Em dezembro, na esquina da Travessa Oliveira Belo com a XV de Novembro, quando anoitece e os sinos gemem, a gente fica feliz a cantar. Dentro e fora do Palácio Avenida. Em uma apresentação de Natal do Coral HSBC são de 20 mil a 25 mil espectadores nos prédios vizinhos ou em pé, no meio do calçadão, esperando pelo momento em que as janelas se abrem. Lá dentro, são pelo menos 120 crianças e adolescentes fazendo o que elas sabem de melhor: ser criança.
Para controlar a situação, a produção do espetáculo levanta os olhos aos céus e pede a ajuda que vem dos "anjos", funcionários do banco e seus familiares que cuidam das crianças antes, durante e após as apresentações. Com uma camiseta branca com desenhos de asas, a sensação que se tem é de que são mesmo especiais.
O anjo não é só a pessoa que ajuda a criança a se vestir, coloca a cadeirinha de segurança e alcança os adereços. A relação que se estabelece durante toda a noite é de carinho e confiança, mesmo que o contato possa durar só até logo depois dos fogos. É o anjo quem dá toda a cobertura para a criança, a proteção para que ela faça aquilo que sabe fazer bem, que é cantar.
Crianças e anjos chegam quase ao mesmo tempo, por volta das 18h30, no Teatro HSBC, que fica no subsolo do prédio e lancham. A interação com os mais experientes na função faz perceber que o clima é de bastante tranquilidade, apesar da ansiedade, e de paz. Sim, o tempo todo uma paz parece estar ali dentro.
Então as crianças são chamadas de acordo com o andar em que ficarão e o anjo começa a trabalhar, ajudando a vestir a bata, o cinto e fazendo a criança entrar no clima. Quando chega a hora de subir, são as crianças que conduzem a todos para sua janela, onde é conectado o cabo de aço na corda que garante que ninguém vai sair voando pelas janelas. Daí até o início do espetáculo são 45 minutos em que tudo é possível, menos sair de perto da janela ou ficar tentando olhar no vão da cortina.
E então as luzes se apagam, a plateia grita, as janelas se abrem e uma sensação gostosa invade o prédio. Não é possível saber se vem do público ou do brilho da criança cantando. Dali pra frente é um show de sincronia na entrega dos adereços e emoção, mesmo que seja tão difícil ver a multidão não, o anjo não pode aparecer até o final da última música, quando todos vão para a janela.
Fecham-se as janelas, mas o trabalho do anjo continua. Solta a criança do cabo de aço, desce, tira a bata e a cadeirinha, dá um beijo e um abraço e a libera para o último lanche e o embarque no ônibus. Ninguém chora ou fica triste porque acabou. No dia ou na semana seguinte tem mais. E pelo resto da noite a gente canta "Vem, está chegando o Natal", com uma sensação gostosa de esperança e infância.
Serviço:
As apresentações do Palácio Avenida vão até o dia 16 de dezembro, às sextas, sábados e domingos, com início às 20h15 e duração de 45 minutos.
Vida e Cidadania | 7:19
No papel de "anjo" por um dia, repórter conta como é a rotina de quem ajuda as crianças nas noites de espetáculo. É carinho e emoção do começo ao fim.