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Termo também era usado para designar cadeias

A jornalista e pesquisadora Silvia Costa explica que o termo "campo de concentração" foi muito usado pelos policiais brasileiros durante a Segunda Guerra para designar as cadeias que abrigaram os presos e perseguidos na época. Já para a historiadora Marion Brepohl, da Universidade Federal do Paraná (UFPR), o termo não deve ser usado cientificamente como na Alemanha, porque lá houve o processo de tortura e morte. No Brasil as coisas foram diferentes.

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Mal-estar na comunidade

Está escrito na ficha de um dos japoneses presos pelo Departamento de Ordem Política e Social (Dops): essas pessoas são incompreensíveis, segundo o delegado. Isso resume o que os japoneses passaram no Brasil. Só pelo fato de terem uma cultura totalmente diferente, diversos brasileiros tiveram dificuldades de compreender como os orientais pensavam e por que agiam de determinada forma.

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Não houve tamanha barbárie como em Auschwitz, mas o Paraná teve um campo de concentração que também serviu como uma espécie de confinamento de uma determinada etnia. O alvo não eram os alemães e sim os japoneses, que foram duramente perseguidos na Segunda Guerra Mundial. Uma lei federal de 1942 pediu para que todos os imigrantes que fizessem parte do grupo do Eixo (durante a guerra) fossem retirados da faixa litorânea e ficassem a pelo menos 100 quilômetros de distância do mar, por medida de segurança na­­cional. Alemães, italianos e japoneses foram perseguidos e retirados do litoral paranaense porque se acreditava que eles poderiam manter comunicação ou fazer conluio com os navios inimigos que se aproximavam do Brasil.

A delegacia de Antonina, em 25 de setembro de 1942, retirou 85 migrantes da cidade: 53 japoneses, 10 alemães e 22 italianos. Do litoral, o "trem dos evacuados" partiu para Curitiba. "Quem tivesse parentes na capital ou amigos que pudessem oferecer abrigo ficava pela cidade. Já os japoneses que não encontraram lugar para morar foram levados para a atual Granja Canguiri", explica a jornalista Maria Helena Uyeda, autora do livro Ayumi – caminhos da imigração. Ela escreveu o livro junto com o pesquisador Claudio Seto. Quando ainda estava vivo, Seto entrevistou uma senhora japonesa que viveu em Canguiri: ela teria narrado a situação precária enfrentada pelos japoneses na granja. Há quatro anos esta senhora faleceu e, até hoje, há poucas informações sobre o assunto. A obra literária acabou sendo um dos poucos registros históricos.

Sabe-se, por meio desta mu­­lher, que as famílias que foram para o Canguiri viviam em galpões rurais com o mínimo de infraestrutura. Esses locais já haviam sido ocupados por cavalos e pelos bois. Foi ali que esses japoneses viveram a partir de 1942 – não há registros oficiais de quantos eles eram, mas acredita-se que ficaram na granja até o fim da guerra, em 1945. Não há, ainda, informações de tortura física, entretanto eles permaneceram confinados porque representavam uma ameaça nacional; por isso, o espaço ficou conhecido como "campo de concentração".

Os adultos foram obrigados a trabalhar na produção agrícola e as crianças foram separadas de seus pais e levadas para a Escola Agrícola Militar de Castro. Se­­gundo o livro escrito por Seto e Maria Helena, essa medida, tomada pelo interventor Manoel Ribas, seria um pretexto para dar educação às crianças, mas os japoneses interpretaram como uma iniciativa para que eles evitassem a fuga do local.

Pior do que ficar isolados, os japoneses da granja tiveram de lidar com o preconceito: eles recebiam a visita de estudantes que faziam gozações e chegavam a oferecer capim aos moradores, além de imitar animais (faziam mugidos e relinchos). Maria Helena lembra que havia, nesta época, uma indústria norte-americana que precisava arrecadar sucata de borracha e metal para reciclagem. Em Curitiba, então, foram organizadas campanhas para recolher esse material e os estudantes que participassem teriam como "prêmio" um passeio à Granja Canguiri. "Todas as semanas os alunos iam ver a vitrine de demonstração de poder das autoridades", conta Maria Helena.

Marcas do preconceito

Além do campo de confinamento para um certo grupo de orientais, outros japoneses foram perseguidos pelas ruas de Curitiba e alguns tiveram suas lojas destruídas durante a Segunda Guerra e no período da campanha de nacionalização de Getú­lio Var­gas. Eles eram considerados uma raça que tinha características inferiorizantes – ao contrário dos alemães e italianos – porque a diferença maior estava marcada literalmente no rosto. "Eram chamados de amarelos. O termo japonês é muito mais recente. E chegaram a ser conhecidos como ‘perigo amarelo’. O Brasil queria imigrantes para branquear a população, mas a miscigenação entre brasileiros e orientais não era bem vista", explica a historiadora Elena Shizu­no, doutoranda da Uni­ver­sidade Federal do Paraná (UFPR) que lança, ainda neste ano, o livro Os imigrantes japoneses durante a Segunda Guerra Mundial: bandeiras do oriente ou perigo amarelo, pela editora da UEL.

Durante a constituinte de 1934 houve também perseguições e restrições aos orientais. Foi aprovada uma cláusula que impunha cotas restritivas para a entrada de imigrantes japoneses no Brasil. A imigração começou em 1908 e chegou ao Paraná em 1917, mas na década de 30 médicos eugenistas acreditavam que, se mais japoneses viessem ao país, a miscigenação "descontrolada" originaria um povo cada vez mais incapaz. "Foi diferente com os imigrantes brancos, como espanhóis, alemães e italianos. Essa mistura era considerada perfeita", afirma Elena.

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