Há 15 anos pesquisadores alemães e brasileiros estudam como recuperar áreas degradadas da floresta de araucária, vegetação típica do Sul do Brasil. E eles garantem: os resultados são animadores. Além de desenvolver boas técnicas de plantio de mudas, de quebra os cientistas descobriram novas espécies de animais na mata. "Fazendeiros vizinhos começaram a nos procurar, interessados nos resultados. Eles perguntam: Como vocês conseguem e a gente não?", revela o pesquisador alemão e coordenador do projeto, Rainer Radtke. Ele conversou com a reportagem da Gazeta do Povo durante a 63.ª Reunião Anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência, realizada em Goiânia (GO) entre 10 e 15 de julho.A base operacional dos estudos uma área de mais de 4,5 mil hectares no município gaúcho de São Francisco de Paula (a 112 quilômetros de Porto Alegre), onde funcionava uma serraria, transformou-se na sede do projeto Pró-Mata (http://www3.pucrs.br/portal/page/portal/ima/Capa), uma bem-sucedida parceria entre a Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), através do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (IMA), a Universidade de Tübingen e a Universidade de Ciências Florestais de Rottenburg, ambas da Alemanha. "Nossa intenção não foi replantar floresta, mas descobrir a técnica e entender o ecossistema", explica Radtke. A parceria existe desde 1983, mas o projeto iniciou oficialmente em 1996.
Escolha
A escolha pela araucária (Araucaria angustifolia), também chamado de pinheiro-do-Paraná, baseou-se na necessidade de recuperação das espécies nativas da Floresta Ombrófila Mista ecossistema típico do Sul e que integra a Mata Atlântica e na carência de projetos de reflorestamento. A mata de araucária chegou a cobrir um terço do Sul do país, mas hoje ocupa apenas 2% da região. No Paraná, onde ainda há maior concentração, apenas 0,8% da cobertura vegetal está em bom estado de conservação. Por causa da madeira de boa qualidade, a espécie começou a ser explorada comercialmente a partir dos anos 1930 e, posteriormente, foi incluída na lista oficial de espécies da flora brasileira ameaçadas de extinção.
Desde o início do Pró-Mata, mais de cem dissertações de mestrado e teses de doutorado foram elaboradas pelas três universidades. Entre os métodos de plantio e cultivo desenvolvidos está, primeiramente, o de não deixar a muda sob sol forte. O ideal é colocá-la em meio à vegetação secundária, para ter sombra e evitar os ventos fortes. As raízes, por sua vez, precisam crescer para baixo, sem espalhar nem enrolar. Além disso, a cada três meses é necessário retirar a vegetação ao redor das plantas, pois ela pode sufocar a muda.
Em meio à área do projeto, surgiram outras descobertas, como três novas espécies de sapos. Outros estudos contemplaram os insetos da região e os liquens simbiose entre algas e fungos que indicam se o ecossistema está saudável ou não. Os temas resultaram em três guias de campo, com fotos, e traduzidos para o português, alemão e inglês.
Segundo Radtke, todas as descobertas se basearam em observações de campo. "O gado não entra mais nesta área e a paisagem mudou. As áreas de campo foram diminuindo e, junto com a mudança, já desapareceram espécies de sapos que não se encaixaram nesse ambiente novo", esclarece.
Regeneração da mata não é o problema
Segundo os especialistas, a araucária não é uma espécie de difícil regeneração. Ao contrário. Além disso, as pesquisas no Brasil estão em estágio avançado, há muita literatura sobre o assunto e os métodos de cultivo são conhecidos. Ou seja, os motivos para não haver mais incentivos para se aumentar a cobertura de mata nativa são outros. "O que acontece em relação aos pequenos agricultores é que, como a legislação é muito dura, quando eles percebem que o pinheiro começa a se regenerar, acabam cortando antes que ele cresça. Se virar uma árvore de porte adulto, vão ter problemas depois. A legislação é muito punitiva", avalia a engenheira florestal Ana Paula Dalla Corte, pesquisadora da Fundação de Pesquisas Florestais do Paraná (Fupef), ligada à Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Dalla Corte foi a coordenadora do estudo Atualização da Cobertura Florestal da Floresta Ombrófila Mista no Paraná, encomendado pelo Instituto Ambiental do Paraná (IAP) e pela Secretaria estadual de Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Sema) e concluído no início de 2011. O levantamento faz um inventário da mata de araucária remanescente no estado. Porém, a pesquisadora evita dar detalhes sobre o estudo, pois ele ainda não foi liberado oficialmente pelas entidades citadas.
De acordo com Carlos Roberto Sanquetta, engenheiro florestal e professor do Departamento de Ciências Florestais da UFPR, o pinheiro do Paraná normalmente tem um crescimento mais lento que outras espécies, inclusive as exóticas, como o pínus e o eucalipto. Na natureza, a árvore leva até 40 anos para chegar à maturidade plena (e 20 anos para começar a produzir pinhão). No entanto, os pesquisadores desenvolveram métodos para acelerar esse processo em até três vezes. "Temos conhecimento para usar em plantios para fins comerciais. Daria para dobrar a produção", afirma Sanquetta. Ao contrário do que muitos imaginam, o cultivo da araucária é totalmente legal e o corte é permitido.
"A madeira da araucária é excepcional, não apresenta rachaduras e tem um percentual de aproveitamento da tora muito grande", explica Ivar Wendling, chefe de pesquisas da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Florestas. Além disso, diz ele, diversos produtos podem ser desenvolvidos a partir do fruto. Para ele, apesar de haver pesquisa sobre o tema, investimentos constantes são necessários.
Colaborou João Rodrigo Maroni
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