Ao invés de multas, desconto na tarifa. As empresas do sistema federal de concessão de rodovias que não realizarem obras previstas em contrato no prazo estipulado perderão parte da receita. A mudança nas regras está em um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), que será assinado nesta semana. O documento foi elaborado em comum acordo pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) juntamente com as concessionárias e vale já para o próximo reajuste de tarifas. No Paraná, a mudança pode impactar três empresas responsáveis pelas rodovias que partem de Curitiba, rumo a São Paulo e Santa Catarina, pelas BRs 116, 101 e 376.
"O dinheiro da multa cai na conta comum do governo. Já o desconto na tarifa transfere o benefício diretamente para o usuário, que é quem foi prejudicado", argumenta Viviane Esse, superintendente de Exploração de Infraestrutura Rodoviária da ANTT. O valor deve ser proporcionalmente maior do que as multas e será atrelado à arrecadação. A quantidade e os valores das multas já aplicadas não foram informados pelo governo ou pelas concessionárias, com o argumento de que ainda estão em discussão.
Viviane comenta que fatores externos atrapalharam o cronograma de obras. "A remoção de um poste, de uma linha de energia, de um duto, causa um transtorno. Autorizamos que a concessionária pague pelo serviço, para agilizar o processo, e mesmo assim demora", conta. Ela afirma que outros casos, como licenças ambientais e desapropriações, tornaram impossível cumprir alguns investimentos no prazo previsto. "Nossos maiores problemas são para iniciar a obra. Depois de começada, anda", diz. Atualmente, as rodovias do sistema federal de concessão no Sul do Brasil se transformaram em canteiros de obras. Alguns trechos têm até seis barreiras, com operários na pista. "São 90 frentes de trabalho no Paraná e em Santa Catarina", afirma Viviane.
Na prática, obras atrasadas já impactam a tarifa. Investimentos não realizados pesam na hora de fazer o reajuste da tarifa. A novidade está em definir em que medida a concessionária é responsável pela demora. O novo acordo estabelece um cronograma possível de ser executado e deixa evidente quando a demora pode ser creditada à concessionária.
Além da pressão feita pela agência reguladora que fiscaliza as concessões federais de rodovias, usuários também cobram medidas pelo atraso das obras. O presidente da Federação de Empresas de Transporte de Cargas do Paraná (Fetranspar), Sérgio Malucelli, afirma que as entidades de classe prejudicadas pela demora estão se organizando para cobrar que as obras saiam logo.
Preço na Litoral Sul ficou bem acima da inflação
O contrato prevê que o reajuste do pedágio nas concessões federais é fixado pela variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é usado pelo governo como aferidor de inflação. Mas, na prática, as tarifas pagas pelos usuários nas praças de cobranças não batem com o valor original reajustado pelo IPCA. Além de arredondamentos para facilitar o troco, o reajuste da tarifa é afetado por uma série de fatores, como isenções não previstas em contrato, custos adicionais, alterações em impostos ou algum tipo de perda de receita.
Das três empresas que administram rodovias federais que cortam o Paraná, uma teve variação de tarifa acima do IPCA, outra bem abaixo e a terceira igual ao índice (veja infográfico ao lado). Os valores de pedágio da Autopista Litoral Sul, responsável pela ligação entre Curitiba e Florianópolis, subiram 54,5% nos últimos cinco anos contra os 33,87% da variação do IPCA. Caso tivesse acompanhado a inflação, a tarifa deveria ser de R$ 1,50 e não de R$ 1,70. A situação se inverte na Autopista Régis Bittencourt, entre Curitiba e São Paulo. Com reajuste de 20%, abaixo da inflação, o valor que hoje é de R$ 1,80 poderia ser de R$ 2. Os preços praticados nas praças de pedágio do trajeto CuritibaLages (SC), administrado pela Autopista Planalto Sul, variaram de acordo com o IPCA.
Outro lado
"É absurdo pôr a culpa pelo atraso nas costas das concessionárias"
A demora na execução de obras não é culpa das empresas, assegura Eneo Palazzi, superintendente da Autopista Régis Bittencourt. "Fica tudo como atraso da concessionária, mas não é", diz. Ele afirma que as situações que resultaram nessa situação não estavam sob o controle das empresas. Licenças ambientais, desapropriações burocráticas ou judiciais e até dificuldade para aprovação de projetos simples como o reforço de uma ponte em Registro (SP), que teria levado dois anos para ser autorizado complicariam o tempo de execução das obras. "É um absurdo colocar nas costas das concessionárias. Quando uma obra não é realizada, nós perdemos, porque ela deixa de ser considerada na conta da tarifa. Temos todo o interesse que as obras sejam feitas no prazo", declara.