Paranaguá é conhecida por sediar um dos portos mais importantes do país e ser ponto final da exuberante ferrovia que atravessa a Serra do Mar até Curitiba. Mais do que isso, a cidade é um testemunho vivo da história do Paraná, que a maioria dos paranaenses desconhece. No seu centro histórico estão preservadas marcas deixadas pela colonização portuguesa em meados do século XVII, como igrejas, casarões e monumentos. Quem circula pelas estreitas ruas de Paranaguá, não imagina que a Fontinha, uma antiga fonte de água da cidade, possa ser também fonte de lendas e histórias que se confundem com a formação do nosso estado.
No ano de 1550, apenas 50 anos após Pedro Álvares Cabral chegar ao Brasil, saíram de Cananéia e São Vicente algumas canoas de aventureiros em busca de ouro e novas terras. Domingos Peneda, Diogo Unhate e outros desbravadores costearam as praias de Ararapira e Superagüi até aportarem na Ilha da Cotinga. Ficaram na região por 20 anos conquistando a amizade dos índios Carijós que habitavam toda a margem esquerda do Rio Taguaré, hoje rio Itiberê. Foi nessa histórica e secular "Cotinga" que surgiu o primeiro povoado de brancos no continente paranaense. O local foi escolhido pela proximidade de um manancial de água potável, o mesmo que servia aos índios Carijós. Exatamente onde existe hoje a Fontinha.
Também chamada de "Fonte Velha", a construção da Fontinha remonta ao século XVII, sofrendo várias modificações posteriores. É formada por uma caixa subterrânea, cuja face voltada para o mar está descoberta, onde aparece uma pequena janela de limpeza e os "ladrões" por onde se escoa o excesso da água. A caixa se alonga em galeria, protegendo o manancial num fundo escuro e misterioso que resiste há mais de três séculos as maiores estiagens.
"Era nos tempos antigos a única fonte de água de boa quali-dade. As águas de poço ou de estagnação eram salobras ou avermelhadas", conta o pesquisador José Maria de Freitas, membro do Instituto Histórico e Geográfico de Paranaguá. Localizada na praça Pires Pardinho, o monumento faz parte da rua conhecida como Ladeira da Fonte. As pedras que forram o terreno à sua volta foram trazidas como lastro, usadas para dar estabilidade aos navios veleiros de outras terras e até mesmo da África. "Esses navios atracavam na sua proximidade e utilizavam-se daquela água para as longas viagens. Infelizmente o aterro afastou o rio Itiberê da Fontinha", conta José Maria. Com a inauguração da rede de esgoto e água em 1914, a fonte foi desativada e tombada pelo Patrimônio Histórico e Artístico do Paraná em 1864.
Além de seu caráter histórico, a Fontinha é famosa por suas lendas e tradições, uma das quais vem dos trágicos tempos da escravidão. Consta de documentos antigos que um africano cativo assassinara o seu amo, movido certamente pelos maus tratos recebidos. O réu acabou condenado à forca e executado. Era praxe judicial da época, em se tratando de escravos, que a cabeça da vítima fosse cortada e exposta em lugar bem visível para servir--lhes de exemplo. Assim, a cabeça do supliciado veio para a Fonte Velha e foi suspensa num poste alto de madeira. Por muitos anos ali permaneceu a caveira, tornando o local deserto e temido após o anoitecer, porque à cena da cabeça suspensa no poste, juntava-se a visão extraordinária do corpo decapitado do africano que vagava silenciosamente pela noite.
Mas a história que aguça e atravessa a curiosidade de gerações é a lenda da existência de túneis subterrâneos que ligam a Fontinha com as Igrejas de São Benedito, Nossa Senhora do Rocio e o antigo Colégio de Jesuítas. "Não se sabe ao certo, mas dizem que esses túneis serviam de refúgio aos jesuítas, quando houve a perseguição provocada pela Lei Pombalina, que baniu a Ordem do Brasil", conta Nelson Uberna, que trabalha na secretaria de turismo de Paranaguá. Relatam alguns historiadores que os jesuítas, quando foram expulsos do Brasil, fundiram ouro e enterraram tesouros num dos muitos caminhos subterrâneos que cortam a cidade.
Percorrendo os corredores do antigo Colégio dos Jesuítas, atual Museu de Arqueologia de Paranaguá, não é difícil imaginar que em alguma pedra solta de suas paredes centenárias possa surgir a entrada do secreto túnel. "Muita gente já tentou chegar até aqui se embrenhando pelas galerias da Fontinha. Por causa do labirinto e da falta de oxigênio alguns nunca mais voltaram. Com certeza deve ter ossadas humanas por lá", revela o segurança do museu Cristiano Berlim.
Com o objetivo de revelar este mistério envolto por lendas e suposições, a Expedição Paraná se aventurou pelas galerias históricas da Fontinha. Utilizando cordas e lanternas a equipe ingressou no túnel acompanhada por um acre e desagradável odor. As passagens eram estreitas e baixas, obrigando todos a rastejar no chão sujo e molhado. Depois de 20 metros de exploração, não havia mais saída. A passagem estava obstruída com tijolos e concreto, bloqueando a ligação com o resto do túnel. A Expedição abandonou o interior da fonte, marcada pelo desafio. O refúgio dos jesuítas continuava intocável em sua mina. Assim a Fontinha resiste ao tempo. Protegendo não só as nascentes, mas também histórias e lendas que saciam cada vez mais o imaginário do povo de Paranaguá.
O que é a expedição
O QUE É A expedição busca caminhos alternativos, visando a releitura do estado, por meio do seu patrimônio humano e natural. Orlando Azevedo, coordenador do projeto, viaja com os cinegrafistas André Slomp de Azevedo e Marco Aurélio Jacob, acompanhados pelo jornalista Jeferson Jess.
PATROCÍNIO Sanepar, Gazeta do Povo, Clear Channel, Rádio Rock 96.3 e provedor OndaRPC.
APOIO Ministério da Cultura, Governo do Estado do Paraná, Secretaria Estadual da Cultura, Vivo, BS Colway, Leica e loja Barddal.
AGRADECIMENTOS Prefeitura de Paranaguá, Fundação Municipal de Turismo, Nelson Uberna e Rafael Gutierrez.
SITE OFICIAL Roteiro, diário de bordo e fotografias dessa aventura podem ser conferidas no www.expedicaoparana.com.
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