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Uma nota técnica assinada por promotores do Ministério Público do Ceará (MPCE) declara que a vacina contra Covid-19 em crianças é obrigatória e que os pais que não vacinarem poderão ser processados. O texto foi divulgado ontem (19), poucas horas após uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski determinando que os Ministérios Públicos dos Estados e do Distrito Federal tomassem as “medidas necessárias” para cumprimento da legislação referente à vacinação contra Covid-19 em crianças. Mas o documento não tem, segundo eles, qualquer relação com a decisão de Lewandowski.
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De acordo com o promotor Lucas Azevedo, coordenador do Centro de Apoio Operacional da Infância e da Juventude (CAOPIJ) do MP-CE, o texto teria sido divulgado após a decisão de Lewandowski por coincidência, não sendo uma resposta direta ao pedido feito pelo ministro do STF. Ele ressalta que a nota não pretende ser uma recomendação ou determinação, apenas a declaração, em linguagem jurídica, da posição do MP-CE de apoiar a vacinação de crianças contra a Covid-19. “É um documento orientativo, que serve para evidenciar para a população a posição do MP-CE sobre esse tema. Mas não determina que as demais autoridades devam ter esse mesmo entendimento”, explica.
O Ministério da Saúde já deixou claro que a vacinação em crianças, embora seja recomendada, não é obrigatória, cabendo aos pais ou responsáveis decidir ou não pela vacinação. O presidente Jair Bolsonaro, ontem à noite, alertou os pais de possíveis consequências dessas substâncias e que a Pfizer não será responsabilizada em caso de efeitos colaterais adversos. No entanto, para os promotores Lucas Felipe Azevedo de Brito, Eneas Romero de Vasconcelos, Flavio Corte Pinheiro de Sousa, Hugo Frota Magalhães Porto Neto, e para a procuradora de Justiça Elizabeth Maria de Almeida Oliveira, que assinaram a nota do MP-CE, a vacina contra Covid-19 em crianças pode ser considerada obrigatória.
O texto do MP-CE se apoia no artigo 14 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que diz que a vacinação das crianças é obrigatória “nos casos recomendados pelas autoridades sanitárias”. Segundo juristas, no entanto, esse não é o caso da vacina contra a Covid-19, pois o governo, apesar de recomendar, disse que a imunização não é obrigatória e precisa do consentimento dos pais para ser aplicada. Os promotores utilizam ainda de forma questionável uma decisão recente do STF, que entendeu que há casos específicos em que os pais não podem se negar a vacinar os filhos. Conforme o STF, seria constitucional e obrigatória a imunização desde que a vacina tenha sido incluída no Programa Nacional de Imunizações (PNI), com aplicação obrigatória em lei, ou ainda seja objeto de determinação da União, Estado, Distrito Federal ou Município, com base em consenso médico-científico.
A nota cita ainda dois documentos locais, o primeiro deles uma Nota Técnica emitida pela Secretaria de Estado da Saúde do Ceará, com orientações voltadas a profissionais do sistema de saúde do Estado. No texto, não há nenhuma menção à obrigatoriedade da vacina. O documento informa que a vacina contra Covid-19 deverá ser aplicada a todas as crianças de 5 a 11 anos de idade, “que se apresentarem indistintamente, desde que acompanhadas pelos pais ou responsáveis”. Formas de apresentação, rotulagem, armazenamento e outras orientações técnicas complementam o documento.
O segundo documento que, para o MP-CE, endossaria a obrigatoriedade da vacinação contra Covid-19 em crianças no Ceará, seria uma resolução da Comissão Intergestores Bipartide (CIB-CE), autorizando a vacinação de crianças no estado. De acordo com o documento, a vacinação contra Covid-19 seria “operacionalizada para todas as crianças de 5 a 11 anos de idade, que se apresentarem, indistintamente, desde que acompanhadas pelos pais ou responsáveis”. Assim como no documento anterior, não há qualquer menção à obrigatoriedade da vacina.
Carteira de vacinação
No texto, os promotores do MP-CE ressaltam ainda que é exigida a apresentação de carteira de vacinação atualizada para matrícula nas escolas e colégios do estado, conforme prevê a legislação estadual. Se os pais deixam de apresentar a carteira de vacinação ou a apresentam com alguma vacina obrigatória faltando, eles devem regularizar a situação em até 30 dias. Se os pais não cumprirem esse prazo, poderão ser denunciados pela escola ao Conselho Tutelar e às promotorias de Justiça, de Saúde ou da Infância e Juventude do MP-CE.
Conforme esclarece Azevedo, famílias de crianças não vacinadas passam a ser acompanhadas pelo Conselho Tutelar e pelas Promotorias da Infância e da Educação. Não podem ser tomadas medidas extremas, como a retirada da guarda das crianças, por exemplo. “Isso seria totalmente desproporcional, absurdo”, diz o promotor. Segundo ele, a intenção é sensibilizar que a vacina é importante, tentar convencer através do diálogo que a vacinação protege a vida das crianças e que os benefícios da vacina superam os eventuais riscos. Apenas nos casos em que as equipes do Conselho Tutelar ou do MP-CE que acompanham a criança verificassem alguma condição de risco é que seriam ser adotadas medidas mais severas.