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A repórter Aline Peres observa o abraço apertado que meninos do Bolsão Sabará, na CIC, dão no Papai Noel da Gazeta do Povo | Daniel Castellano/ Gazeta do Povo
A repórter Aline Peres observa o abraço apertado que meninos do Bolsão Sabará, na CIC, dão no Papai Noel da Gazeta do Povo| Foto: Daniel Castellano/ Gazeta do Povo

Vivência

Histórias por trás dos olhares

Por trás dos olhos tímidos, cintilantes, debochados e desconfiados das crianças e adolescentes do Bolsão Sabará, na Cidade Industrial de Curitiba, há sonhos e planos que desencadearão na formação de uma nova geração de médicos, jogadores de futebol, professores, policiais, dentistas e arquitetos, além de motoristas de biarticulado, cantores, bailarinas e bombeiros. Os sorrisos e abraços escondem histórias de incentivo dos pais para que os filhos se dediquem aos estudos e também uma vida sofrida por alguns deles.

Enquanto o senso comum acreditaria que a criminalidade e as drogas prevaleceriam sobre a educação em uma região que concentra um dos maiores índices de homicídios da capital em 2011, um futuro e promissor arquiteto do Sabará nos contou que, se não tivesse a oportunidade de fazer aulas de contraturno no Centro Divina Providência, ficaria em casa estudando e lendo livros.

Já um menino que sonha ser professor de capoeira acumula duas tragédias em seus 6 anos de vida. Perdeu o irmão a pauladas para o tráfico de drogas e, em seguida, a mãe foi atropelada por um ônibus depois de reconhecer o filho no Instituto Médico-Legal. Apesar das adversidades, o garoto tem o estímulo do pai e das tias para frequentar as aulas extracurriculares. Aos poucos, interage e se diverte com os novos amigos. O centro oferece aulas de desenho, judô, dança contemporânea, capoeira, futebol e balé.

Presentes

Embora no topo da lista de pedidos de Natal estejam armas de espirrar água, bonecas, vestidos, videogames e carrinhos, a criançada também deseja melhorar a região onde vive. Questionados sobre o que gostariam que fosse feito para o Bolsão Sabará, meninos e meninas parecem unir suas vozes em torno de um policiamento mais presente, que traga mais segurança e contribua para diminuir a violência, a criminalidade e o tráfico de drogas. Os pequenos também não deixam passar outros detalhes, como asfalto e calçadas nas ruas, mais escolas, mais postos de saúde, mais respeito e maior conservação do meio ambiente. São pedidos que não dependem apenas do Papai Noel.

  • Alegres, meninas do Centro Divina Providência mostram os presentes que ganharam do Bom Velhinho

De cabeça baixa e com olhar tímido, uma menina se aproxima. Atrás dela, um garotinho curioso e com ar desconfiado observa atentamente o que está acontecendo. Impaciente, à espera de sua vez, outro menino sorri e acena de longe. Enquanto isso, dois rapazotes cochicham e dão risadas debochadas de toda a situação. Mesmo momento em que uma garota com olhos brilhantes e sorriso largo gasta suas energias num forte abraço dado no visitante que desencadeou todo o alvoroço. Os diferentes olhares, reações e sorrisos das crianças dão pistas de quem também está presente: Papai Noel.

VÍDEO: Assista ao vídeo com detalhes da ação de Natal da Gazeta do Povo

Esses foram alguns dos flashes presenciados no dia 14 de dezembro, quando uma equipe da Gazeta do Povo acompanhou de perto o contato de crianças e adolescentes com o Bom Velhinho. Com o objetivo de vivenciar essa experiência, fui para trás das madeixas e barbas brancas e das vestes vermelhas e assumi o papel da figura que seduz gerações – seja pelo carisma, bondade e alegria ou mesmo pelo consumismo. Apesar das formas "avantajadas" que tenho cultivado por um bom tempo, o que tornaria o disfarce mais fiel, eu nunca tinha passado por essa transformação.

A missão da primeira experiência foi encarar, de uma só vez, 50 meninos e meninas atendidos pelo Centro Divina Provi­­dência, que desenvolve projetos e atividades de contraturno escolar para contribuir com a formação e manter ocupado o tempo de jovens do Bolsão Sabará, na Cidade Industrial de Curitiba (CIC). Ao todo, 781 bebês, crianças e adolescentes – dos 3 meses aos 17 anos – estão envolvidos com as ações promovidas pela equipe da irmã Emily Luci Buch, que nos ajudou a organizar um grupo de meia centena de jovenzinhos para ter um encontro com o Papai Noel.

Preocupação

A minha maior preocupação não era o calor que eu passaria dentro daquela roupa, mas a forma como eu atuaria para ser convincente aos pequenos. Se eu não fizesse e falasse tudo direitinho – como está no script da biografia de Noel –, poderia por a perder todo o imaginário e a esperança que a criança cultivou durante o ano todo à espera do Natal. Para mim, isso seria um desastre! Por outro lado, como saber que tipo de história os pais contam para seus filhos? Lembrei das sábias palavras de um Papai Noel experiente que eu havia entrevistado outro ano: "Não se deve afirmar nada. A criança que deve conduzir o papo". Mesmo sem muito tempo para falar com cada uma, foi isso que eu, pelo menos, tentei fazer.

Quebrado o silêncio inicial, da boca dos pequenos, descobri que Noel pode vir do Polo Norte ou, simplesmente, do céu. Descobri ainda que ele pode chegar com seu trenó tradicional ou ser um pouco mais arrojado, com carro, moto ou helicóptero. Também soube de detalhes de bastidores: são os pais e professores os responsáveis por entregar as cartas ao Bom Velhinho. Da mesma forma, fui saber que minha barba estava suja de maquiagem e que meu bigode se mexia quando eu falava... Conclui que a ingenuidade caminha com as crianças, mas elas também são muito espertas e observadoras.

Pena que o tempo foi curto e as conversas não puderam se alongar, mas a alegria da criançada ao desembrulhar os presentes e os sorrisos e abraços recebidos compensaram a experiência. Serão inesquecíveis os comentários de dois garotinhos com seus 5, 6 anos na hora de ir embora. Um deles veio até mim, me deu um abraço e disse que sempre teve medo de Papai Noel, mas, "agora que eu te conheço, não tenho mais". O outro saiu correndo do controle das professoras para dizer: "Vou sentir muita saudade". Nós também.

Colaboraram na coleta de informações e na distribuição de presentes Aline Peres e Angélica Favretto. Também colaboraram jornalistas e demais funcionários da redação da Gazeta do Povo na arrecadação de dinheiro para os presentes.

Vida e Cidadania | 1:32

Confira como foi a visita do Papai Noel na Vila Sabará, em Curitiba.

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