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Movimento estudantil

Outras camisetas na UNE

Carina Vitral: “Nem um centavo a menos para a educação”. | Arquivo Pessoal
Carina Vitral: “Nem um centavo a menos para a educação”. (Foto: Arquivo Pessoal)

A escolha da santista Carina Vitral para presidir a União Nacional dos Estudantes (UNE) evidencia o avanço do ensino superior privado no país nos últimos anos. Aluna do curso noturno de Economia da PUC-SP, a líder estudantil representa os 5,3 milhões de universitários das faculdades particulares do país [73% do total], muitos custeados pelos programas ProUni e Fies.

À frente da entidade nacional, Carina traz na bagagem a experiência de ter dirigido a União dos Estudantes de São Paulo e algumas conquistas, como o passe livre estudantil na capital paulista para ônibus, metrôs e trens. Mas não são apenas bandeiras antigas (sonhos) que movem a líder. O slogan na camiseta que traja, pelo fim das disciplinas online, retrata esse novo momento da luta dos estudantes em meio a um ensino que se transforma com as novas tecnologias.

O que não pode ser tolerado no Brasil é uma onda golpista, ideias antidemocráticas, desrespeito à soberania de um processo eleitoral como o nosso e muito menos o crime absurdo de defesa da ditadura militar.”

Carina Vitral,  Nova presidente da UNE

Integrante da União da Juventude Socialista (UJS), o braço estudantil do PCdoB, Carina defende abertamente o que considera avanços do governo petista, mas quando o assunto é o corte de verba na educação anunciado pela presidente Dilma Rousseff, o tom muda. “Nem um centavo a menos para a educação!”, brada.

Na entrevista a seguir, feita em etapas [redes sociais, e-mail, telefone], a nova presidente da UNE traça um paralelo entre o movimento estudantil de hoje e de décadas anteriores; e fala também de temas em debate na sociedade, como maioridade penal, aborto e legalização da maconha.

Como comparar o movimento estudantil de hoje com o do período da ditadura e, depois, da fase de abertura, nos anos 80?

É aquela máxima das gerações, cada uma tem os seus desafios, as suas características, as suas especificidades. Tenho certeza de que a UNE cumpre os seus objetivos à altura do que foi para ela colocada em cada época. Não fugimos da luta, nunca. A ditadura foi algo terrível, nos perseguiram, atacaram de todas as formas, assassinaram um presidente da UNE, o Honestino Guimarães, prenderam e torturaram muitos outros. Não se tinha liberdade. Então, não há como comparar, é até uma falta de respeito e de entendimento histórico querer fazer isso.

Naqueles anos a juventude falava em utopia. Havia o sonho de um mundo mais justo, com menos desigualdades sociais. O sonho acabou?

Não acabou, ele está mais vivo do que nunca. Muitas conquistas vieram. No Brasil, por exemplo, vivemos em uma democracia, com amplas liberdades e instituições fortalecidas e consolidadas. Mas é fato que a injustiça social e as desigualdades sociais ainda são enormes. A gente não sabe o que é impossível, por isso, a gente vai lá e quer fazer, quer mudar, sempre. Somos jovens e não estamos satisfeitos nunca. Queremos mais e vemos que é possível. Nossa geração já conquistou, por exemplo, vitórias como a aplicação dos royalties do petróleo e do Fundo Social do Pré-Sal na educação, a aprovação dos 10% do PIB para o setor educacional, do Estatuto da Juventude, das cotas nas universidades. São todas inspirações para nos lembrar que estamos no caminho certo.

Qual o seu posicionamento sobre temas que dividem as opiniões, como aborto, redução da maioridade penal, descriminalização da maconha, casamento entre pessoas do mesmo sexo?

Sou a favor da legalização do aborto, como forma de garantir que milhares de mulheres pobres não morram em clínicas clandestinas de todo o Brasil. Sou totalmente contrária à redução da maioridade penal. Defendo o debate mais amplo e aberto sobre a descriminalização da maconha, considerando a necessidade de rever a política de guerra às drogas que massacra a população pobre. Sou obviamente a favor do casamento e de todos os direitos civis para pessoas do mesmo sexo, defendo o direito de amar.

Setores classificados de progressistas afirmam que o país vive um momento de fortalecimento do conservadorismo. Para eles, os reacionários estão pautando os partidos, as votações no Congresso e até políticas dos governos. Como você vê a atual conjuntura política do país?

Ao mesmo tempo em que se aumenta um certo conservadorismo arbitrário de um lado, amplia-se ainda mais outra posição que é a de defesa da democracia no país, por mais direitos e mais avanços sociais.”

Carina Vitral, Nova presidente da UNE

Existe é uma disputa de rumos no país, isso se deve à crise econômica que atinge o Brasil. A crise uniu a direita, os conservadores e os reacionários, que perderam as eleições mas não aceitaram a derrota e tentam impor o seu projeto para o país. Porém, na minha visão, ao mesmo tempo em que se aumenta um certo conservadorismo arbitrário de um lado, amplia-se ainda mais outra posição que é a de defesa da democracia no país, por mais direitos e mais avanços sociais.

Os movimentos sociais, sindical, estudantil e os setores progressistas perderam o protagonismo para os conservadores?

Acho que não, nós conquistamos muito nos últimos anos fruto de muitas mobilizações, eles acordaram agora. Quem está vencendo somos nós que ajudamos a mudar o país.

O governo federal vem enfrentando duras críticas. Muitos defendem o impeachment, com o “fora Dilma”. Qual a avaliação que você faz das manifestações de rua e dos panelaços?

Manifestação é legítima. Existe uma disputa em curso na sociedade, a elite que viu o Brasil distribuir renda, que viu a universidade deixar de ser lugar para rico, que agora tem cotas, ProUni e Fies, reage a essa mudança. É uma reação legitima de um setor específico da sociedade que quer ver seus interesses, e não o dos outros, no poder. O que não pode ser tolerado no Brasil é uma onda golpista, ideias antidemocráticas, desrespeito à soberania de um processo eleitoral como o nosso e muito menos o crime absurdo de defesa da ditadura militar. Isso, nós, da União Nacional dos Estudantes, que sofremos torturas mortes e perseguições, não vamos marchar ao lado.

Depois de avanços na educação de 3.º grau, o governo decidiu cortar recursos e reduzir o acesso de estudantes às universidades por meio do Fies. Há também ajustes no Pronatec e no Prouni. Não é um retrocesso?

Nossa campanha é “nem um centavo a menos para a educação!”. Acabamos de acampar em frente do Ministério da Fazenda para repudiar os cortes na educação. E levamos recentemente ao Ministério da Educação nossa pauta de reformulação do Fies. Defendemos uma política de assistência estudantil que garanta a permanência do prounista, bolsista do Fies e cotista até o término de seus estudos.

Você acha que o governo acertou ao aumentar o financiamento estudantil em vez de ampliar a rede pública de universidades?

O ensino privado é uma realidade e o que temos de ter é a sua urgente regulamentação. É necessário aprovarmos o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação, o Insaes, para fiscalizar e autuar essas faculdades.”

Carina Vitral,  Nova presidente da UNE

Na verdade, acertou em fazer as duas coisas ao mesmo tempo. Se fizermos um recorte da última década, é fácil perceber que houve ampliação da rede federal. Foram inauguradas universidades federais, inclusive algumas em regiões mais pobres e necessitadas, como a Federal do Cariri, as Federais do Oeste e do Sul da Bahia e as Federais do Vale do Jequitinhonha e Mucuri. Então, acho que o debate não é federal versus particular. O ensino privado é uma realidade e o que temos de ter é a sua urgente regulamentação. É necessário aprovarmos o Instituto Nacional de Supervisão e Avaliação da Educação, o Insaes, para fiscalizar e autuar essas faculdades.

Como estudante de economia, que políticas defende para tirar o país da crise?

O principal desafio num ambiente de crise é a retomada do crescimento. Por isso é ruim o ajuste fiscal com corte de recursos do investimento. A política econômica não deve penalizar os programas sociais e muito menos áreas estratégicas e vitais como a educação. Deveriam ser tomadas outras medidas, como a taxação das grandes fortunas, a criação de uma política nacional de desenvolvimento de alguns setores, como o industrial, a redução dos juros. Uma das coisas mais importantes, também, é apostar firmemente em uma educação que forme cidadãos para contribuir com o desenvolvimento do país não só economicamente mas também do ponto de vista humano. A juventude hoje representa 51 milhões de brasileiros que contribuem para o país com um bônus demográfico que pode levar à retomada do crescimento tão importante para a saída da crise.

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