Se os sistemas de busca na internet não me enganam, restam apenas quatro aviários no Centro de Curitiba. Os que não baixaram as portas pouco a pouco se rendem à era pet shop. No lugar das gaiolas de aves, "araras" nas quais está à exposição a última tendência em moda canina. Pois é por esse raciocínio está cada vez mais raro encontrar uma galinha nas redondezas. Mas não impossível.
O Aviário Estefanes, na Rua José Loureiro, resiste bravamente, mantendo viva a tradição do comércio galináceo, alegria da petizada e das panelas de ferro. O local chega a vender quatro galinhas por semana, com preferência para as pretas. Não tem encalhe, graças aos deuses. "Até sexta-feira a pretinha que está naquela gaiola vai embora", diverte-se a vendedora Beth Cardoso Arruda. Se for magrinha, custa vintão, uma pechincha. Do lado de fora, duas moçoilas, a caminho do Terminal Guadalupe, fazem "tchu-tchu" para a penosa, como se fosse o mais fofo dos yorkshires. "A gente diz que é psicóloga. O pessoal entra no aviário e fica chorando saudades da roça", diz.
"A gente", no caso, é Beth e sua colega de balcão, Sandra de Freitas (foto). Ambas são do Oeste Catarinense, foram criadas no campo e, qual seus clientes, "a-do-ram" o canto dos galos ao longo do expediente. Sim, também há galos à venda. São um case de sucesso. Não esquentam lugar na gaiola, tão rápido encontram comprador. E, quando se vão, pinta sempre um morador dos prédios vizinhos reclamando, não dos cocoricós, mas da ausência deles. As vendedoras desconfiam que, tamanha a paixão, tem gente que cria galinha e galo no apartamento, o que faz lembrar o belíssimo conto Hóspede secreto, de Miguel Sanches Neto.
Galos e galinhas à venda são, igualmente, um marketing barato. Há quem ouça os cacarejos na Rua João Negrão e lembre que precisa comprar ração, vermífugo e quetais para a fauna doméstica. É o que basta. Dá meia volta e aproveita para mais uma sessão nostalgia ao lado das gurias, cuja conversa parece ecoar "naquelas tardes fagueiras, à sombra das bananeiras, debaixo dos laranjais", aiai.
O ritual se repete em outros estabelecimentos, mesmo sem galinhas à venda. É o caso do Aviário São Paulo, na Rua Voluntários da Pátria, com meio século de serviços prestados. Não que falte freguesia. Nos dizeres de Wilson Neves, o proprietário, o problema é comprar e não poder carregar. A vida moderna parece não combinar com o transporte de galinhas no biarticulado, por exemplo. Um transtorno. Além do mais, o comércio de aves, como papagaios e as adoráveis calopsitas, é mais lucrativo.
A clientela, contudo, é tão animada como a que comprava galinhas. "Tua periquita tá cara, hein?", brinca um freguês ao passar pelo caixa. Dado o tempo em que está no mercado, na loja de Wilson tem quem compre alpiste e marque na cadernetinha para pagar no fim do mês, como se o Rio Ivo ainda passasse ali na frente. De olho no futuro, contudo, o comércio atende aos gostos mais exóticos. O aviário vende cobras, por encomenda. Uns montam aquários, outros montam terrários habitados por jararacas e cascavéis. "Certificadas pelo Ibama", frisa. "Tem maluco para tudo." É de dar calafrios e palpitação imaginar uma serpente dormindo no sofá da sala depois de ter almoçado o gato, é claro.
Há quem prefira emoções mais leves. "Tem ração de tartaruga? Não quero a de camarão", avisa a compradora para Antônio Batista, há 18 anos à frente do Recanto dos Pássaros, na Rua do Rosário. Ele se alinha entre os que, com pena, igualmente se despediram da venda de galinhas. "Não passa um dia sem pedidos. Inclusive de pintinhos. Diz que ajuda criança a falar, sabia?". Batemos um papo sobre leis ambientais, criadouros, higiene e métodos quase seguros para carregar uma galinha debaixo do braço.
"Vou parar de vender passarinhos também", lamenta, ao tratar de um amor surgido quando piá. Tem 30 aves em sua casa, no bairro Santa Felicidade, sua alegria. Fala delas com pendores de ornitólogo. Quanto ao aviário, vira pet a cada dia. "Nada de chocolatinho para cachorro, seu Antônio?" Só havia waffles. Tempos difíceis.
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