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Um levantamento feito pela Gazeta do Povo junto às seccionais da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) nos quatro estados mais populosos do país mostrou que um requerimento de saída temporária da prisão pode custar até R$ 7,6 mil dependendo da localidade. Esses valores são cobrados por advogados, que elaboram os requerimentos e os apresentam à Justiça.
A suspensão do benefício das chamadas "saidinhas" voltou à tona com a ocorrência de uma série de crimes violentos de presos que desfrutaram do benefício da saída temporária de Natal, o que inclui o caso do sargento da Polícia Militar de Minas Gerais morto por um detento liberado da prisão para passar as festas de fim de ano com a família. O criminoso possuía 18 passagens pela polícia e mesmo assim teve acesso ao benefício.
O fim das saídas temporárias, no entanto, enfrenta resistência de parte da sociedade desde que passou a ser discutida há quase 13 anos no Congresso, quando um projeto de lei começou a tramitar para restringir o benefício apenas a detentos que já têm permissão para trabalhar e estudar fora da cadeia.
Entre as argumentações favoráveis ao benefício está a de que as "saidinhas" ajudam na ressocialização do preso. Fora o alegado caráter social do benefício, há outras correntes que tentam travar o avanço do projeto de lei por interesses políticos e até de mercado, como é o caso de parte dos advogados criminalistas.
A Gazeta do Povo consultou as tabelas de honorários da OAB nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais e Bahia. Os valores servem de base para a cobrança de honorários, mas não há impedimento para que escritórios de advocacia cobrem quantias diferentes das sugeridas pela Ordem.
As seccionais da Bahia (R$ 7.614) e São Paulo (R$ 7.195) sugerem os valores mais altos, e são seguidas pela seccional de Minas Gerais (R$ 7.000). Já a OAB do Rio de Janeiro sugere cobrança do valor de R$ 3.812 pelo requerimento.
Vale destacar que nem todos os requerimentos para o desfrute do benefício são elaborados por escritórios de advocacia. Grande parte deles é requisitada pelas defensorias públicas, uma vez que muitos presos não possuem condições de constituir seus próprios advogados.
"E muitos outros não cobram por cada requerimento, mas fazem um ‘pacote’ ao longo de todo o processo, porque várias das famílias desses detentos já empenharam todas as economias que têm para pagar os honorários", explica a advogada Géssica Almeida, presidente do grupo Movimento Advogados de Direita Brasil. "E há também concessões dadas por ofício de juízes [sem um pedido formal de um advogado]", prossegue.
O movimento que Géssica preside elaborou recentemente um abaixo-assinado para pressionar o Senado para avançar com o projeto de lei que acaba com as “saidinhas” que se aproxima das 50 mil assinaturas. Tal medida diverge de parte considerável da classe que é favorável à manutenção do benefício.
A advogada explica que a legislação que permite a saída temporária de detentos dos presídios, que data de 1984, está desatualizada. Atualmente são beneficiados presos do regime semiaberto que já cumpriram pelo menos um sexto da pena.
Géssica acredita que este e outros quesitos perderam eficácia com a evolução da criminalidade ao longo dos anos. Para ela, detentos que respondem ao crime de tráfico de drogas, por exemplo, não têm muito a perder se cometerem mais um crime durante a "saidinha" – que é o que aconteceu com o autor da morte do PM mineiro.
“O Código Penal, por exemplo, é da década de 1940, e está desatualizado. O tráfico de drogas é um mundo à parte. Pessoas que respondem por tráfico de drogas ou chefes de facções não deveriam ter acesso ao benefício das saídas temporárias, pois os estragos que causam são terríveis”, pontua.
Recentemente, ao ser questionado sobre a tramitação do projeto de lei no Senado, o presidente da casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), afirmou que o Congresso está analisando a proposta, e que é possível que seja levada ao plenário em breve.
“Não houve inércia do Senado [para deliberar sobre o assunto]. O Senado está trabalhando e se debruçando em relação a esse tema, a função do direito penal e de ressocializar aquelas pessoas que cometeram crimes. Aqueles que se negam a ressocializar têm que sentir o rigor da lei. Não pode ser dada liberdade a quem não tem condição de ter liberdade”, afirmou.
De acordo com a tramitação do projeto (veja aqui), o texto está parado para apreciação dos senadores na Comissão de Segurança Pública desde novembro do ano passado. Na ocasião, a reunião do colegiado foi cancelada e não houve um novo agendamento.