A secretária de Justiça, Maria Tereza Uille Gomes, diz que o software Business Intelligence ajuda a monitorar a situação dos detentos no estado: acompanhamento em tempo real| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Menos investigação

Juiz aponta preocupação com redução da atividade policial

Os estados do Mato Grosso do Sul, Bahia, Amapá e Paraíba também reduziram suas taxas de encarceramento no país. Segundo o juiz Luciano Losekann, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em pelo menos dois desses estados a queda esconde um problema maior.

"Se não houver investigação da polícia, naturalmente a taxa [de encarceramento] diminui. Na Bahia, há sérios problemas no trabalho da polícia judiciária e não é menos problemático na Paraíba. Sobre o Paraná, sei que a taxa de homicídios é muito superior à média nacional."

O juiz, porém, elogiou o uso ponderado da prisão cautelar no Paraná e as recentes transferências de presos de carceragens para presídios. "O Paraná só perdia para a Bahia em número de presos em cadeias. Mas nos últimos dois anos, transferiu mais de cinco mil presos e está reservando a prisão para os casos mais graves."

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28,6 mortes a cada 100 mil habitantes é a taxa de homicídios no Paraná – relação maior do que a média nacional (20,4 casos por 100 mil). O teto estabelecido pela ONU como aceitável é de 10/100 mil – estados com índices superiores a esse vivem uma epidemia de violência. Segundo especialistas, para ser encarada como positiva, a queda da taxa de encarceramento precisa vir acompanhada da redução da violência, medida pela quantidade de homicídios por 100 mil habitantes – o que de fato ainda não ocorreu no Paraná. "Estamos em uma tendência de queda. No primeiro quadrimestre, a redução foi de 15% na comparação com o mesmo período de 2012 (passando de 1.085 casos para 922)", diz o secretário de Segurança Pública, Cid Vasques. Quando iniciou sua gestão, o governador Beto Richa estabeleceu como meta uma taxa de 21 por 100 mil.

Verba federal

Construção de novos presídios depende de "projetos complementares"

O Ministério da Justiça aguarda a entrega de projetos complementares por pelo governo do Paraná para liberar R$ 135 milhões visando à construção de seis presídios e à ampliação de outros sete. A contrapartida do governo estadual é de R$ 42 milhões. Com a verba, serão construídas unidades prisionais em Piraquara, Apucarana, Foz do Iguaçu, Campo mourão, Guaíra e uma unidade feminina em Londrina. No total, os projetos deverão criar 6.350 novas vagas no sistema.

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A despeito de presídios e carceragens lotados em todo ao país, o Paraná tem apresentado sinais de redução de sua população carcerária. Levando em consideração dados de todas as unidades prisionais, entre 2008 e 2013, o sistema perdeu 8 mil presos. Isso fez com que o estado, pela primeira vez, aproximasse sua taxa de encarceramento à média do país.

De acordo com dados combinados do Infopen, banco de informações do Ministério da Justiça, com o sistema GeoPresídios, alimentado em tempo real por juízes de todo o Brasil, o Paraná tinha 36.453 presos em 2008 ou 344,9 internos para cada grupo de 100 mil habitantes. Hoje, esse número caiu para 28.394 e a taxa, para 268,43 – 22% de redução, a segunda maior do país. No Brasil, no mesmo período, a população carcerária passou de 451.219 para 526.882 – crescimento de 17%. Já a taxa de encarceramento, saltou de 237,1 para 263,1.

INFOGRÁFICO: Na contramão dos outros estados, Paraná teve queda acentuada na taxa de encarceramento

Razões

De acordo com o governo do Paraná, essa redução está ligada à realização de mutirões carcerários e à implantação de um sistema chamado Business Intelligence, ferramenta on-line que reúne informações de presos mantidos pelas Secretarias da Justiça, Cidadania e Di­reitos Humanos (Seju) e da Segurança Pública (Sesp). "Com a adoção desse sistema, conseguimos realizar os mutirões a partir de processos previamente identificados", afirma a secretária Maria Tereza Uille Gomes, titular da Seju.

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Na última semana, o governo promoveu o quarto mutirão carcerário do estado – ações nas quais uma força-tarefa da secretaria e do sistema judiciário despacha sobre pedidos de benefícios pendentes de análise. No total, foram analisados 3.682 processos e concedidos 1.010 livramentos – entre alvarás de soltura e indultos.

Segundo especialistas, porém, outra medida tem ainda mais impacto nesse fenômeno: o uso ponderado da prisão cautelar após a promulgação da Lei 12.403. A legislação, sancionada em 2011, alterou artigos do Código de Processo Penal que tratam das medidas cautelares e prisões preventivas, ampliando as opções de sanções provisórias de acordo com a gravidade do crime.

"Essa lei abriu a possibilidade de aplicação de medidas alternativas para delitos menos graves. Ela foi importante porque corroborou para o desencarceramento sem impunidade", defende Lucia Maria Beloni Dias, presidente da Comissão de Estabelecimentos Prisionais da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Paraná.

De fato, a queda na taxa de encarceramento tem ajudado a desafogar um sistema carcerário que estava à beira do colapso. Segundo a Seju, houve uma redução de 47% na superlotação nas delegacias entre 2011 e 2013. Apesar de significativa, a diminuição ainda não conseguiu aliviar por completo as carceragens paranaenses, que têm 10.510 internos para 4.487 vagas.

Superlotação em cadeias favorece prisão "eletiva"

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Mesmo com a redução na taxa de encarceramento, o Paraná ainda está longe de acabar com a superlotação em carceragens de delegacias do estado. Atualmente, são 6.485 presos a mais do que o sistema comporta – quadro que se configura em um barril de pólvora. Na semana retrasada, uma rebelião de presos na Delegacia de Pinhais, na Região Metropolitana de Curitiba, deixou três policiais feridos. De acordo com o GeoPresídios, sistema do Conselho Nacional da Justiça, há 96 detentos para 16 vagas no local.

A situação, porém, não é exclusividade de Pinhais. São inúmeras as delegacias superlotadas. Na Delegacia de Furtos e Roubos de Veículos, em Curitiba, por exemplo, são 134 internos para 16 vagas. Já na Delegacia de Fazenda Rio Grande, são 86 presos para 24 vagas – 15 deles já condenados.

Policiais civis afirmam que há casos de presos mantidos em carceragens mesmo condenados há mais de seis anos. Eles dizem ainda que a superlotação obrigou a polícia a criar uma espécie de "investigação eletiva". "Hoje, escolhemos o que vamos investigar e prender porque não há mais onde colocar preso. Fechamos os olhos para os pequenos e só prendemos os grandes", diz um policial que preferiu se manter anônimo.

Esperança

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