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Com os crescentes resultados favoráveis na justiça, os valores já exorbitantes das indenizações pedidas por ONGs do movimento negro ficam ainda maiores. A motivação dos processos vai desde “falta de diversidade” no quadro de funcionários de empresas a suposto envolvimento no tráfico de escravos no século 19. Algumas vezes, as entidades chegam a receber mais dinheiro que as próprias vítimas de racismo. Os Ministérios Públicos, seja federal ou estaduais, e o próprio Supremo Tribunal Federal (STF) apoiam a agenda de combate ao “racismo estrutural”, o que promove os pedidos audaciosos das ONGs. Recentemente, a Uneafro apresentou uma proposta para que o Banco do Brasil criasse um fundo nacional de reparação aos negros no valor de R$ 1,4 trilhão.
Apoiado pelas pastas de Direitos Humanos e Igualdade Racial do governo Lula, o Ministério Público Federal (MPF) iniciou uma investigação contra o Banco do Brasil por um possível envolvimento da instituição com a escravidão por volta dos anos de 1853 a 1855. A ação civil pública aberta pelo MPF começou depois que historiadores apontaram que o banco teria participação no tráfico transatlântico de escravos.
Foi em resposta a uma consulta pública realizada pelo MPF que a Uneafro sugeriu a criação do fundo nacional de R$ 1,4 trilhão. Segundo o cálculo apresentado pela instituição, o valor da indenização reparatória seria de 30% do lucro líquido do banco em 2023 multiplicado pelos 136 anos da falta de reparação. A verba seria usada para apoio e incentivo direto às empresas de pessoas negras, ações de valorização de comunidades de religiões de matriz africana, combate à miséria e à pobreza em famílias negras. Em defesa, representantes do Banco do Brasil assumiram o erro, pediram desculpas e solicitaram que a Justiça considerasse o contexto social da época.
Ao todo, foram cerca de 500 sugestões recebidas por meio da consulta pública. Entre as quais há medidas como capacitação antirracista, campanha de marketing contra o racismo e pagamento de bolsas de estudos para negros. A Associação de Produtores Quilombolas de Volta Miúda sugeriu que o Banco do Brasil custeasse a regularização fundiária do terreno da própria entidade como reparação histórica. Outras associações também levantaram ações relacionadas ao custeio de regularização de terras ou construções de casas para a população quilombola.
“Aprenderam conosco e passaram a fazer o mesmo”, diz advogado da Educafro
A judicialização de diversos casos por ONGs do movimento negro cresceu nos últimos anos e os valores exigidos se multiplicaram. Em 2021, a Educafro e o Centro Santo Dias de Direitos Humanos receberam parte dos R$ 3,5 milhões depois de um acordo extrajudicial com a rede Carrefour. O conflito judicial se deu depois da morte de João Alberto Silva, espancado na unidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul. Mesmo que a delegada do caso tenha afirmado não ter visto “cunho racial”, as ONGs acusaram a rede de não ter implementado ações contra o “racismo estrutural”.
Na época, o ex-juiz federal Márlon Reis, que advogou para as ONGs, comentou que outras entidades passaram a seguir o padrão de judicialização utilizado por eles. “Algumas das entidades que apresentaram essas queixas, curiosamente, aprenderam conosco e passaram a fazer o mesmo”, afirmou Reis. A Educafro está envolvida nos principais pedidos de indenização por danos morais ligados a situações de racismo.
As empresas XP e Ável Investimento também responderam a uma ação civil pública depois de terem publicado uma foto dos funcionários que, em sua maioria, eram homens, brancos e jovens. O motivo da ação foi por “falta de diversidade” no quadro de colaboradores das empresas. O Ministério Público do Trabalho do Rio Grande do Sul emitiu parecer favorável à ação que pedia o pagamento de R$ 10 milhões por danos morais e coletivos.
No processo, a XP demonstrou que possui projetos de curto, médio e longo prazo para a promoção da equidade e inclusão, o que agradou os autores da ação judicial. Já a Ável precisou contratar uma consultoria especializada para fazer um “plano de letramento em Diversidade e Inclusão” e se comprometeu a criar processos seletivos com vagas exclusivas para negros e mulheres a partir de um acordo firmado.
A Educafro também acionou a Justiça contra o Google pelo jogo “Simulador de Escravidão”, o qual simulava compra de escravos. A entidade pediu a indenização de R$ 100 milhões por danos morais coletivos. O Ministério Público Federal e o Ministério Público de São Paulo também entraram na ação. Na época, o Google retirou o jogo da loja de aplicativos e emitiu uma nota pedindo desculpas pelo ocorrido. Ainda não há informações sobre o avanço da ação judicial.
Poder Judiciário tem comprado pauta de combate ao “racismo estrutural”
“Estamos felizes, porque o CNJ [Conselho Nacional de Justiça] está abraçando as demandas do nosso querido povo afro-brasileiro”, disse frei David Santos, diretor-executivo da ONG Educafro, durante uma reunião do Observatório dos Direitos Humanos do Poder Judiciário em 2021. O observatório foi criado pelo próprio CNJ, elogiado por Santos.
A Gazeta do Povo já mostrou a força do discurso ideológico na atuação do Ministério Público. Uma das ações citadas pela reportagem é a da criação e divulgação de uma cartilha sobre racismo na atividade policial no Brasil com uso de diversas expressões identitárias. No documento elaborado pelo MPF, as penitenciárias são chamadas de “senzalas contemporâneas”.
“Também temos atuado, sempre com base na Constituição, em favor do heroico esforço da população negra por reconhecimento e iguais oportunidades, validando as ações afirmativas, imprescindíveis para superar o racismo estrutural que a escravização e sua abolição sem inclusão acarretaram”, afirmou o ministro Luís Roberto Barroso, durante a sua posse como presidente do STF.
A pedido do PT, a Corte decidiu analisar uma ação que quer impor aos poderes Executivo e Legislativo a implementação de medidas contra o “racismo estrutural”. Caso a decisão seja favorável, órgãos públicos de todas as esferas e até empresas privadas deverão destinar recursos para ações que priorizem pautas do movimento negro em suas gestões. Entre os pedidos do PT, estados e municípios seriam obrigados a elaborar e implementar um plano de combate ao racismo institucional e a aderir ao Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania.