Dia de clássico: um blog para quem gosta de bibliotecas e sebos.| Foto: Foto: Antonio Costa/ Aniel Nascimento/ Gazeta do Povo

Raridade

Coleção de ex libris é uma das únicas do Brasil

O único acervo de raridades que foi adquirido, em 1982, pela Biblioteca Pública do Paraná é uma coleção especial de ex libris que pertenceu ao colecionador Dr. Ely de Azambuja Germano. Todo o resto do acervo foi formado a partir de doações.

A coleção está exposta no segundo andar da biblioteca até o dia 27 de outubro e conta com cerca de 2 mil exemplares de ex libris de diversas procedências. É uma das únicas dessa espécie no Brasil.

O ex libris é uma etiqueta que está normalmente nas primeiras folhas do livro e indica a quem a obra pertence – pessoa física ou a uma biblioteca. Pode aparecer ainda em formato de carimbo. O significado epistemológico do termo em latim é "dos livros de..." e, por isso, é um indicativo de posse bibliográfica. A coleção é rara porque não são simples etiquetas, mas sim verdadeiras obras de arte que unem gravuras de pequenas dimensões com a identificação de quem pertence o livro.

O primeiro ex libris brasileiro, segundo informações da Biblioteca Pública, data de 1798 e pertenceu a Dona Isabel de Menezes, casada com um rico comerciante português.

O mais antigo ex libris que se tem registro no Paraná é o de José Cândido da Silva Murici, na forma de carimbo e representando um cinto normando – ele foi utilizado por volta de 1860.

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Os 2.794 diferentes títulos de obras raras que existem na Biblioteca Pública do Paraná chegaram ao acaso, por meio de doadores. Um deles, que não se interessava mais em guardar o livro, deixou para a biblioteca uma das raridades escritas pelo italiano Ludovico Ariosto. Durante a separação dos livros doados– onde se decide para qual setor cada um vai – o de Ariosto ganhou o lugar mais digno de sua importância, o cofre. É lá que está atualmente a obra intitulada Orlando Furioso, escrita em 1584. Trata-se de uma epopeia de 46 cantos em oitava-rima classificada como tragicômica. É escrita em italiano e tudo o que se sabe dela é por meio de outras pesquisas porque o livro – assim como todo o resto da coleção de obras raras – tem recebido poucas visitas de pesquisadores. Esta é a dura realidade das raridades que existem em Curitiba. Apesar de estarem catalogadas, é difícil encontrar alguém com interesse e força de vontade para traduzi-las e estudá-las a ponto de explicar o contexto em que foram escritas e o que há de fato no conteúdo. Ariosto acaba sendo uma exceção, porque há estudos mais avançados no mundo afora sobre ele. Essa sua obra Orlando Furioso foi editada diversas vezes, é considerada uma das mais importantes da Renascença Clássica e teria começado a ser escrita em 1503. É dividida em três partes: fala da paixão e ciúmes do personagem Orlando por Angélica, da guerra entre cristãos e mouros e dos amores de Rogério e Brandant. A obra foi traduzida por Cervantes e o que mais impressiona nela é ver 43 folhas ilustradas com ricos traços de desenho. A obra rara está à disposição para consulta na biblioteca, assim como o restante do acervo.

Menos conhecida é a obra italiana Il Cristiano Instruito, escrita em 1687 por Paolo Segneri. Ele pertencia à Companhia de Jesus e fez um estudo sistemático das sagradas escrituras. A obra traz discursos morais sobre a mentira, a avareza, os mexericos. Trata ainda da injúria, do adultério e do matrimônio. Se parece com um guia de catequese aos cristãos.

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Legislação

Do Direito, o setor de obra raras guarda um grande livro das ordenações e leis do reino de Portugal, de 1695, que foram estabelecidas por dom João VI e impressas pelo mandato de dom Pedro II – esta legislação foi adotada por um período no Brasil. Há também uma coleção de Manuais do Cidadão Brasileiro de cerca de 1840 a 1848. São quase como um tratado de direito. Falam quem são os moradores do Brasil, da pensão alimentícia, dos órfãos. Um dos manuais diz que é proibido seduzir mulher honesta menor de 17 anos – se o delito for cometido existe pena de um a três anos de reclusão e o cri- minoso deve sair da cidade onde reside a seduzida.

Em 1759, por exemplo, foi proibido dar o nome de libertos aos filhos e netos de escravas. Em 1848, um manual estabelecia a profissão de soldadas de caixeiros, que, além de receber um certo valor em dinheiro, tinham o direito à casa, cama e mesa.

Dois livros sobre o café revelam aos leitores da época os poderes da bebida. Um deles é um discurso acadêmico de 1731. O autor diz que o café foi levado à Europa pelo senhor Nicollo Confole d’Amsf­terdam e Prefetto da Companhia das Índias. E diz que "o café, apresso dos árabes e turcos, é uma bebida antiquíssima."

Outras obras

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Livros mais recentes também ficam no setor simplesmente por terem na folha de rosto a assinatura de preciosos escritores, como Rachel de Queiroz. Além disso, está guardada na seção uma das primeiras edições de Casa Grande e Senzala, de 1933.

Universidades

No prédio da Universidade Federal do Paraná (UFPR), na Santos Andrade, existe um setor de obras raras principalmente da área jurídica. O espaço é uma relíquia e infelizmente não é aberto ao público em geral – serve de apoio aos alunos da instituição para consulta no local. O acervo ainda não está completamente catalogado, mas uma das raridades é um livro de 1585, escrito em latim, sobre Direito Canônico. Há obras ainda do Direito Romano (1648) e do Direito Natural (1706). Ao todo, são cerca de 10 mil volumes entre obras raras e especiais.

Na Pontifícia Universidade Cató­lica do Paraná (PUCPR), o setor de raridades, que tem cerca de 4 mil obras, é aberto ao público para consulta no local. Esse acervo tem obras como a de João Crisóstomo, teólogo e escritor cristão que escreveu sermões e um número significativo de cartas. Ele foi patriarca de Constan­tinopla no fim do século IV.

Há também cartas da espanhola Santa Teresa de Ávila: elas foram di­­ri­gidas, na época, a religiosos, monjas, leigos e autoridades civis. Santa Teresa foi canonizada em 1622.

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Raridade

A obra mais antiga é de 1515. É um livro de poesia portuguesa lírica, escrito por um advogado romano do século II, de nome Aulo Gelio. Intitula-se Noites Áticas: nela, ele anotou desordenadamente todas as curiosidades que ouvia ou lia. A PUCPR tem ainda dois livros de Aristóteles e uma Bíblia antiga em língua holandesa conhecida como Statenbjbel (Bíblia do Estado). Ela impressiona pelo tamanho: tem 14 cm de espessura, 32 cm de altura e 25 cm de largura. Pesa 5 quilos.

Serviço: a PUCPR expõe seus livros raros no saguão da Biblioteca Central, no bairro Prado Velho, a partir de hoje até 29 de outubro. A exposição fica aberta de segunda a sexta, das 8 às 18 horas; sábado, das 8 às 18 horas; e domingo, das 8h30 às 12h30.