Especialistas divergem sobre regras da ANS
As novas medidas da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para estimular o parto normal na rede privada e reduzir nascimentos antes da hora por cesariana foram comemoradas por especialistas em saúde maternoinfantil.
No entanto, associações médicas questionam as regras, que preveem informações para auxiliar a gestante na escolha do obstetra e incluem o preenchimento, pela equipe de saúde, de um gráfico sobre etapas do trabalho de parto: o partograma.
O Conselho Federal de Medicina (CFM) questiona a obrigatoriedade de apresentação de porcentuais de partos cesáreos e normais e teme que os especialistas sejam estigmatizados na rede.
O vice-presidente do CFM, Mauro Luiz de Britto Ribeiro, defende que outras variáveis sejam divulgadas junto com os porcentuais, como a própria especialidade médica e as condições de cada unidade de saúde para atender a eventualidades.
A Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (Febrasgo) questiona quem ficará responsável pela confecção dos partogramas, caso o papel não seja fornecido pelos hospitais e clínicas.
Outra preocupação dos profissionais é com a disponibilidade de leitos. Mesmo na rede privada há dificuldade de remanejar uma paciente para o leito cirúrgico, caso o parto normal evolua para uma cesariana. Por isso, muitos médicos optam pelo agendamento.
As associações também recomendam uma mudança na formação dos obstetras para que o parto normal humanizado seja uma realidade. "O estudante só vê cesariana, então, chega na hora, ele acaba preferindo", acrescentou o presidente da Febrasgo, Etelvino Trindade.
Preocupadas com o alto índice de cesarianas na rede privada (84%) e incapazes de contratar uma equipe de saúde completa, muitas mulheres têm optado por hospitais públicos de referência em saúde maternoinfantil para realizar o parto normal.
No Rio de Janeiro, a busca pela Maternidade Maria Amélia virou tendência, segundo a enfermeira obstetra Heloisa Lessa, da Associação Brasileira de Obstetrizes e Enfermeiras Obstétricas. Segundo ela, com as novas regras da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), as gestantes têm se informado sobre os riscos da uma cesariana desnecessária. "Muitos médicos preferem fazer cesarianas porque podem ser agendadas com antecedência e são mais bem remuneradas pelos planos de saúde", completa.
De acordo com Heloisa, a doula, profissional que acompanha a gestante desde o início da gravidez, ajudando na preparação do casal, também está se tornando uma tendência.
A tradutora Eva Holzova Dantas, 32 anos, que recentemente teve Stella, hoje com 1 mês de vida, conta que a doula deu apoio para que ela tentasse o parto normal, depois de uma cesariana do primeiro filho. "Ela passou exercícios para o casal, durante a fase ativa do parto, esclareceu sobre as fases do parto, o que te dá um apoio emocional muito importante.".
Em casos de gravidez de baixo risco, o parto normal humanizado é a melhor opção, segundo a pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Silvana Granato. No processo, a equipe está treinada para realizar o menor número possível de intervenções no corpo da mulher, como a episiotomia (corte no períneo) e a injeção de ocitocina (hormônio sintético). "A ocitocina, por exemplo, aumenta o número de contrações do útero, o que aumenta a dor e torna o parto normal mais dolorido", alertou. Ela também observa uma migração de mulheres para a rede pública, onde as parturientes podem usar banheiras para aliviar a dor, além de receber massagens e exercícios para ajudar a relaxar, o que é permitido no Maria Amélia.
Dados
A Secretaria Municipal de Saúde do Rio disse que não é possível estimar quantas gestantes com plano de saúde preferem ter bebês na unidade pública. Porém, o número de partos normais na Maternidade Maria Amélia chega a 76,2 % maior que a média da rede, de 66,%, que inclui nove maternidades e uma casa de parto (unidade extra-hospitalar que realiza apenas partos normais de baixo risco).
Para estimular a prática, o governo do estado do Rio tem treinado equipes e recentemente comprou uma banheira para o Hospital Estadual dos Lagos de Saquarema, na Região dos Lagos. "Banhos de imersão em água morna ajudam no trabalho de parto", disse o coordenador de Maternidades da Secretaria de Estado de Saúde, Jorge Calás.
De acordo com a coordenadora da pesquisa Nascer no Brasil, da Fiocruz, Maria do Carmo, entre as vantagens do parto normal estão a redução da morte materna, infecções, além de dores pós-operatórias. Nos bebês, diminui risco de morte intrauterina, complicações respiratórias e obesidade na infância.
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