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Políticas públicas

Os desafios da educação para a próxima década

Cerca de quatro mil pessoas vão traçar as metas da educação brasileira para a próxima década, seis meses antes das eleições para presidente, governador e parlamentares. De 28 de março a 1.º de abril, a Conferência Nacional da Educação (Conae) vai debater, em Brasília, mais de cinco mil propostas educacionais.

As metas debatidas vão da educação infantil à pós-graduação e devem nortear a composição do Plano Nacional da Educação (PNE) para os anos de 2011 e 2020. As propostas apresentadas por representantes da sociedade civil e de órgãos públicos desde o ano passado não são nada modestas.

Erradicar o analfabetismo, direcionar até 12% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação e criar uma lei de responsabilidade educacional estão entre os pontos mais polêmicos. A reportagem da Gazeta do Povo apresenta os principais desafios que a educação brasileira deve enfrentar, apontaods pelo Conselho Nacional da Educação (CNE), órgão responsável em formatar o documento que servirá de base aos debates durante a Conferência.

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1 - Erradicar o analfabetismo, inclusive o analfabetismo funcional

O desafio é alfabetizar 44,2 milhões de brasileiros em dez anos. O número representa o total de analfabetos somado aos analfabetos funcionais, aqueles que, mesmo sabendo ler e escrever, não têm as habilidades de leitura, de escrita e de cálculo. De 2001 a 2009, segundo o Indicador de Analfabetismo Funcional (Inaf), o número de analfabetos totais caiu de 12% para 7% da população entre 15 e 64 anos. O número de analfabetos funcionais também apresentou redução, passou de 27% para 21% da população. Nessa velocidade, a eliminação do analfabetismo só ocorreria em cerca de 20 anos.

Para o presidente do Movimento Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos, é preciso incluir no próximo PNE um indicador capaz de medir nível de alfabetização das crianças até os 8 anos de idade. "Só assim o Brasil estaria dando um passo importante para fechar a torneira do analfabetismo", diz.

2 - Universalizar o atendimento do ensino fundamental e médio. Ampliação do ensino infantil.

O Brasil avançou no acesso ao ensino fundamental e o atendimento está quase universalizado, mas ainda tem sérios desafios a enfrentar com relação ao atendimento da educação infantil e ensino médio (veja números abaixo). Além disso, o atraso escolar é algo que preocupa os especialistas em educação. De acordo com um monitoramento realizado pelo Movimento Todos pela Educação, 25,7% dos estudantes brasileiros têm dois ou mais anos do que a idade recomendada por série.

Para o presidente da Câmara de Educação Básica, do Conselho Nacional de Educação (CNE), César Callegari, é preciso garantir educação com qualidade para todos. "Parece que a questão da qualidade já não é mais observada como era pela sociedade. Não basta o acesso, a escola precisa ser de qualidade. Esta questão tem de estar forte em amplos setores da sociedade", alerta.

3 - Ampliar o investimento em educação pública e atingir 12% do PIB até 2014.

O investimento em educação triplicou entre os anos de 2003 e 2008 e alcançou 4,7% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo divulgou o Ministério da Educação (MEC) nesta semana. Porém, os recursos destinados à área ainda estão abaixo do mínimo recomendado pela Organização Mundial para a Educação e Cultura (Unesco), de 5% do PIB.

Segundo o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, o desafio do financiamento é o maior a ser colocado em prática. "Para que as outras metas sejam atingidas é necessário que haja recursos suficientes. O Brasil avançou, mas ainda faltam recursos. Nos cálculos da campanha, só para a educação básica seriam necessários mais R$ 29 bilhões emergenciais para garantir uma educação de qualidade", diz.

Para que o aumento de recursos se torne realidade, é preciso garantir que a proposta a ser debatida na Conae, em Brasília, conste no Plano Nacional de Educação, a ser formatado pelo MEC, e depois passe pela aprovação do Congresso Nacional.

4 - Implantar o Sistema Nacional de Educação

A Constituição Federal, em seu Artigo 211, estabelece que a gestão educacional pública deve ocorrer em regime de colaboração entre a União, estados, Distrito Federal e municípios. Até hoje, não foi elaborada uma lei que regulamentasse como deve ocorrer esse regime de colaboração. Também não há unidade entre os sistemas de ensino estaduais, municipais e federais. A proposta a ser debatida na Conae é para criar o Sistema Nacional de Educação, mecanismo que passaria a integrar os planos nacionais de educação de estados e municípios.

Um dos principais desafios para a integração é fazer com que cada um dos municípios brasileiros passe a ser organizado por sistemas e conselhos de ensino. De acordo com a presidente do Conselho Nacional de Educação, Clélia Brandão, a maioria dos 5.562 municípios brasileiros ainda não tem conselhos de educação e está submetido à esfera estadual. "Em muitos municípios e estados com conselhos, a organização é irregular e ainda fica nas mãos dos secretários de educação", afirma.

5 - Criar Lei de Responsabilidade Educacional

A ideia é criar a Lei de Responsabilidade Educacional, a exemplo da Lei de Responsabilidade Fiscal, existente no país desde o ano 2000 e que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal. A proposta é criar mecanismos de responsabilização para estados, municípios, Distrito Federal e União quando não atingirem as metas educacionais estabelecidas pelo Plano Nacional da Educação.

Para o presidente do Movimento Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos, as metas devem ser acompanhadas ano a ano. "É preciso ter prazos e se não houver cumprimento, os responsáveis por isso terão de ser punidos", diz. Já o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, defende que os gestores educacionais só podem ser punidos se ganharem a responsabilidade de gerir a pasta da Educação. "Os educadores não cuidam do dinheiro para a Educação. Se isto não mudar, quem deve ser responsabilizado são os chefes do Executivo", diz.

6 - Implantar escola em tempo integral na educação básica.

De acordo com dados do censo da educação básica haviam 87.497.548 crianças e adolescentes matriculados nesta etapa de ensino no Brasil em 2009. Deste total, 2.102.195 matrículas (2,4%) são em período integral. O restante, grande parte dos estudantes brasileiros, passa apenas quatro horas na escola por dia.

Para melhorar a qualidade na educação é preciso que todos os estudantes brasileiros da educação básica tenham acesso à escola em tempo integral, segundo o documento proposto pelo Conselho Nacional de Educação. De acordo com o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, este item está na proposta de financiamento. "O aumento dos recursos leva em consideração a ampliação das escolas integrais", diz.

7 - Valorizar os profissionais da educação com garantia de formação inicial e continuada, além de salário e carreira compatíveis com profissionais de outras carreiras equivalentes.

A valorização do magistério está diretamente ligada com a melhoria da qualidade da educação no país. A Finlândia, país que obteve o melhor desempenho médio no Programa Internacional de Avaliação Comparada (Pisa), em 2006, consegue atrair os jovens mais preparados e talentosos no ensino médio para a carreira docente. O mesmo não ocorre no Brasil, onde as carreiras menos valorizadas são as licenciaturas.

Pagar bons salários e criar condições de ascensão na carreira são fundamentais para melhorar o quadro do magistério brasileiro. Na opinião do presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional da Educação, César Callegari, é inadmissível que a "Lei do Piso" não seja cumprida. "Não deveria haver esta discussão de não pagamento do piso nacional do magistério. O mínimo para os professores deveria ser garantido. Está na lei e tem de ser cumprido", afirma.

A lei que institui o piso nacional para o magistério passou a vigorar desde o ano passado e ainda não é cumprida pela maioria de municípios brasileiros, de acordo com a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação. O piso em 2010 está em R$ 1.312,85. Estados, incluindo o Paraná, questionam na Justiça a constitucionalidade do piso.

8 - Estabelecer padrões de qualidade para cada etapa e modalidade da educação. Criação do custo aluno qualidade como parâmetro para o financiamento da educação.

As avaliações da educação básica, ensino médio e ensino superior foram aperfeiçoadas. Atualmente o governo traçou uma série de indicadores: o Índice da Educação Básica (Ideb), Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e Exame Nacional de Desempenho de Estudantes do Ensino Superior (Enade). Mas, de acordo com o presidente-executivo do Movimento Todos pela Educação, Mozart Neves Ramos, ainda não há padrões de qualidade.

A ideia é criar também o custo aluno qualidade, ou seja, mensurar o quanto de recurso é necessário para garantir que cada estudante brasileiro receba educação com qualidade. Atualmente o custo aluno apenas demonstra o quanto o governo investe em cada um dos estudantes, com base no investimento total feito na área por ano. Em 2008, o custo aluno ficou em R$ 2.995. Porém, o investimento é maior na educação superior, na qual cada aluno custa R$ 14.763 por ano, enquanto que na educação básica este valor cai para R$ 2.632. Para o coordenador da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara, o custo aluno-qualidade iria fortalecer o Fundo Nacional da Educação Básica (Fundeb). "Só o Fundeb não garante educação de qualidade para todos os alunos da educação básica", diz.

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