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Os juízes do povo

A bancária Vanessa Pacheco foi intimada a execer a função de jurada | Ivonaldo Alexandre / Agência de Notícias Gazeta do Povo
A bancária Vanessa Pacheco foi intimada a execer a função de jurada (Foto: Ivonaldo Alexandre / Agência de Notícias Gazeta do Povo)

A bancária Vanessa Toledo Pacheco, de 28 anos, nunca havia passado perto da sede do Tribunal do Júri, no bairro Centro Cívico, em Curitiba. Apesar disso, no último mês de julho recebeu uma intimação em sua casa para comparecer ao local. A tarefa era simples, mas de grande responsabilidade: tornar-se uma jurada.

Para a grande maioria das pessoas, a convocação para participar de um júri popular soa como algo distante, mas o caso de Vanessa mostra que não é bem assim. O advogado e professor de Direito Processual Penal da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), Adriano Bretas, explica que, anualmente, as comarcas estabelecem uma lista de jurados. Em uma cidade de mais de um milhão de habitantes como Curitiba, por exemplo, podem ser convocadas de 800 a 1,5 mil pessoas a cada ano. Caso haja necessidade, a lista pode aumentar.

Mas, afinal, quem pode ser jurado? São os chamados cidadãos de "notória idoneidade". Como esta caracterização é subjetiva, pode-se dizer que boa parte da população está sujeita a participar de um júri popular. O juiz presidente do Tribunal do Júri pode solicitar indicações de nomes para autoridades locais, instituições públicas, colégios, universidades, associações de bairro, entre outros. "Em cidades pequenas, o juiz pode consultar até o padre da paróquia do município, se julgar necessário", exemplifica Bretas.

Além das indicações, existem as pessoas que se inscrevem por vontade própria para serem juradas. No entanto, os voluntários não são necessariamente escolhidos. "O jurado voluntário é ainda muito controvertido. Existe uma lacuna, pois a lei não diz que pode e nem que não pode. Acaba ficando a critério de cada juiz escolher ou não essas pessoas", diz o professor da PUCPR.

Ônus e bônus

A partir do momento em que é convocada, a pessoa passa a ter que cumprir algumas obrigações. Assim como um mesário chamado para as eleições, o jurado deve comparecer ao tribunal, sob pena de receber uma multa que varia entre um e dez salários mínimos. "Durante duas semanas, tive que ir em todos os dias úteis até o tribunal. Quem não podia ficar, tinha a opção de levar algum documento para comprovar, mas o juiz é quem decidia liberar ou não", conta a bancária Vanessa.

O principal requisito, no entanto, é a imparcialidade no julgamento, por isso, o jurado não pode ter qualquer relação com alguma das pessoas envolvidas no caso que ele vai julgar. Em julho deste ano, o julgamento de dois acusados de participação na morte do estudante Bruno Strobel Coelho Santosfoi suspenso porque foi descoberto que uma das juradas era irmã de um advogado que defendeu um dos réus no início do processo. Depois disso, o júri ainda acabou adiado mais uma vez e remarcado para a sexta-feira (27).

Durante os trabalhos, os integrantes do conselho de sentença devem ficar incomunicáveis. Acompanhados de oficiais de justiça, eles podem conversar sobre assuntos banais, mas não é permitido falar sobre o caso julgado. Em júris que duram mais de um dia, os jurados geralmente são levados para um hotel em uma espécie de isolamento.

O cumprimento das obrigações também resulta em benefícios para os jurados, já que o seu trabalho é considerado serviço público relevante. Os cidadãos que exercerem a função ganham o direito de preferência (em caso de empate) em concorrências públicas, como concursos e licitações, asseguram cela especial em caso de prisão e não podem ter nenhum desconto no salário em razão dos dias em que tiveram que comparecer ao júri.

Responsabilidade

Por envolverem crimes intencionais contra a vida, como os assassinatos, os júris populares costumam atrair a atenção de advogados, mas também da opinião pública, principalmente em casos de grande repercussão. Um exemplo pôde ser visto em março deste ano no julgamento de Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, acusados pela morte de Isabella Nardoni, de 5 anos. Dezenas de curiosos se aglomeraram em frente ao Fórum de Santana, em São Paulo, durante cinco dias e a fila de espera por senhas para acompanhar o júri foi grande.

"A responsabilidade do jurado é enorme. Chega a dar medo porque você está julgando a vida de uma pessoa naquele momento", relata Vanessa. No entanto, ela ressalta que o trabalho e a escolha por condenação ou absolvição é baseado nas provas apresentadas. "A promotoria e a defesa dão todas as informações. Isso nos deixa mais tranquilos", diz.

Bretas não vê problema na decisão ser proferida por pessoas que não são especialistas na área. "Tenho percebido que o jurado leva a sério aquilo que faz. Eventualmente, ele pode até errar, mas faz isso querendo acertar. É a justiça que ele avaliou ser correta no momento", afirma.

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