Uma suposta rede de contrabandistas de cigarro formada por agentes públicos de várias áreas, como policiais militares e civis e servidores da Assembleia Legislativa do Paraná (Alep), foi desmantelada pela Polícia Federal (PF) na manhã de ontem. A operação Fractal prendeu ao menos 22 pessoas no Paraná, entre elas oito policiais militares, um investigador da Polícia Civil e o chefe de gabinete do deputado estadual Waldyr Pugliesi (PMDB), Elieuton Francis Mayer. Mais de 40 pessoas estão sendo investigadas por crimes variados, como tráfico de influência, contrabando, descaminho e extorsão. A quadrilha também agiria nos estados de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul.
Além das prisões, a PF cumpriu ontem vários mandados de condução coercitiva, uma forma de obrigar o investigado a prestar esclarecimentos. O coronel Carlos Alexandre Scheremeta, ex-corregedor da Polícia Militar do Paraná, foi um dos conduzidos até a sede da PF em Curitiba. No interior do estado, foram encaminhados para prestar esclarecimentos o delegado da polícia civil José Aparecido Jacovós, de Campo Mourão, e um outro servidor da Alep. A PF também cumpriu mandado de busca e apreensão na residência de um policial federal em Curitiba.
Esquema
Segundo a PF, o assessor parlamentar Elieuton Francis Mayer coordenava uma série de ações de tráfico de influência com o objetivo de transferir policiais militares para postos na fronteira com o Paraguai, onde os agentes facilitavam o contrabando de cigarros, principal fonte de renda da quadrilha. Os policiais também também extorquiam contrabandistas de grupos concorrentes.
Umuarama e Curitiba seriam duas das cidades em que o núcleo central da quadrilha agia. "Há infiltração em várias esferas da administração pública", afirmou o novo superintendente da PF no Paraná, Rosalvo Ferreira Franco.
De acordo com o coordenador da investigação, delegado José Iegas, Mayer era o principal articulador da quadrilha. Segundo ele, durante as investigações vários deputados foram mencionados, mas não há indício de que eles tenham participado das atividades criminosas. Por isso, os parlamentares não são alvo da investigação, que continua. A apuração corre sob segredo de Justiça.
Patrimônio
A PF se surpreendeu com o nível social de alguns dos investigados. Mayer, por exemplo, mora em um condomínio de alto padrão no bairro Portão. Outro investigado preso na operação foi encontrado com um veículo BMW branco, e havia um Jetta em sua residência, também em um condomínio de alto padrão no bairro Orleans. Muitos veículos foram apreendidos, além de documentos e outros pertences. Os lucros da quadrilha seriam lavados em jogos ilegais em Santa Catarina.
Prisão de policial rodoviário foi o ponto de partida
Osmar Nunes, correspondente
O ponto de partida para a desarticulação do grupo que se utilizava da corrupção para facilitar o contrabando a partir da fronteira com o Paraguai foi a prisão de um policial rodoviário no posto de Cruzeiro do Oeste há dois anos, segundo revelou ontem o procurador do Ministério Público Federal em Umuarama Robson Martins, que acompanhou as investigações.
Por meio de depoimentos, gravações e investigações foi apurado que os produtos contrabandeados cruzavam o Rio Paraná, de Foz do Iguaçu a Altônia, e seguiam até um núcleo em Maringá e outro em Curitiba, de onde eram distribuídos também para outras partes do Brasil. O procurador disse que ficou assustado ao descobrir as ramificações e o tamanho da ação arquitetada pelo grupo.
Na opinião do procurador, o problema do contrabando e tráfico de drogas e armas na região Noroeste só vai diminuir com a instalação de uma delegacia da PF em Umuarama. A cidade já fez até manifestação e uma comitiva de lideranças foi a Brasília pedir o reforço policial, no entanto, não há confirmação da liberação. Sem isso, o contrabando cresce sem parar.
O procurador apurou ainda que pela região de Altônia entra hoje grande parte dos produtos contrabandeados. À noite o Rio Paraná é dos contrabandistas e dezenas de carros fazem o transporte sem serem incomodados. "Eu até entendo isso, porque os policiais mal conseguem dar conta da fiscalização em Guaíra", disse.
Detalhes
"Quadrilha queria derrubar comando da PM", diz a Polícia Federal
A investigação da Polícia Federal revelou um esquema para tentar derrubar o comandante-geral da Polícia Militar do Paraná, coronel Roberson Bondaruk. Segundo o secretário da Segurança Pública do Paraná, Cid Vasques, uma das interceptações telefônicas é clara ao afirmar que não havia qualquer negociação com o atual comandante geral. "Há um áudio em que um deles falou que com este comandante não tinha acerto", disse o secretário.
Bondaruk recebeu com naturalidade a notícia de que havia uma movimentação política para tentar derrubá-lo. De acordo com ele, que deu total suporte às investigações da PF, muitas pessoas tentam desmerecer o trabalho que o atual comando tem realizado no Paraná. Bondaruk afirmou que toda movimentação de criminosos contra ele faz parte da atividade de comandante. A Secretaria de Estado da Segurança Pública e a corregedoria geral da Polícia Civil também apoiaram a PF durante as investigações.
O comandante da PM informou que há, em vários casos, embasamento para abrir processo de exclusão de policiais investigados pela operação Fractal. "Paralelamente às ações penais, serão abertos inquéritos policiais militares", explicou. Os policiais militares investigados deverão ser afastados.
Surpresa
O deputado Waldyr Pugliesi (PMDB) disse à Gazeta do Povo que ficou surpreso com a prisão de seu assessor e que o suspeito trabalha na Assembleia Legislativa há mais de dez anos.
Policiais federais foram ao gabinete do peemedebista pela manhã e apreenderam documentos na sala do assessor. Pugliesi afirmou ainda que se colocou à disposição da PF para colaborar no que for necessário.
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