Pela terceira vez na vida venho a Frankfurt, na Alemanha. Na primeira, há 40 anos, lavei prato para ganhar dinheiro como mais um trabalhador ilegal que carregava o piano do trabalho braçal. Na segunda vez, 20 anos depois, desembarquei a convite da Inter Nationes, com um grupo de escritores e jornalistas, e a experiência foi evidentemente bem melhor, incluindo um périplo pelas principais cidades da Alemanha, apenas um ano depois da queda do muro, e uma visita à monumental Feira do Livro de Frankfurt. O mundo dá voltas e, outros 20 anos, aqui estou de novo. Desta vez o convite foi da Biblioteca Nacional, que começa a preparar a presença brasileira para o ano que vem, quando seremos o país homenageado.
Lançou-se uma revista bilíngue Machado com textos de autores contemporâneos; e uma série de palestras institucionais e entrevistas de escritores, além do programa de apoio às traduções, tenta criar o que nos falta: alguma imagem internacional da literatura brasileira, como um corpus de temas, obras e linguagens, de que estamos carentes. Não de literatura, bem entendido, mas de imagem mesmo. Fala-se mal de Jorge Amado, um criador de estereótipos brasileiros, mas com ele o país tinha essa imagem literária, para o bem ou para o mal sua obra consubstanciava uma vertente importante da cultura brasileira, que continua viva, como prova Gabriela. Reclamar dele é, de certa forma, reclamar do país, que parece teimar em não ser o que deveria ser.
A Feira de Frankfurt tem nome de quermesse Frankfurter Buchmesse , mas, curiosamente, não vende livros. Quem quer comprá-los vai à praça em frente do pavilhão gigantesco e escolhe volumes das bancas improvisadas de sebo que dão um toque nostálgico, de Terceiro Mundo, à irritante perfeição germânica. Acham-se até velhos discos de vinil. Na Feira mesmo só se entra com crachá. Tenho o meu aqui diz que sou um Austeller, Exhibitor o mesmo crachá que (e isso mais que tudo diz que estou num país rico) permite passagem gratuita no transporte público da cidade.
Tirando o pitoresco da festa carnavalesca de jovens fantasiados à "Hobbit", um espetáculo que diverte e impressiona nos pátios da Feira, é um mundo de executivos, rolando nesses corredores infinitos com iPads e celulares à mão e negociando não exatamente livros, mas contratos. Posso imaginar a fila diante do agente do chinês que ganhou o Prêmio Nobel. Estive na sala dos agentes um pavilhão orwelliano de milhares de mesinhas impecavelmente simétricas com quatro cadeiras e tomadas elétricas que caem do céu a cada dois metros para recarregar traquitanas, e milhares de editores e agentes sussurrando contratos em encontros que nunca passam de 15 minutos. Para quem escreve, o mapa da mina é ali. O resto é vitrine.
Eu ia falar do silêncio de Frankfurt, uma cidade incrivelmente silenciosa. Mas me perdi.
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