O contrabando é parte integrante da cultura nacional. Há uma consciência entre a maioria dos brasileiros de que a pirataria é danosa ao país, que rouba empregos e financia o crime organizado. Mesmo assim, um em cada três brasileiros já comprou artigo contrabandeado. Essa flexibilidade é ainda maior em Foz do Iguaçu, por onde passa a maior parte do contrabando que chega ao Brasil e onde essa indústria clandestina emprega 15 mil pessoas.
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O instituto Datafolha sondou a opinião do brasileiro sobre o contrabando, ouvindo 2.401 pessoas em todo o país. Em Foz, 88% concordam que o contrabando prejudica a indústria nacional e 83% admitem que ele causa prejuízos diretos para o Brasil – percepção maior do que do restante do país, de 80% e 77%, respectivamente. Apesar dessas constatações, sete entre dez iguaçuenses disseram já ter comprado produto pirata. Desses,92% sabiam da origem clandestina.
No país, 83% dos entrevistados consideram crime vender mercadoria pirata; em Foz só 73% tem a mesma opinião. Em geral, 74% concordam que seja crime comprar produto contrabandeado, contra 68% em Foz. Ironicamente, entre os iguaçuenses que declararam já ter comprado produto contrabandeado esse índice é de 62%. Para 72% dos brasileiros, o contrabando incentiva o crime organizado e o tráfico de drogas, índice que baixa para 65% em Foz.
Prejudicados
A pesquisa sobre da percepção do brasileiro sobre o contrabando foi encomendada ao Instituto Datafolha pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (Etco) e pelo Fórum Nacional de Combate à Pirataria (FNCP), organizações que lideram uma coalisão de 70 entidades e associações de setores produtivos prejudicados pelo comércio ilegal.
De cada 10 entrevistados em Foz, seis acham que os artigos piratas diminuem o dinheiro que o governo tem para investir e três acham que não. Sobre os produtos, 60% admitem que eles reduzem os empregos dos brasileiros, 49% reconhecem que eles fazem mal à saúde, 31% discordam e 13% são indiferentes.
Entre os homens, 78% consomem contrabando; entre as mulheres, 60%. A incidência é maior entre os mais jovens (79%) do que entre os mais velhos (43%). Das pessoas de nível médio, 79% já adquiriram contrabando, índice que fica em 69% entre os mais escolarizados e 58% entre os menos escolarizados.
Daqueles que já compraram produtos contrabandeados, 89% apontam o preço baixo como principal vantagem. Entre os que disseram nunca ter comprado, 44% não veem nenhuma vantagem em produtos dessa natureza. Já em relação às desvantagens, a baixa qualidade (43%) é a característica mais citada espontaneamente, seguida da falta de garantia (36%), o fato de ser ilegal (5%) e a sonegação de impostos (5%).
Oito entre dez entrevistados concordam que os produtos contrabandeados são mais baratos porque não pagam impostos e porque não precisam se submeter às normas da fiscalização. As opiniões se dividem quando são questionados sobre a qualidade do material usados: para 56%, os produtos contrabandeados são feitos com materiais de pior qualidade, contra 44% que discordam dessa afirmação.
Poucos ganham, muitos perdem
Pela pesquisa do Datafolha, 92% dos entrevistados disseram que o brasileiro deixaria de comprar produtos contrabandeados se o preço dos produtos vendidos legalmente no Brasil fosse menor. Para 42%, os fabricantes de artigos contrabandeados têm lucros menores do que os fabricantes brasileiros. A realidade, no entanto, é outra.
“Esse é um negócio em que poucos ganham e muitos perdem”, diz o deputado federal Efraim Filho (DEM-PB), presidente da Frente Parlamentar de Combate ao Contrabando e à Falsificação. Os poucos que ganham estão encobertos pelo anonimato, mas os números dão uma pista muito concreta de quem perde.
Estudo realizado pelo Fórum Nacional de Combate à Pirataria (FNCP) em 15 setores da economia concluiu que as perdas com o comércio ilegal chegaram a R$ 65 bilhões no ano passado. Só em arrecadação federal, a perda seria de R$ 29,3 bilhões, o equivalente a um ano inteiro de arrecadação do estado do Paraná.
Outro estudo, este encomendado pelo Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf), revela o lucro da indústria clandestina. Foi avaliada a variação de preço dos 10 produtos mais contrabandeados desde a venda em 180 lojas em Ciudad del Este, no Paraguai, até a revenda em 120 lojas no Brás, Santa Ifigênia e no comércio da Rua 25 de Março, em São Paulo, principal destino dessas mercadorias.
O contrabando tem alta rentabilidade para os cabeças do negócio. Descontando os custos com transporte, pessoal, propina, risco de perda, armazenagem e distribuição, o lucro com o cigarro (o produto mais contrabandeado atualmente) chega a 231%. Brinquedos dão lucros de 323% e medicamentos dão até 901% de rentabilidade.
Para o economista e presidente do Idesf, Luciano Barros, a medida mais eficaz é atacar a lógica econômica do contrabando. “A alta carga tributária é o que faz o produto contrabandeado mais barato”, resume. Assim, se o produto legalizado for mais competitivo, vai reduzir a atratividade financeira da mercadoria contrabandeada. Ele aponta ainda um maior controle das fronteiras e a criação de uma agenda positiva de caráter empresarial entre o Brasil e o Paraguai para que o país vizinho se desenvolva de forma sustentável. (MK)
Apesar da desesperança, iguaçuense aponta soluções
Seis entre dez moradores de Foz do Iguaçu acreditam ser impossível livrar a cidade do contrabando. Das pessoas ouvidas pelo Datafolha, 59% veem que Foz está predestinada à pirataria, enquanto 41% dizem ser possível colocar a economia local no mercado legal. O contrabando na região é tão visível que 60% dos moradores apontam as margens do Rio Paraná como o maior canal por onde ele escoa. Outros 20% citam a Ponte da Amizade e 16%, o lago de Itaipu.
Habituados a conviver com o contrabando que vem do Paraguai, os moradores de Foz também opinaram sobre o que poderia ser feito para eliminá-lo. Para 45%, o reforço no policiamento e controle das fronteiras seria uma medida muito eficiente. Outros 42% acham a estratégia apenas um pouco eficiente. O bloqueio total das fronteiras pela Polícia Federal é pontado como muito eficiente por 32% dos entrevistados, um pouco eficiente por 40% e nada eficiente por 26%.
Na opinião dos iguaçuenses, a medida mais eficiente para pôr fim ao contrabando tem um aspecto mais social do que policial. Para 62% dos entrevistados pelo Datafolha, a ação mais eficiente seria a criação de programas de incentivo ao emprego nos dois lados da fronteira. Do ponto de vista da legislação, 39% veem muita eficiência na adoção de leis com penas mais duras para o crime de contrabando, enquanto o mesmo porcentual vê isso apenas como um pouco eficiente.
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