O gerente comercial Marlos Lomba, de 35 anos, evita frequentar agências bancárias desde os 27. Portador de uma doença no músculo do coração conhecida como cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva (CMHO), ele carrega no lado esquerdo do peito desde 2003 um aparelho de marcapasso e desfibrilador que regula a frequência ou o bloqueio cardíaco. O problema é que o aparelho o impede de passar pelas portas giratórias das agências.
Lomba é um dos 600 mil portadores de marcapasso no Brasil. A garantia do perfeito funcionamento do coração de quem usa o equipamento exige cuidados especiais. Lomba, por exemplo, não pode fazer esforço físico nem passar por situação de estresse ou nervosismo acentuado. Outro comportamento de risco é ficar perto de aparelhos que emitam ondas eletromagnéticas e ser exposto a elas.
O gerente já teve problemas com o marcapasso ao tentar entrar numa agência bancária com porta giratória. Para evitar transtornos, sempre que precisa entrar num banco, ele cumpre um ritual: retira seus documentos, entre eles a identificação de portador de marcapasso, entrega-os aos vigilantes e espera em média 30 minutos até que sua entrada por uma porta alternativa seja autorizada.
Mas nem sempre isso é suficiente. Em outubro do ano passado, mesmo cumprindo os procedimentos, ele não teve a entrada autorizada por porta alternativa na agência da Caixa Econômica Federal de Santo Antônio da Platina, em duas tentativas. Lomba só conseguiu entrar depois de ser revistado por um policial militar, diante dos olhares de outros clientes.
"Mesmo assim, quando achei que entraria pela porta alternativa, o gerente me disse que determinaria o desligamento da porta para que eu entrasse", revela. Sem alternativa, Lomba passou pela barreira, entrou na agência, resolveu seu problema e saiu.
Minutos mais tarde, começou a passar mal, com sintomas de dormência e dores no braço esquerdo e no peito. Ele procurou atendimento médico e teve de ficar em observação por quase quatro horas no pronto-socorro da cidade.
Polêmica
O Instituto do Coração (Incor), de São Paulo, confirma que quem usa marcapasso pode ter problemas em portas giratórias antigas ou mal reguladas. Segundo o instituto, esses equipamentos geram campos eletromagnéticos que confundem o marcapasso. O aparelho entende que o coração bate no ritmo certo e para de enviar os pulsos elétricos. A pessoa pode ter palpitações ou até desmaiar. Se a porta giratória travar, e o socorro demorar, ela corre o risco de ter uma parada cardíaca.
Apesar de confirmar as limitações impostas aos portadores de marcapasso, a médica Silvana Mishioka diz que ainda faltam estudos para garantir com precisão se as ondas eletromagnéticas emitidas pelas portas giratórias e por detector de metais realmente interferem na programação dos aparelhos.
Caixa alega que procedimento é padrão
O gerente da Caixa Econômica Federal (CEF) Marcos Ferreira Lopes, que atendeu Marcos Lomba, explicou que, por determinação do próprio banco, não poderia falar sobre o assunto. Em nota, a assessoria da Caixa afirmou apenas que o banco "cumpre rigorosamente as determinações da Lei 7.102/83, que disciplina o sistema de segurança em estabelecimento financeiro".
Segundo o texto, todos os clientes, sejam eles correntistas ou não, e os empregados da Caixa, são submetidos a todas as medidas de segurança, sem exceções. "Caso o cliente use prótese metálica ou marcapasso, ele deve procurar um funcionário da administração para obter atendimento adequado, através de entrada alternativa, sempre que existir. Neste caso, o vigilante deve fazer uso do detector de metais manual", aponta o texto.
Segundo a cartilha da Federação Brasileira dos Bancos (Febraban), portadores de marcapasso "devem procurar um funcionário da administração da agência para obter o atendimento adequado à sua situação. Em geral, as agências possuem uma entrada alternativa", diz o manual.