Quando procurou o Hospital do Câncer de Londrina (HCL), em 2011, o engenheiro londrinense Antonio Carlos do Nascimento, o Baiano, já estava em tratamento contra um câncer havia algum tempo. "Ele tinha plano de saúde, mas queria nossa ajuda para conseguir um medicamento", recorda a diretora de ações estratégicas do HCL, Mara Rossival Fernandes. Mal imaginavam Baiano e o hospital que a história de ambos se entrelaçaria de forma eterna dali para frente.
Ao tomar contato com a realidade da instituição, o engenheiro percebeu a urgente necessidade de ampliação do local. Depois de muitas contas, concluiu: talvez eu não tenha como financiar a obra toda, mas posso doar um metro quadrado, que custa R$ 1,5 mil. Nascia ali, no fim de 2011, a campanha "adote um metro quadrado", em que qualquer cidadão pode doar em 20 vezes de R$ 75.
Depois de três anos de tratamento, Baiano foi vencido pelo câncer no início de abril, mas sua luta deixou frutos: até o final do semestre, três novas alas construídas com verba da campanha devem ser inauguradas e mais cinco andares estão em construção. "Já havia uma obra começada quando ele chegou, mas estávamos pensando em fazer mil metros quadrados e não sabíamos nem como pagar esses mil. A ideia dele foi bem maior", conta Mara. Inaugurado em 1965, o HCL conta com 144 leitos divididos em seis andares, número que deve saltar para 200 com a obra. "Temos três leitos por quarto e queremos diminuir para dois."
A obra de ampliação do HCL prevê a construção de oito andares, num total de 5.003 metros quadrados. Em julho, serão entregues os primeiros 2,1 mil metros. "Hoje, atendemos todo mundo que chega, mas em um prazo de 30 a 60 dias. Nossa radioterapia funciona das 7 às 23 horas. Com a obra, poderemos atender mais pessoas em tempo menor", explica Mara. Diariamente, 1,2 mil pessoas de 117 municípios da região de Londrina procuram o hospital.
Tratamento
Além de idealizar o projeto, Antonio Carlos do Nascimento fazia questão de acompanhar o andamento das obras de perto, mesmo nos dias em que estava internado no HCL. "Antes, ele vinha todos os dias, depois começamos a mandar as fotos diariamente e ele acompanhava pelo notebook", lembra a diretora do hospital.
A médica Etel dos Santos Fernandez, membro da equipe que cuidou de Baiano em casa, nos últimos meses de vida, conta que o maior desejo do idealizador do projeto era estar na inauguração das novas alas, o que não foi possível. "Ele ligava para os amigos e motivava todos a ajudarem. A gana de viver era grande, mas ele tinha noção da situação."
Amigos e desconhecidos em sintonia
Voluntária em uma ONG que cuida de crianças com câncer em Londrina, a filha de Baiano, Renata Montoza, 28 anos, pretende dar continuidade ao trabalho do pai. Segundo ela, ele "cobrava" ajuda de todos os amigos, sobretudo dos empresários e engenheiros que iam visitá-lo no período em que estava internado. "Deixei avisado que podem contar comigo para continuar pegando no pé dos amigos", brinca.
Os amigos de Baiano que ajudaram o HCL são muitos, mas também há aqueles que colaboraram com a campanha sem conhecê-lo. O empresário londrinense Walter Bussadori é um deles. Após uma ótima safra, conversou com o sócio e decidiu dividir o que tinham recebido com alguma instituição da cidade. Acabou adotando vários metros da obra. "Eu já ajudava o hospital mensalmente, mas não sabia da campanha. Perdi meu pai com câncer há 11 anos, e tínhamos condição de não depender do SUS, mas sei da importância do Hospital do Câncer."
DedicaçãoEngenheiro viu a obra até o dia em que morreu
5,3 mil m² é o tamanho da nova ala do HCL, cuja obra é orçada em R$ 7,9 milhões. Na campanha, cada pessoa foi estimulada a doar um metro quadrado, ou R$ 1,5 mil, em parcelas. Digna de roteiro de filme de Hollywood, a ligação de Baiano com a construção do hospital emociona. Inovador e positivo diante das dificuldades, estava sempre tentando ajudar, mesmo nos momentos mais difíceis da própria luta contra o câncer. Entre uma ligação e outra pedindo ajuda a amigos que conheceu na carreira de engenheiro civil já internado, ele fazia contas, olhava fotos e cobrava agilidade na obra. As listas de tarefas endereçadas à direção do HCL eram diárias e envolviam, desde orientações pontuais para a execução da obra, até a necessidade de pedir ajuda ao governador do estado. Na caixa de e-mails, a diretora de ações estratégicas do HCL, Mara Rossival Fernandes, ainda conserva a última mensagem recebida em nome de Baiano, em 18 de janeiro, um dia depois do pior diagnóstico da doença ser dado. Na ocasião, ele já nem podia escrever, mas pediu, sussurrando, que alguém trouxesse um caderno para anotar as tarefas. "A obra está muito devagar", disse ele a uma funcionária do HCL. Na última lista, que Mara relê entre lágrimas e risos, Baiano pedia para que ela ligasse a três empresas, para cotar materiais, e dava o nome de quem deveria ser procurado em cada uma delas. Em seguida, uma orientação importante: "não deixe que instalem o piso antes do gesso, para não danificá-lo". "Ele também achava que o marketing da campanha estava muito trivial e sugeriu que espalhássemos banners pelos corredores do hospital. Um dia antes, ele mesmo tinha agendado uma entrevista na televisão. A gente olhava para ele debilitado, e ele acreditando, porque conseguia ver a obra pronta. O Baiano não passou pela vida, deixou um pedaço dele aqui", emociona-se Mara.