A expansão do narcotráfico e a suposta relação do PT (Partidos dos Trabalhadores) com líderes do PCC (Primeiro Comando da Capital) poderão ser alvo de duas CPIs (comissões parlamentares de inquérito) – uma no Senado e outra na Câmara – cujos trabalhos começariam ainda neste ano. Ambas carregam o título de “CPI do narcotráfico”.
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A do Senado, cujo escopo é menos político e mais voltado à questão da segurança pública, já está instaurada. Porém, como parte de um acordo recente com líderes de partidos costurado pelo presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), suas atividades serão iniciadas somente após o período eleitoral. A outra, a da Câmara, ainda está em fase de recolhimento de assinaturas, mas o objetivo é instaurá-la antes das eleições.
Em 17 de julho, o ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Alexandre de Moraes acatou uma liminar do PT pedindo a retirada de supostos conteúdos falsos contra a legenda e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Entre os alvos dessa decisão estão justamente algumas postagens que apontam a relação do PT com o PCC, o que, para o magistrado, “pode vir a comprometer a lisura do processo eleitoral”.
Apesar de ter classificado como “inverídicas” as publicações que abordam a relação entre o partido e a organização criminosa como um fato, Moraes não chegou a classificar essa questão como “caso encerrado”, como fez ao comentar, na mesma decisão, o não envolvimento do PT na morte de Celso Daniel, ex-prefeito de Santo André.
A suposta relação entre PT e PCC voltou a vir à tona por conta de uma reportagem do começo de julho da revista Veja, que teve acesso a falas do empresário Marcos Valério, delator do escândalo do mensalão, à Polícia Federal, de 2017, sobre a proximidade entre o PT e o PCC. Suspeitas desse vínculo já foram levantadas em outras ocasiões recentes, como nos casos do áudio vazado de um líder do grupo criminoso e do contador de Lula, João Muniz Leite.
Na Câmara, objetivo é instaurar CPI do narcotráfico antes das eleições
Para o autor do pedido de CPI da Câmara, o deputado Carlos Sampaio (PSDB-SP), há muito o que se investigar sobre o suposto envolvimento entre PT e PCC. Ele protocolou o pedido no último dia 5 e agora aguarda o fim do recesso parlamentar para colher as assinaturas necessárias – 171, no mínimo – para a instauração da CPI. “Coletando as assinaturas na primeira semana de agosto, nós temos condições de instalá-la”, diz o parlamentar.
Sampaio foi sub-relator da CPI do Mensalão, primeiro grande escândalo de corrupção da era PT, em 2005. Na época, as denúncias de Valério serviram como base para a instauração da CPI. “Constatamos que todas as denúncias feitas pelo Marcos Valério eram verdadeiras. Deputados foram condenados e presos, e o ex-ministro José Dirceu também foi condenado e preso. Agora, surgem novas denúncias deste mesmo Marcos Valério, e gravíssimas”.
A CPI do narcotráfico na Câmara teria o escopo de apurar, entre outras coisas, se o PT realmente administrava um caixa secreto de mais de R$ 100 milhões, como afirma Valério, e se o partido tinha mesmo ligação com o PCC.
A instauração de uma CPI do narcotráfico antes do período eleitoral poderia influenciar o resultado do pleito. Para Sampaio, isso é mais um motivo para que a CPI comece logo.
“Quando me perguntam: ‘Mas uma CPI dessa num ano eleitoral?’ Essa CPI tinha que surgir num ano eleitoral mesmo, para sabermos quem são os partidos que estão sendo bancados com dinheiro lícito e quem são os partidos bancados com dinheiro ilícito. Também podem perguntar: ‘Teria condições de ter um desfecho essa CPI?’ Sim, porque a primeira medida que tomaríamos seria requisitar toda a delação premiada, para não sabermos apenas parte dela, mas toda ela. E, em segundo lugar, ouvir o Marcos Valério. Com isso, a gente já pode dar um norte”.
Segundo Sampaio, já há um diálogo para que os líderes partidários orientem suas bancadas a assinarem o pedido de CPI. “Não é difícil. O Partido Liberal, o partido do presidente Bolsonaro, por exemplo, tem 70 integrantes. O PP e o PTB, também da base do governo, têm 50 integrantes. Só aí já são 120.”
Sampaio descarta a instauração de uma comissão mista parlamentar de inquérito (CPMI) em conjunto com o Senado, já que os escopos são diferentes, mas não exclui a possibilidade de cooperação e compartilhamento de provas entre as duas comissões.
No Senado, CPI terá como objetivo a investigação do crime organizado como um todo
Autor da CPI do narcotráfico já instaurada no Senado, o senador Eduardo Girão (Podemos-CE) também afirma que uma CPMI “não está no radar”. Isso porque o principal objetivo da comissão que ele criou não é investigar as relações entre políticos e o narcotráfico, mas sim obter uma compreensão mais ampla de como o crime organizado atua no Brasil.
“Em 2016, ganhou o noticiário nacional e mundial uma verdadeira guerra entre facções criminosas que geraram um número recorde de mortes violentas nos estados do Acre, Amazonas, Pará, Ceará, Pernambuco e Rio Grande do Norte. A partir daí, a situação vem se agravando ano a ano. Portanto, faz-se imperiosa a necessidade de uma Comissão Parlamentar de Inquérito que possa fornecer elementos para o aprimoramento de políticas públicas, para o aperfeiçoamento da legislação e a formulação de novos procedimentos eficazes para o enfrentamento do crime”, explicou o senador em discurso no Plenário em abril.
A leitura do requerimento de abertura da CPI do narcotráfico foi feita dia 6 de julho no Senado. Mas, por conta do acordo entre Pacheco e os líderes dos partidos, a comissão só iniciará suas atividades quando o período eleitoral acabar.
De acordo com o senador, o que o levou a pedir a CPI foram os altos índices de assassinatos no país. A intenção é usar a comissão para compreender melhor o fenômeno e discutir formas de controle das organizações criminosas. Girão quer um levantamento de dados sobre como essas organizações criminosas estão se expandindo, principalmente nas regiões Norte e Nordeste.
Ainda que o foco principal da CPI não seja a suposta relação entre PT e PCC, Girão fez menção ao caso em discurso de julho celebrando a instauração da comissão. “Em 2005, o senhor Marcos Valério entregou R$ 6 milhões a um empresário de Santo André que estaria chantageando o ex-presidente Lula, ameaçando contar detalhes sobre a ligação do PCC com o assassinato de Celso Daniel. Isso é muito grave! A nação precisa de uma resposta”, disse Girão.
Outro lado
Sobre a suposta ligação com o PCC, o Partido dos Trabalhadores (PT) publicou uma nota em seu site em que comentou a decisão do ministro Alexandre de Moraes. Segundo a legenda, "os conteúdos a serem excluídos são notícias falsas que buscavam ligar o PT à facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital) e também ao assassinato do prefeito de Santo André Celso Daniel, em 2002". O PT classificou os conteúdos como "uma série de fake news contra o partido e o ex-presidente Lula".
Reportagem de Gazeta do Povo informou que a liminar de Moraes cita 16 pessoas, entre elas os deputados federais Otoni de Paula (MDB-RJ), Carla Zambelli (PL-SP) e Helio Lopes (PL-RJ), além do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). Nenhum dos parlamentares se posicionou sobre o tema até o fechamento dessa matéria.
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