianópolis o ex-diretor-geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) Silvinei Vasques, após ordem expedida pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele é acusado de ter feito operações rodoviárias com o intuito de dificultar o trânsito de eleitores no dia 30 de outubro de 2022, principalmente na região Nordeste do país.

Essa não é a primeira vez nos últimos meses em que um agente de segurança pública é detido por colegas por conta dos inquéritos do Supremo. O ex-ministro da Justiça Anderson Torres, o coronel Jorge Eduardo Naime Barreto e o tenente-coronel Mauro Cid também foram presos recentemente no âmbito desses inquéritos.

Nesses e em outros casos, juristas têm questionado a legalidade de prisões e de mandados de busca e apreensão executados pela Polícia Federal a mando do STF.

Foi o que ocorreu, por exemplo, após a busca e apreensão no caso do aeroporto de Roma envolvendo o ministro Alexandre de Moraes. A medida, ordenada pelo STF, foi considerada por juristas como flagrantemente inconstitucional em diversos níveis. Ainda assim, policiais obedeceram prontamente ao mandado.

Nas redes sociais, usuários acusam com frequência a PF de covardia e "peleguismo". "A Polícia Federal, chefiada pelo amigo íntimo de Lula, é usada para perseguição", afirmou nesta quarta-feira (9) o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) via Twitter. "Quem são os agentes da Polícia Federal que trabalham como capangas de Alexandre de Moraes e Flávio Dino?", questionou recentemente um usuário.

Em situação normal, membros da Polícia Federal dificilmente seriam presos por desobediência

Caso um policial ou um grupo de policiais decidisse não obedecer a uma ordem que considerasse ilegal, poderia responder penalmente por desobediência, prevaricação ou insubordinação, mas, em um estado de coisas normal, sendo réu primário, dificilmente seria preso.

No entanto, como explicam juristas consultados pela Gazeta do Povo, a insegurança jurídica instaurada por decisões do STF no país – especialmente em julgamentos dos inquéritos que apuram supostos crimes contra a Corte – faz a resposta à questão que dá título a esta reportagem ficar mais complicada.

A princípio, segundo o advogado criminalista João Rezende, haveria consequências no âmbito criminal e no administrativo, mas em nenhum caso isso resultaria em prisão caso se tratasse de um réu primário.

"A consequência no âmbito criminal seria o cometimento do crime de desobediência, do artigo 330 do Código Penal [com pena de no máximo seis meses], que consiste em desobedecer a ordem legal de um funcionário público – no caso, o próprio ministro do STF. No âmbito administrativo, o servidor estaria cometendo uma infração ético-administrativa e seria responsabilizado pela corregedoria da Polícia Federal, sofrendo um processo administrativo disciplinar, por cometer uma infração disciplinar", explica Rezende.

O jurista Fabricio Rebelo, coordenador do Centro de Pesquisa em Direito e Segurança (Cepedes), observa que "os crimes em que se pode enquadrar a conduta – resistência, desobediência ou desacato – têm, todos, penas máximas inferiores a quatro anos, o que obrigaria a concessão de liberdade provisória, ou seja, não haveria como se decretar uma prisão preventiva". "O indivíduo poderia ser preso, mas responderia em liberdade", afirma.

Dário Jr., doutor em Direito Processual pela PUC de Minas Gerais, diz que o policial também poderia ser enquadrado no crime de prevaricação, que consiste em "retardar ou deixar de praticar" um ato de ofício. Também nesse caso, a pena seria leve: no máximo um ano de detenção.

Os juristas destacam que o cenário muda, contudo, no atual contexto do país, em que há uma marca de imprevisibilidade nas decisões do Supremo.

Dário Jr. especula que, "se essa eventual decisão descumprida for do STF, na atual conjuntura, fatalmente [o policial] seria preso".

Mas e se outros policiais resolvessem não cumprir a ordem de prisão do servidor desobediente? Neste caso, para os juristas, do ponto de vista técnico, as suas condutas deveriam ser individualizadas. Na atual situação, entretanto, não seria estranho que isso abrisse margem para decisões judiciais criativas coletivizando o crime.

"Não duvido que fossem enquadrados em crime contra o Estado Democrático de Direito e fichados como terroristas", afirma Dário Jr.

Para Rebelo, tecnicamente, "seria apenas um crime cometido por vários agentes", com "coautoria ou participação", já que "delitos de organização e associação criminosas pressupõem um vínculo prévio para o fim de cometer crimes, o que não se aplicaria à recusa ao cumprimento de uma ordem judicial específica".

"Porém, como estamos no Brasil, num cenário em que as disposições penais são cada vez mais voláteis, não seria de se estranhar um enquadramento dessa natureza [como organização criminosa]", afirma.

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