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O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou a prisão preventiva de Allan dos Santos, do canal Terça Livre, na última quinta-feira (21), com base em uma representação encaminhada pela Polícia Federal. Moraes pede a extradição do jornalista, que mora nos Estados Unidos desde agosto de 2020. Mas qual é a chance real disso acontecer?
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Em sua decisão, que data do dia 5 de outubro, Moraes acionou o Ministério da Justiça para que inicie imediatamente um processo de extradição. A decisão deve ser obrigatoriamente acatada pela pasta, segundo Manuel Furriela, mestre em Direito Internacional pela Universidade de São Paulo (USP).
“O Ministério da Justiça não pode questionar e tem que cumprir os trâmites. Ele envia o pedido de extradição diretamente para os Estados Unidos”, diz o especialista.
O único ponto que pode ser questionado e acabar atrasando o pedido, segundo Furriela, “é a eventual falta de alguma documentação”. Sobre o conteúdo da decisão judicial em si, no entanto, o Ministério da Justiça não tem poder para descumprir a determinação do ministro do STF. “Não pode de forma nenhuma se recusar a cumprir ou mudar a interpretação”, diz.
O ministro da Justiça, Anderson Torres, afirmou recentemente ao site Brasil Sem Medo que não concorda com a decisão de Moraes, mas é obrigado a fazer o pedido de extradição. Por conta disso, nas redes sociais, Torres recebeu críticas de alguns influenciadores da direita.
O pedido já foi encaminhado à embaixada dos Estados Unidos, que deverá enviá-lo para a Justiça americana. Brasil e EUA têm um acordo sobre extradição, o que tende a agilizar o processo, caso os Estados Unidos acatem o pedido.
Primeira Emenda norte-americana pode impedir extradição de Allan dos Santos
A Primeira Emenda à Constituição dos Estados Unidos, que apresenta uma defesa inflexível de alguns direitos fundamentais, torna o país radicalmente avesso a medidas legislativas e judiciais que limitem a liberdade de expressão. Como as acusações contra Allan dos Santos giram em torno justamente desses direitos, isso poderia complicar ou até impedir sua extradição.
De acordo com o Manual de Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça sobre os EUA, “os crimes de injúria, difamação, calúnia e também delitos de preconceito, em regra, são considerados como atos relacionados à liberdade de expressão e não são criminalizados naquele país”.
Para Furriela, esse é o ponto que tem maior potencial de complicar o processo de extradição de Allan dos Santos. Ainda assim, segundo ele, a chance de que o jornalista seja extraditado não é baixa, especialmente por ele não ser cidadão americano.
“Existem várias interpretações. Há uma de que, já que o Brasil tem um tratado sobre extradição com os Estados Unidos, isso supriria qualquer discussão. A outra é de que, por não ser crime nos Estados Unidos, não haveria extradição”, explica ele.
Segundo o especialista, “o ponto mais forte que ele [Allan dos Santos] tem para discutir é a questão de lá ser ou não crime o que ele fez aqui”. “Mas, mesmo assim, não dá garantia total para ele de não ser extraditado”, afirma.
Caso o jornalista tivesse nacionalidade americana, a sua extradição seria impedida. Atualmente, Allan dos Santos está em processo de obtenção de visto de trabalho nos EUA, mas isso, de acordo com Furriela, não é um obstáculo para a extradição.
“O visto é uma autorização de entrada e permanência nos Estados Unidos. Não é uma autorização de domicílio. E, mesmo que fosse de domicílio, ele teria que ter a nacionalidade americana para que se impedisse a extradição”, observa.
Outra saída para Allan dos Santos seria pedir asilo político. “Ele pode alegar que há uma perseguição política. Se ele conseguir comprovar essa perseguição, ele pode obter asilo. Aí, os Estados Unidos são impedidos de extraditá-lo.”
Enquanto a análise sobre o pedido de asilo fosse feita, as autoridades norte-americanas poderiam dar uma ordem provisória para impedir a extradição. Mas as chances de que o governo norte-americano acate esse pedido são remotas. “É muito raro eles concederem isso”, afirma Furriela. Segundo o especialista, o fato de o Brasil ser uma democracia torna a concessão de asilo ainda mais difícil, já que essa medida costuma ser usada para proteger pessoas contra ditaduras.