Uma série de crimes sexuais levada a público na última semana mostra um dos lados mais perversos da violação dos direitos de crianças e adolescentes. O Vaticano se envolveu em uma polêmica sobre padres pedófilos e um serial killer foi preso em Luziânia (GO) após cumprir pena por violência sexual. Fatos como esses trazem uma série de questionamentos sobre os pedófilos. Quem são essas pessoas? Como elas agem? Como proteger os filhos? As respostas, infelizmente, não são muito esclarecedoras. Não existe um perfil único de pedófilos e não há cura para a doença. As únicas certezas são de que a patologia não está relacionada com a homossexualidade e de que o agressor é, na maioria dos casos, conhecido da vítima.
Não há dados nacionais sobre agressões sexuais contra crianças, apenas o Disque 100, programa nacional que recebe denúncias sobre esse tipo de delito, que registrou 9.638 ligações em 2009. Os números fornecidos pelo juiz da Vara de Crimes Contra a Criança e o Adolescente de Curitiba, Eduardo Lino Bueno, dão uma ideia do problema: há mais de 700 inquéritos sobre violência sexual tramitando.
Doença
A pedofilia é definida pela área médica como uma doença, cuja principal característica é a atração sexual por crianças. A ex-presidente da Comissão da Criança e do Adolescente da Ordem dos Advogados do Brasil no Paraná (OAB-PR), Márcia Caldas, explica que a patologia em si não é descrita como crime pela legislação. Ou seja, a pessoa só é considerada criminosa se praticar uma violência sexual contra uma criança ou portar material pornográfico. Há casos de pedófilos que não cometeram delitos, embora isso seja mais raro.
É importante também distinguir o pedófilo de um agressor sexual. O último vitimiza não só crianças e tem seu alvo ampliado. É o caso de Admar Jesus da Silva, preso nesta semana em Goiás, que confessou ter matado seis jovens com idades entre 13 e 19 anos. Nesses casos são comuns o uso da violência física e patologias associadas, como a psicopatia. Situação diferente da do pedófilo, que comumente usa a aproximação e o afeto como armas.
Também não há um perfil único do pedófilo, apenas padrões observados. Estão neste rol vítimas de abusos e violência na infância e pessoas que viveram em famílias autoritárias. Apesar disso, há pedófilos que tiveram uma infância normal e adultos vítimas de abusos que jamais cometeram crimes sexuais. Na maioria das vezes, esses indivíduos se relacionam bem em sociedade, principalmente com crianças. Daí a grande dificuldade para a prevenção dessas violações.
Continuidade
A psicóloga e técnica da Coordenação de Ações Protetivas da Secretaria de Estado da Criança e da Juventude, Ticyana Paula Begnini, afirma que a ciência ainda não conseguiu descobrir como surge a patologia. Da mesma forma, não há estudos que comprovem a existência de cura para a doença. O fato comprovado é que, a partir do primeiro crime, a tendência é a continuidade. Por isso essas pessoas precisam de tratamento e monitoramento constante. "É difícil dizer que existe um ex-abusador. A inclinação é continuar os crimes", diz a psicóloga. Infelizmente ainda não há uma política pública no Brasil que monitore os agressores.
O presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais, Toni Reis, reafirma que não existe qualquer estudo científico que comprove a ligação entre a homossexualidade e a pedofilia. "Homossexualidade é uma orientação sexual e não está ligada à prática de crimes".
A advogada Maria Leolina Couto Cunha, especialista no enfrentamento à violência contra a criança e o adolescente, reforça a necessidade de discutir o assunto. "O que está mudando é a cultura da denúncia, porque com uma ampliação dos direitos humanos as pessoas estão se dando conta da crueldade que é deixar isso acontecer", considera. Para ela, é através da discussão que pode-se chegar a alguma solução. "As coisas não estão mais embaixo dos panos e é o debate que vai mostrar o avanço nesse sentido. Nosso sistema está ultrapassado e temos que, como país, buscar uma solução", afirma.