Ainda se sabe muito pouco sobre os casos de microcefalia relacionados ao zika vírus. Mas o que médicos e pesquisadores já perceberam é que em boa parte deles a má-formação é severa. Num grupo de 35 crianças já avaliadas, 71% delas apresentavam o grau mais avançado de microcefalia – com o perímetro cefálico três vezes menor do que o padrão para o sexo e idade gestacional.
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INFOGRÁFICO: Microcefalia x Zika Vírus
O estudo, coordenado pela Sociedade Brasileira de Genética Médica e publicado recentemente no semanário do Centro de Controle de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, analisou a situação de bebês com a má-formação nascidos entre agosto e outubro de 2015, os quais testaram negativo para outras infecções congênitas e as mães moravam ou visitaram áreas afetadas pelo zika. O levantamento ainda é preliminar e avaliações de outras crianças com microcefalia associada ao zika continuam sendo realizadas.
Foi notado em muitos desses bebês calcificações cerebrais generalizadas e um excesso de pele do couro cabeludo. Segundo os pesquisadores, esse é um indicativo de que houve uma lesão cerebral intra-uterina aguda, que comprometeu o crescimento do cérebro. Muitos desses bebês também têm dificuldades de deglutição e problemas oftalmológicos.
Essas características são percebidas e relatadas também por quem está na ponta do atendimento às crianças com microcefalia, como a pediatra Kátia Guimarães, diretora técnica do Centro de Reabilitação (CER) Menina dos Olhos, no Recife. Um dos centros de referência da rede de tratamento para crianças com microcefalia na região, o local trata atualmente de 135 crianças e se prepara para ampliar a equipe de atendimento.
“Estamos todos ainda vivendo o impacto dos acontecimentos. Agora, começamos a nos organizar para enfrentar esse desafio”, comenta Kátia. O estado de Pernambuco é o mais afetado pelo surto de microcefalia que assusta o país. Até o momento, dos 404 casos relacionada a infecção congênita confirmados no Brasil, 153 estão no estado. Desses, em 12 se constatou a infecção por zika vírus no bebê. Um forte indicativo de que o vírus foi o responsável pela má-formação.
Tratamento
Na rede de atendimento a essas crianças estão fisioterapeutas, fonoaudiólogos, neuropediatras, psiquiatras, psicólogos, oftalmologistas, otorrinolaringologistas e pedagogos. O tratamento começa logo nos primeiros meses de vida, com uma série de exercícios de estimulação. Em alguns casos, é preciso até mesmo ensinar a criança a mamar, porque elas não sabem como engolir.
Fora da clínica, os exercícios continuam, com brincadeiras para estimular as habilidades motoras, auditivas e visuais do bebê. A intenção é fazer com que a criança desenvolva ao máximo as suas potencialidades. Nesse contexto, a família também precisa de atenção. Mães, pais e outros cuidadores recebem orientações e ajuda para inserir a nova rotina de cuidados ao cotidiano. “Trabalhamos com três pilares: reabilitação, empoderamento e apoio”, explica Kátia.
OMS tem três classificações para a má-formação
- Laura Beal Bordin
A diferenciação entre microcefalia leve, moderada ou grave é feita pela Organização Mundial da Saúde (OMS) com base na medição do crânio do bebê em relação à idade gestacional. Caso esta relação sofra um desvio padrão igual ou menor que 2, o bebê pode ser diagnosticado com microcefalia leve– em uma gestação de 40 semanas, isso representa um crânio com tamanho 31,4 cm. Já quando o desvio padrão é igual ou menor a 3, a microcefalia pode ser considerada grave. Neste caso, o crânio teria uma medida de 29,9 cm.
O neuropediatra da Sociedade de Pediatria de São Paulo, Carlos Takeuchi, afirma que apesar de bebês com cabeças menores normalmente apresentarem uma gama maior de problemas neurológicos, esta não é a regra. “Normalmente, um bebê com o crânio menor acaba tendo mais complicações, já que se parte do pressuposto de que uma criança com microcefalia apresenta um subdesenvolvimento”, explicou. De acordo com Takeuchi, o tratamento de crianças com microcefalia leve ou severa não muda. “Qualquer tipo de microcefalia é grave e compromete o sistema motor e neurológico da criança”, disse.
O neuropediatra do Hospital Pequeno Príncipe, André Malheiros, afirma que existem dois tipos diferentes de microcefalia – a primária, que é adquirida de forma genética, e a secundária, que é por contaminação, como no caso do zika vírus. De acordo com Malheiros, não há relação direta entre as sequelas que a criança pode apresentar e o tamanho do crânio, já que a infecção pode atingir áreas distintas do cérebro. “Normalmente sim, um crânio saudável pressupõe um cérebro saudável, mas dependendo das áreas afetadas o bebê pode apresentar manifestações clínicas distintas”, comentou. “O quadro neurológico se assemelha ao da paralisia cerebral –algumas pessoas ficam com grandes sequelas, outras não. Isso depende da área do cérebro que foi afetada pela infecção”, explicou o neurologista.
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