A quase um mês da abertura dos Jogos Olímpicos Rio-2016, uma preocupação fica cada vez mais latente entre as agências de segurança nacional: o Brasil é potencial alvo de terrorismo. Não apenas por sediar um dos maiores eventos esportivos mundiais, mas em razão da abertura do país (a maior nação católica do mundo) aos refugiados, da fragilidade na tríplice fronteira e do avanço do terrorismo com o ataque recente em Orlando, nos Estados Unidos, e ao aeroporto de Istambul, na Turquia.
Se os americanos e europeus, com know-how histórico contra ameaças externas, foram vítimas, seja de lobos solitários ou células terroristas coordenadas pelo Estado Islâmico (Isis, ou Daesh, em árabe), a falta de experiência brasileira pode facilitar a atuação de radicais no país. Em abril, a própria Agência Brasileira de Inteligência (Abin) confirmou a autenticidade de um post no Twitter de um integrante do Isis, que afirmou que o Brasil será alvo de ataques.
Os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio 2016 devem reunir:
700 mil turistas
209 nações
100 mandatários
30 mil jornalistas
12 mil atletas.
38 mil militares das Forças Armadas (Marinha, Exército e Aeronáutica), sendo 20 mil sediados no Rio de Janeiro, além das forças estaduais disponíveis.
Sensação equivocada
“Existe a sensação de que o Brasil não é um alvo. Isso está ligado a nossa visão de sermos um país pacífico, com todas as etnias e religiões convivendo em paz, mas isso não pode esconder a ameaça terrorista do século 21. Quando o terrorista vai planejar um ato destes, escolhe alvos mais fáceis”, afirma o cientista político e professor de Relações Internacionais na ESPM, Heni Ozi Coukier. Ele já trabalhou no Conselho de Segurança da ONU, e é mestre em Resolução de Conflitos Internacionais pela American University, em Washington, Estados Unidos.
Segundo Coukier, o país está, sim, na mira do terror. “O terrorismo precisa de palanque. É natural que o Brasil seja um alvo (em razão dos Jogos Olímpicos). Vai ter delegações de muitos países. Alemanha não era alvo óbvio do terrorismo palestino em Munique, mas a delegação israelense era”, lembrou o especialista. Durante a Olimpíada de 1972, o ataque do grupo Setembro Negro a atletas israelenses deixou 18 pessoas mortas.
Foz do Iguaçu
A preocupação com o tema cresceu tanto que o Ministério da Defesa lançou durante a semana uma campanha para ensinar a população brasileira a identificar possíveis suspeitos de terrorismo aos moldes do que tem sido aplicado na Europa.
Foz do Iguaçu, Brasília e Rio de Janeiro contarão com uma sede provisória da Polícia Internacional (Interpol) para reforçar a segurança do país durante os Jogos Olímpicos e Paralímpicos Rio-2016. Serão mais de 200 delegações de policiais estrangeiros que trabalharão nos centros de controles destas três cidades.
Na cidade fronteiriça do Paraná, os policiais federais contarão com apoio específico de agentes do Paraguai e Argentina, países que formam a tríplice fronteira.
Mais segurança para aeroportos
Após o ataque terrorista ao aeroporto de Istambul, na Turquia, o ministro dos Transportes, Maurício Quintella, afirmou durante a semana que solicitará à Secretaria Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, reforço de segurança nas áreas públicas dos aeroportos brasileiros, entre eles o aeroporto internacional do Galeão, no Rio de Janeiro. Ele mesmo ressaltou que as autoridades brasileiras estão em alerta depois do atentado.
Ação de lobos solitários é desafio, segundo Abin
Ataques de simpatizantes da ideologia propagada pelo grupo terrorista islâmico wahabita Estado Islâmico (Isis), chamados de lobos solitários, como o autor do ataque a boate gay em Orlando, estão também no centro da preocupação das agências de segurança do país.
Além de não manterem vínculos ou comunicações com grupos terroristas, há dificuldades de rastrear os passos desses lobos solitários para prevenir ataques já que, normalmente, são pessoas que não são monitoradas.
“A ação dos chamados “lobos solitários” representa desafio à atuação dos órgãos de segurança na prevenção ao terrorismo”, afirmou, por nota, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin). A agência diz ter desenvolvido uma série de metodologias e ferramentas para monitorar e identificar essas ameaças.
Paraná enviou 200 policiais para rio
O Paraná enviou cerca de 200 policiais civis e militares para reforçar a segurança dos Jogos Olímpicos e Paralímpicos do Rio de Janeiro. A maior parte deles são policiais militares. Assim, como Paraná, outros estados da federação também enviarão pequenas tropas para a capital fluminense. Para poder trabalhar no evento, todos esses policiais participaram de cursos de capacitação, que inclui ações antiterrorismo. O curso envolve também táticas de resgate em caso de eventual tragédia e identificação de suspeitos de terrorismo. Em um deles, foram reconstituídos cenários como os atentados ocorridos em Paris na casa de shows Bataclan.
O que diz a PF
A Polícia Federal, por meio de nota, informou que os órgãos de inteligência da instituição não encontraram indícios, até o momento, que apontem para possível ataque terrorista durante os Jogos. Além disso, a PF afirmou que trabalha há mais de 20 anos com ações de inteligência de enfrentamento ao terrorismo e que, recentemente, ganhou reforço com a sanção da lei Antiterror, n.º 13.260/2016.
Esquema olímpico
Rede de combate ao terror montada pela Abin para a Rio-2016:
Apoio externo
Mais de 80 agências estrangeiras de segurança ajudarão Brasil.
Centros de inteligência
Serão ativados durante todo o período da Olimpíada centros de Inteligência tanto no Rio de Janeiro quanto nas cidades-sede do futebol (Brasília, São Paulo, Salvador, Belo Horizonte e Manaus).
Avaliação de risco
Haverá avaliações de riscos de áreas e instalações ligadas aos Jogos. Oficiais de Inteligência da Abin já atuam na verificação de vulnerabilidades nos sistemas de segurança.
Observadores
Os chamados spotters, ou observadores à paisana capacitados na identificação de suspeitos de terrorismo, estarão espalhados pelos locais de competição como torcedores.
Protocolos
Já estão definidos protocolos de ação conjunta e estratégias de atuação coordenada em caso de ataque terrorista.
Agenda fixa de segurança contra ameaça externa divide opiniões
O avanço recente do terror e os Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro trazem à tona um debate sobre a necessidade de implantar no país uma agenda robusta contra ameaça externa com programas definidos e investimento forte. Especialistas ouvidos pela reportagem têm opiniões divididas.
Professor de Relações Internacionais na ESPM, Heni Ozi Coukier afirma que a população precisa aceitar que o terrorismo não faz distinção entre países para começar a cobrar das autoridades um programa de segurança interna.
“O Brasil precisa estar preocupado com isso, colocar na pauta, na agenda, e não tem feito isso. Precisa investir na área, ter uma integração, troca de informação com países de lidam com esse problema o tempo inteiro”, ressaltou.
Coordenação de ações
Para o professor de Direito Internacional da FAE Eduardo Saldanha, é mais provável que o país seja um local para coordenação de ações do que propriamente um alvo. O motivo seria a facilidade de permanência no país.
“Devemos nos proteger de locais onde essas pessoas possam ficar para coordenar ações no exterior, mas não acho que seja o caso de criar uma política permanente, mas de cooperação com estados que estejam interessados neste combate”, explicou.
Segundo ele, o Brasil tem necessidades mais urgentes que uma agenda fixa para segurança contra ameaça externa. “O país passa por uma crise estrutural muito grande e profunda. Já não tem orçamento, por exemplo, para investir no ministério das relações exteriores. Falar em política de segurança permanente para se proteger de ameaça externa é pular prioridades”, mencionou.
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