Terezinha e Gilberto Santos de Souza até podiam ter assistido à encenação da Paixão de Cristo que um grupo teatral realizaria no Sítio Cercado, bairro de Curitiba onde moram. Mas o casal e outra dezena de parentes preferiu ajudar a lotar a Pedreira Paulo Leminski (que tem capacidade para 20 mil pessoas), ontem à noite, para ver o espetáculo do grupo Lanteri pela primeira vez. Com um motivo muito bom, segundo Terezinha: "Nossa filha de 9 anos está atuando". Chegaram todos às 15 horas, com direito a lanche e refrigerante para passar o tempo. Faltavam ainda 15 minutos para o começo da peça, mas Gilberto já estava com a filmadora na mão. "É para não perder nada", justificou.
A filha de Terezinha e Gilberto foi um dos cerca de 800 atores que participaram, ontem, da "Vida, Paixão e Morte de Jesus Cristo", que o Lanteri encena há 28 anos. "Eles começaram na nossa paróquia", orgulhava-se Ivonete Lipinski, referindo-se à Paróquia São Paulo Apóstolo, na Vila São Paulo. Desde 1991, o Lanteri se apresenta na pedreira e, há 8 anos, Ivonete, que também tem parentes no elenco, traz a família para assistir à peça.
Mas negócio de família mesmo é com a confeiteira Suzete Wolanski. A sobrinha participa do Lanteri há nove anos e, um dia, Suzete e o marido foram buscá-la e acabaram entrando como figurantes. Resultado: o clã foi tomando gosto pela coisa e hoje a coxia é povoada pelo casal, duas filhas, primos e a sobrinha, que começou tudo. Em seu terceiro ano de Paixão, a confeiteira estréia como Maria. "É uma emoção grande. Sendo mãe, a gente tem mesmo vontade de pegar Jesus no colo, tirá-lo dali, mas ao mesmo tempo Maria sabe que seu filho veio ao mundo para aquilo", disse, acrescentando que, quando está ao pé da cruz, tem ao lado seu primo, que interpreta João Evangelista.
Enquanto isso, Márcio Antônio Cauduro se preparava para delatar Jesus aos romanos pela terceira vez. O ator que faz Judas defende o personagem: "Ele não entregou Jesus para que morresse. Ele queria que Roma saísse da Palestina e tentou usar a imagem de Jesus para levar os judeus a se rebelarem, mas não saiu como ele pensava." Ele acompanhou a divulgação do Evangelho de Judas na imprensa e diz que o texto até tem a ver com o que o ator pensou para seu personagem.
Este ano a peça não teve cenas novas, explicou um dos diretores, Júlio César do Rosário. Escolher as passagens bíblicas para resumir em duas horas uma história que daria uma novela é tarefa do seu colega Aparecido Massi. "Tentamos criar ligações. Jesus disse que era a luz do mundo e incluímos a cura do cego. Ele diz ser a ressurreição e a vida, então temos a ressurreição de Lázaro. Ele nos pede para não julgar e, por isso, usamos a passagem da mulher adúltera", afirmou. "É a maior história de amor do mundo", define, explicando porque milhares de pessoas vão à pedreira todo ano. Que Mel Gibson, que nada. Bom é ver ao vivo.