Ativistas da Pastoral da Aids, que atende cerca de cem pessoas em Paranaguá| Foto: Priscila Forone/ Gazeta do Povo

Combate

Santos aposta na prevenção

A cidade de Santos, no litoral paulista, já foi considerada a "capital nacional da aids" no final dos anos 80, quando chegou a registrar uma incidência de mais de 100 casos por 100 mil habitantes. Hoje, o programa de prevenção e tratamento adotado pelo município nos anos 90 é considerado exemplo mundial, e já rendeu bons resultados – atualmente, a incidência é de 35,6 casos.

A ativista Paola Varela, diretora da ONG Hipupiara, referência nacional no assunto, acredita que a melhor estratégia adotada pelo município na época foi a chamada Política de Redução de Danos (PRD), em que o objetivo não é erradicar a prática de risco, mas minimizar seus efeitos na saúde de quem a adota. Em Santos, a política foi aplicada aos usuários de drogas injetáveis, com a distribuição gratuita de seringas, e aos profissionais do sexo, com distribuição de camisinhas. "Essa política sofreu muita resistência no começo. Antes de o estado adotar essa medida, as ONGs já a realizavam, e a polícia costumava correr atrás do pessoal, realizar prisões e apreender o material." (VP)

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A cidade de Paranaguá, no litoral do estado, lidera um ranking triste: tem a maior incidência de aids do Paraná. A cada 100 mil ha­­bitantes, 30 têm a doença, de acordo com dados da Secretaria Municipal de Saúde. Embora já tenha registrado números maiores – em 2006, o índice era de 73,6 casos a cada 100 mil habitantes –, a situação ainda é preocupante, visto que o município, de 140 mil habitantes, registra uma incidência quase seis vezes maior do que a média nacional, que é de 5,61 casos. Somente no ano passado, o Ambulatório de DST/aids do município notificou 150 novos casos. Desde 1984, quan­­do surgiu o primeiro caso da doença no Paraná, Paranaguá já registrou 1.147 casos.

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A condição de cidade portuária é uma variável importante para a elaboração de estratégias de prevenção da doença em Pa­­ranaguá. "O fato de o município ter uma área de porto certamente contribui para esses nú­­meros. A cidade faz divisa com o mundo todo, e para cá vêm pessoas as mais variadas, algumas conscientes da importância da prevenção, e outras não", opina a diretora do Departa­mento de Vigilância Epide­mio­lógica do município, Isa­bele An­toniacomi.

A professora do curso de Medicina da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), Fa­­biana Schuelter Trevisol, autora de uma tese de mestrado sobre a infecção por HIV de prostitutas na cidade portuária de Imbituba (SC), explica que as cidades com porto, por registrarem alta transição de marinheiros, costumam atrair mais profissionais do sexo. "A oferta é maior porque há quem consuma esse serviço e, embora as prostitutas estejam mais conscientes, ainda há muitas que não se previnem. Além disso, nesses locais, há maior comercialização de drogas ilegais, o que aumenta o consumo de drogas injetáveis, outro comportamento de risco que facilita o contágio."

O diretor da ONG Hipupiara, de São Vicente, no litoral paulista, que representa os direitos de portadores que vivem na Bai­xada Santista e arredores, Beto Volpe, concorda. "A figura do marinheiro como aquele ho­­mem que tem um amor em cada porto já é emblemática. Ele passa dias embarcado, e quando volta para terra, ele quer diversão, na maioria das vezes, por meio do sexo, e nem sempre de modo seguro. Isso vale também para o embarcado que consome drogas", comenta.

A relação entre os números altos de casos e os portos pode ser comprovada pelo último Bo­­letim Epidemiológico de aids, divulgado pelo Ministério da Saúde em novembro de 2009: entre os 100 municípios brasileiros com mais de 50 mil habitantes que apresentam maior incidência da doença, 17 são portuários. A campeã nesse ranking é Porto Alegre, com 111,5 casos pa­­ra cada 100 mil pessoas. Parana­guá ocupa a 97.ª posição.

Negligência

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Para a coordenadora do Am­­bulatório de DST/aids do município, Carla Neri, outra explicação para o alto número de casos é a recusa da população em fazer testes. "Muitos acreditam que isso nunca vai acontecer com eles, se recusam a fazer o teste e, assim, não sabem se têm a doença, fazem sexo sem camisinha e acabam contaminando outras pessoas", argumenta.

A coordenadora afirma que muitas mulheres casadas, hoje o grupo mais vulnerável, só descobrem a doença quando estão grávidas, pois a realização do teste é obrigatória em casos de gravidez. "Ainda há muito preconceito, embora haja bastante informação. Enquanto isso persistir, junto com a ideia de que isso só ocorre com o vizinho, va­­mos continuar a ver os índices crescerem."