Ponta Grossa e Curitiba - Ídolo do esporte preferido do brasileiro, o goleiro Bruno Fernandes, acusado de envolvimento no desaparecimento da ex-amante Eliza Samudio, é um exemplo do que pode acontecer com a figura de um mito. Admirado pelos torcedores, ele saiu da pobreza e encontrou o sucesso no esporte, mas perdeu o patrocínio e a maioria dos fãs ao ser protagonista de um crime. Comunidades do Orkut (site de relacionamentos na internet) o julgam um assassino, enquanto uma minoria o considera um injustiçado.
Para a especialista em Psicologia do Esporte pela Universidade Tuiuti Beatriz Dorigo Bruno passou de herói a vilão. Ela entende, porém, que muitos o defendem por um sentimento de negação ou racionalização. "Você tenta negar o que está acontecendo ou até mesmo racionalizar, ou seja, encontrar razões para o que aconteceu, dizendo, por exemplo, que a menina não prestava", comenta.
O filósofo e professor de Educação pela Universidade Estadual de Ponta Grossa Carlos Willians Jaques Morais vê no caso o exemplo do lado positivo e negativo do mito. Positivo porque foi um atleta de sucesso e negativo porque cometeu um erro. "A humanidade sempre precisou de mitos porque quando nós não conseguimos encontrar explicações para o dia a dia, nós nos espelhamos no outro", diz. Para Morais, muitos o defendem porque não conseguem ver defeitos no mito construído.
Se o caso acontecesse com um jogador de menos evidência, a repercussão seria menor, diz o psicólogo Raphael Zaremba, professor de Psicologia do Esporte na Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. "Ele era referência, era capitão do time, o lado do atleta sempre foi valorizado pelo talento dele", observa.
O embaixador do Flamengo no Paraná (título concedido pelo clube carioca para ter uma representação oficial no estado), Vinicíus Nagem, acredita que a imagem do clube não pode ser associada à vida pessoal dos jogadores. Ele opina que não tardará para que outros tomem esse lugar. "Logo vai aparecer outro ídolo e daqui a pouco ninguém mais vai se lembrar do goleiro Bruno", aponta.
Torcedores mirins
Se entre os adultos a situação mistura sentimentos, o que dizer das crianças? Zaremba, que também atua em um projeto social de iniciação esportiva no Rio de Janeiro, observa que as crianças estão recebendo as notícias em estado de choque, deixando-as confusas. Um amigo dele, por exemplo, não sabe o que fazer após ter dado para o filho uma camisa de goleiro com o nome de Bruno. "Meu amigo deixou claro a preocupação que também é de outros pais", diz o psicólogo. "Acho que nesse momento a postura é a de tentar, dentro do possível, aproveitar a melhor maneira para ensinar alguma coisa para os filhos."
Torcedores mirins sabem que o goleiro errou, mas nem por isso vão abandonar o amor pelo time. Natan Reiguel Morais, 10 anos, participa de uma escolinha de futsal em Ponta Grossa e sonha em ser um grande jogador, mas não como Bruno e sim como Petkovic, seu ídolo no Flamengo. O amigo Alisson Fernando Correia da Luz, 8 anos, que prefere o goleiro Julio Cesar, afirma que vai continuar apoiando o clube.
O colega Lucas Lirani, 8 anos, entende a acusação contra Bruno pelas notícias que vê na tevê, mas acha que isso não mudará sua paixão. "Sou fanático desde os 3 anos, tenho até a touca do Flamengo", diz. O pai dele, Helder Lirani, acha que o garoto ainda é "inocente" para entender o que está acontecendo, mas admite que ainda não conversou sobre o assunto com o filho.
Bruno não é o único jogador que teve de prestar contas à polícia recentemente. Para o escritor José Cação Ribeiro Junior, com 84 anos e quatro livros sobre a história do esporte, publicados em Ponta Grossa, o envolvimento de jogadores em casos policiais é um fato recente. "Antes não tinha nada disso, mas eu acho que são casos isolados, coisas que acontecem na vida pessoal dos jogadores e não podem prejudicar o futebol", afirma.