O curitibano sentiu os efeitos múltiplos da falta de transporte público na cidade durante toda a terça-feira. Ao menos por um dia, o conceito de rede se expandiu das linhas de ônibus para o cotidiano dos habitantes da capital. Todas as ações, decisões, adiamentos ou cancelamentos estavam de alguma forma atrelados ao piquete dos motoristas e cobradores.
Quando saiu de casa, às 6 horas da manhã, o gerente de estacionamento José Nilson Vasconcelos, de 59 anos, já esperava por um dia difícil, com excesso de clientes e falta de paciência. Porém, estava aliviado por não depender de ônibus. Dirigindo desde Campo Magro, na Região Metropolitana de Curitiba, desembocou na Avenida Manoel Ribas particularmente engarrafada. Foi colhido em um engavetamento junto com outros quatro veículos. No fim da tarde, esperava pelo genro, que lhe daria uma carona de volta para casa.
"Hoje foi dose pra leão. Tivemos de dispensar clientes. Carros grandes, como caminhonetes, nem aceitamos", conta. Sua filha, que não conseguiu chegar ao trabalho, acabou substituindo a operadora de caixa do estacionamento que teve o mesmo problema.
Outro profissional sobrepujado pela demanda foi o taxista Ary dos Anjos, de 54 anos. Assim como seus colegas, ele foi obrigado a deixar vários indicadores erguidos sem resposta, enquanto emendava 30 corridas antes do almoço. "Também tenho que recusar passageiros por causa do trânsito. Se deixei passar, não tem como dar a volta", completa.
O atendente de fast-food Rafael Lean Cardoso, de 16 anos, foi informado pela mãe sobre a greve ainda na noite de segunda. Pertencente ao turno que começa às 6 da manhã em uma lanchonete do bairro Tanguá, pegou a bicicleta e saiu de Colombo três horas antes, trafegando pela canaleta vazia. O amigo Tiago Oliveira da Silva, também de 16 anos, pedalava ao seu lado. "Ele [Rafael] falou que tava precisando de gente [para trabalhar] e daí fui lá ver", justifica o rapaz, consolado pelo fato de o esforço ter lhe valido um emprego novo.
Movimento incomum
Na mesma canaleta da Avenida João Gualberto, um punhado de estudantes do Colégio Estadual do Paraná assistia ao movimento pouco comum de bicicletas, patins e skates, além de vans e táxis que passavam em velocidade. Sentados na mureta em frente do prédio, afirmaram não ter conseguido sequer chegar à sala de aula. "Não tinha funcionário para destrancar as salas. Depois de um tempo apareceu um professor e juntou os alunos de todas as turmas para uma partida de vôlei, de tão poucos alunos que tinha", narra um deles. A direção do colégio afirmou que as aulas foram mantidas para os alunos, embora com programação específica para evitar que a maioria faltante perdesse conteúdo.
No fim da tarde, enquanto se aproximava o horário de pico da volta para a casa, as primeiras lotações autorizadas pela Urbs começavam a estacionar em pontos da cidade que habitualmente concentram passageiros de ônibus. Todos invariavelmente cobrando a tarifa máxima de R$ 5 permitida pela prefeitura.
O produtor de eventos Alex Tizon, de 35 anos, estacionou seu Fiat Uno em frente ao tubo da linha Colombo-CIC, na Praça Tiradentes. Seu trajeto é bem mais flexível, no entanto. "Vou para qualquer lugar que não seja muito longe", explica. "O carro é pequeno e nem sempre lota, mas é econômico e a canaleta está liberada. Então não tem problema".