Com menos de uma semana a frente da Urbs, José Antônio Andreguetto já teve de enfrentar sua primeira greve do transporte coletivo e está em meio às negociações para a nova tarifa técnica. Em entrevista à Gazeta do Povo, ele disse que a situação financeira do sistema é “triste”, defendeu a gestão pública dos recursos do setor e adiantou que a atual gestão quer estabelecer uma nova tarifa que contemple a renovação da frota.
A frota de Curitiba está envelhecida, com mais de 400 ônibus com idade vencida (o limite do contrato é de 10 anos). A atual gestão vai conseguir resolver isso?
É uma meta que temos aqui para alcançar. Temos que restabelecer essa reposição para o sistema de transporte de Curitiba voltar a ser a referência que sempre foi.
Mas para isso a Urbs admitiria dar uma tarifa técnica acima de R$ 4, como é especulado atualmente?
Não temos pedido oficial das empresas ainda. Temos uma equipe técnica aqui da Urbs que acompanha todos os itens da planilha para reajustar de acordo com os valores reais. Vamos chegar ao valor real, incluindo a reposição da frota.
*Nota da redação: a tarifa técnica atual (aquela que é repassada às empresas por passageiro transportado) está em R$ 3,6653. Esse valor poderia ser ligeiramente maior, mas vem tendo um desconto de R$ 0,0645 porque as empresas não estão renovando a frota.
A antiga gestão abriu uma comissão que acabou enxugando a tarifa técnica. Isso azedou a relação dela com as empresas. Como será a relação da atual gestão com os empresários?
Digo que o problema do sistema, para ser resolvido, passa por um pacto de governabilidade que envolve todos os atores, inclusive os órgãos fiscalizadores, para que tiremos do tubo de oxigênio o sistema de transporte e que ele possa respirar normalmente. O sistema de transporte está entubado hoje. Temos que fazer isso de uma forma transparente, onde todo mundo entenda o que está se fazendo e o que está se pagando. Não existe omelete sem quebrar ovo. Não tem como prestar um serviço sem ter um custeio, mas é necessário que todos pactuem.
O contrato de concessão do transporte coletivo de Curitiba é polêmico. Órgãos de controle e até uma CPI já o analisaram. Esse contrato deve ser rompido?
Digo que todo contrato foi feito para ser cumprido. Mas todo contrato pode passar por uma adequação dentro das normas legais. Não estou dizendo que haverá isso. Mas qualquer contrato pode ser realinhado dentro de mecanismos legais e técnicos. Hoje, o que temos é esse contrato.
O senhor é a favor de subsídios públicos para equilibrar as contas do setor?
Tenho uma opinião bem clara. Todo sistema que tem que ser sustentável para não ficar dependente de nenhuma vontade política ou da necessidade de aportar recursos de outras origens. Mas não podendo, os poderes estadual, federal e municipal têm de buscar a manutenção e, se for necessário o subsídio, subsidiar.
A reintegração do transporte coletivo vai ser concluída até quando?
Até o final de julho concluiremos os estudos necessários para buscar a totalidade da integração. Não é que teremos todas as linhas integradas daqui a seis meses. Mas temos que estar com todos os estudos prontos e reintegrar o máximo de linhas nesse meio tempo. A exemplo do que fizemos ontem [segunda-feira, 24, com a volta da linha Colombo-CIC] , vamos fazer em breve a reintegração de Araucária a Curitiba e outras que já estão delineadas. Mas queremos fazer um planejamento de integração total.
Mas a reintegração do sistema é muito mais do que retomar linhas que foram extintas. Hoje a gestão dos recursos é separada [entre Urbs e Comec], há tarifas e sistemas de cobrança distintos...
Nossa meta é buscar a reintegração total. Fizemos a integração física da Colombo-CIC. Tem a integração da bilhetagem, que queremos restabelecer e os estudos vão apontar como chegar lá. E onde é possível, buscaremos a integração até de valores. Mas não estou dizendo que haverá o mesmo valor.
O senhor está falando sobre os quatro degraus tarifários, certo? Os considera justos?
O anel [tarifário] é justo e temos discutido isso com a Comec e com os prefeitos da região metropolitana. Mas cada um reponde por si. Essa é uma ação integrada, como a do lixo, que precisa ser discutida em conjunto. Agora tem alguns anéis que não vamos conseguir unificar [a tarifa]. Tem o de R$ 4,70, por exemplo. Não podemos penalizar o povo de Curitiba e elevar a tarifa daqui ou de outros municípios mais próximos a R$ 4,70.
A antiga gestão deixou pronto um edital para manutenção de um novo sistema de bilhetagem em Curitiba. O senhor pretende tocá-lo?
Sem qualquer comparação com outros sistemas, mas o nosso sistema ainda deixa a desejar. Precisamos avançar. Não podemos admitir um carregamento limitado do cartão. Temos tecnologia para ampliar isso. Hoje você paga conta com o celular. Porque não carregar o cartão do transporte [pelo celular]? Isso é um atrativo para o usuário voltar a usar o transporte coletivo.
Mas o senhor pretende tocar essa licitação mesmo com a discussão para reintegração dos sistemas?
O [sistema] metropolitano tem o [sistema] dela. A gente tem o nosso. Mas temos que buscar um sistema que converse com o da região metropolitana.
Quando houve a desintegração financeira da RIT, a gestão da bilhetagem metropolitana foi delegada para as próprias empresas. Em Curitiba, o dinheiro passa antes por um fundo público. Conceitualmente, qual o modelo prefere?
Nossa intenção é manter no fundo público porque temos uma estrutura pronta para fazer a gestão. Não temos nenhum motivo pra abrir mão do poder público cumprir sua função. Não quero aqui criar nenhuma questão [polêmica] com a região metropolitana, mas Curitiba tem um fundo criado por lei. Não tem porque abrir mão de fazer esse controle.
Qual a atual situação do caixa da Urbs?
É triste. Não falo em números, mas é uma situação delicada e que teremos de nos esforçar muito para sanear o sistema. Muitas vezes vinculam Urbs, empresas, prefeitura. Mas tudo é o sistema de transporte de Curitiba. Temos um sistema de transporte em uma situação caótica financeiramente e precisamos resgatar isso mais rapidamente possível.
Mas isso prejudica a saúde financeira da própria Urbs?
Sim. Isso também acaba prejudicando o caixa da Urbs.
A antiga gestão pretendia arrecadar mais recursos para a Urbs com a concessão de espaços que estavam ociosos. Como está esse processo?
Estou me inteirando agora. Mas que eu tenha conhecimento, um dos principais objetivos é gerar novas receitas. Temos um levantamento sendo feito para colocarmos todos esses ativos em favor do sistema de transporte. Se há lojas que estão fechadas e se há alguma área que podemos comercializar, esse recurso será em prol do sistema de transporte.
A gestão Gustavo Fruet também abriu um Procedimento de Manifestação de Interesse [PMI] para eletromobilidade. Isso colocaria um novo modal na cidade. O que o senhor pensa sobre esse processo?
Não me aprofundei ainda. Mas acho que não a gente não pode ficar sentado em cima do que existe. Temos que buscar avanços, inclusive no sistema de transporte. Se tivermos opções de novos modais, que tenham sustentabilidade tanto financeira quanto ambiental, por que não? Temos que buscar novas alternativas.
E quanto ao Uber? Pretende regulamentá-lo?
Estamos estudando isso, mas estamos acompanhando paralelamente a regulamentação federal. Uma coisa é certa: temos que ter regulamentação, não pode fugir disso em hipótese alguma. Temos um processo correndo no legislativo federal, que deve retomar entre fevereiro e março com o encerramento do recesso parlamentar. Se tivermos uma regra federal, fica tudo mais fácil resolver.