1 refém e 18 transferências
Depois de manter um agente penitenciário refém por mais de cinco horas ontem, 18 presos da Penitenciária Central do Estado (PCE), em Piraquara, na Região Metropolitana de Curitiba, tiveram seus pedidos atendidos e foram levados para o interior do estado à noite. De acordo com a previsão da Secretaria de Justiça, Cidadania e Direitos Humanos (Seju), dois camburões deveriam sair em direção a Londrina e Maringá, no Norte do estado, e Foz do Iguaçu, no Oeste. Ainda de acordo com a Seju, esses presos já haviam solicitado transferência para ficar mais perto de onde moram suas famílias. O acordo era que os presos liberassem o agente assim que os camburões e a escolta para levá-los às cidades do interior estiverem preparados. Até o fechamento desta edição, os veículos ainda não haviam chegado à PCE.
OAB
Superlotação é problema crônico em delegacias do estado
A OAB-PR trabalha em um novo relatório sobre a situação das delegacias do estado, que chegam a abrigar oito vezes mais detentos que a capacidade máxima. Uma das situações mais críticas é a do 11º DP, na capital, que tem 25 vagas, mas está com 164 presos. "Fazemos vistorias constantes e enviamos os relatórios às secretarias de Segurança e Justiça. Mas, pela dimensão do problema, o avanço não tem sido significativo", critica o presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB-PR, José Carlos Cal Garcia Filho. Na Região Metropolitana de Curitiba (RMC), a delegacia de São José dos Pinhais mantém 106 presos em um espaço onde só caberiam 24, número parecido com o de Colombo. Em Piraquara, a capacidade da delegacia é de oito detentos, mas há 45. Em Fazenda Rio Grande, 71 detentos ocupam um espaço que deveria ser destinado a apenas 26.
"Eles estão cada vez mais organizados. A tecnologia também é um recurso para os presos, que recebem planilhas via internet e pendrives. A maioria dos agentes é honesta. O estado é que é conivente ou não tem competência para fiscalizar."
Josmar Jozino, jornalista policial, autor de três livros sobre o PCC.
A facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) surgida na década de 1990 nos presídios paulistas avança de forma ostensiva nos complexos penais e carceragens de delegacias do Paraná. Em uma forma de desafiar as autoridades, os presos usam o nome da facção para demarcar território dentro dos presídios: bradam gritos de guerra e assinalam as alas dominadas pelo grupo. A Gazeta do Povo teve acesso a vídeos e fotos feitos por agentes penitenciários que atestam a progressão do "partido do crime" no Paraná. Ontem, enquanto o sindicato se manifestou, cobrando mais segurança no sistema prisional, outra unidade sofreu rebelião e um agente foi feito refém não houve feridos.
FOTOS: Confira imagens da Penitenciária Estadual de Piraquara-I
VÍDEO: Veja como atuam os membros do PCC
Quatro vídeos gravados entre dezembro de 2013 e janeiro deste ano, na Penitenciária Estadual de Piraquara-I (PEP-I), mostram o que parece ser um ritual dos presos cooptados pelo PCC. Diariamente, durante o banho de sol, os detentos formam um grande círculo, em que um deles puxa o grito de guerra da facção. Ao final, todos gritam: "PCC, paz, justiça, igualdade e união para todos".
O grupo criminoso também demonstra ostensividade por dentro das grades. As celas que abrigam integrantes do PCC têm na porta a sigla da facção, grafada de forma improvisada pelos detentos. Nas paredes da primeira galeria, algumas armas desenhadas vêm acompanhadas de inscrições provocativas, como "Somos criados para matar", "mente terrorista" e "contra opreção" (sic).
Instabilidade
Segundo o Sindicato dos Agentes Penitenciários do Paraná (Sindarspen), desde dezembro aumentaram as apreensões de "estoques" (armas improvisadas, feitas pelos próprios presos a partir de pedaços de ferro) e serras. Também tem sido maior o volume de celulares e de drogas que familiares tentam repassar aos presos, em marmitas e sacolas. As imagens feitas pelos agentes também mostram escavações em paredes e buracos, o que, segundo o sindicato, evidencia as sucessivas articulações dos presos, na tentativa de fugir.
"A situação é de total instabilidade. Precisamos de mais segurança para trabalhar", resumiu o vice-presidente do Sindarspen, Antony Johson.
A tensão não é uma exclusividade da PEP-I. Ao lado, na Penitenciária Central do Estado (PCE), os presos "faccionados" estão confinados no quarto bloco, onde há quatro galerias e 240 detentos. Um agente penitenciário que trabalha na unidade diz que os membros do PCC é quem dão as cartas por ali. Segundo ele, chegavam a se reunir a portas fechadas com a administração do presídio, para ter acesso a regalias, como alimentação diferenciada e acesso a produtos de fora da penitenciária.
"Eles [os presos do PCC] são completamente indisciplinados. Não aceitam ordens. Reagem a cusparadas, com xingamentos. Semana passada, um deles jogou uma marmita quente na cara de um colega nosso. E nós não podemos reagir. É impossível a ressocialização num ambiente desses", disse.
Faccionados estão isolados, diz Depen
O governo do Paraná passou a reconhecer oficialmente as ramificações do PCC no estado em dezembro de 2013, quando o MP-SP divulgou um mapeamento da facção criminosa. O relatório apontava pelo menos 656 "faccionados" no estado. Ontem, o coordenador do Departamento Penitenciário (Depen), Cezinando Paredes, reconheceu a presença do grupo criminoso nos presídios paranaenses e que esses detentos demandam "maior preocupação".
Paredes disse que, quando reassumiu o Depen, havia uma "crise em algumas unidades", mas destacou que a situação está sob controle. A Secretaria de Estado da Segurança Pública, em nota, disse que as ações de inteligência "não são divulgadas por questões estratégicas".
"Moeda de troca"
Em três motins ocorridos em menos de 40 dias em presídios do estado, os detentos exigiam transferência para outras cidades. Para um agente da PCE que não quis ser identificado a situação expõe os diversos riscos da categoria. Segundo ele, a unidade não dispõe de mecanismos básicos de segurança, como algemas e cadeados. "Viramos moedas de troca. Nos fazem reféns, exigem transferência e são transferidos", afirmou.
Jogo de futebol marcou a criação de facção
Bruna Komarchesqui
Um jogo de futebol em 31 de agosto de 1993, entre detentos da capital e do interior, foi o marco da criação do Primeiro Comando da Capital (PCC), na Penitenciária de Taubaté, interior de São Paulo. Autor de três livros sobre o tema, o jornalista Josmar Jozino, um dos primeiros a divulgar a existência da facção, explica que os presos vinham se organizando, inclusive com a elaboração de um estatuto, para evitar novos massacres como o do Carandiru, ocorrido no ano anterior. "Era uma espécie de sindicato dos detentos," diz o jornalista.
Os criminosos foram conquistando apoio da população carcerária, após medidas como a proibição do uso de crack nas penitenciárias, o fim das mortes violentas e da violência sexual. "Eles passaram a cobrar mensalidade em troca de proteção. Então, descobriram que o celular é uma arma mais poderosa que o fuzil e passaram a comandar negócios, roubos a banco e o tráfico de dentro das prisões", detalha.
Um raio X do PCC, concluído pelo Ministério Público Estadual (MPE) de São Paulo no fim do ano passado, após três anos e meio de investigações do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), resultou na denúncia de 175 pessoas e no pedido à Justiça de internação de 32 presos.
O MPE estima que a migração para outros estados tenha começado pelo Paraná, por fatores como a proximidade geográfica. Conversas telefônicas interceptadas pelo Gaeco mostram que o PCC faz contato com DDDs de 22 estados. A maior concentração do grupo ainda é em São Paulo, onde domina 90% das penitenciárias.Penitenciária Estadual de Piraquara-I****VIDEO****
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