A extração de areia em área de preservação ambiental está sendo reativada em Piraquara com o apoio da prefeitura. Um projeto do Executivo municipal prevê a liberação temporária da atividade em troca da doação dos imóveis, ao fim do período, para a criação de parques no bairro do Guarituba. A intenção é conter novas ocupações irregulares na área que contém mananciais e fornece água para o abastecimento de Curitiba. A extração já está acontecendo em duas propriedades, que totalizam 800 mil m², às margens do Rio Iraí. A atividade tem impactos ambientais e pode afetar os lençóis freáticos.
De acordo com o projeto da prefeitura, os proprietários que possuem licença de lavra de areia junto ao Departamento Nacional de Produção Mineral receberão a anuência prévia para a atividade desde que se comprometam a adequar o terreno e doá-lo ao município. Não há prazo fixo para as liberações. O documento é obrigatório para a requisição das licenças de instalação e operação ao Instituto Ambiental do Paraná (IAP). Entre as adequações do terreno está a transformação das cavas remanescentes da extração em lagos com, no máximo, 1,5 metro de profundidade e pistas para caminhada ao redor, além da construção de banheiros e quadras de areia para a prática esportiva. As duas propriedades em atividade já abrigaram areais no passado e contêm cavas antigas, que deverão ser adequadas.
A intenção é criar parques para conter a expansão das ocupações irregulares nas áreas com restrições ambientais. Reportagem da Gazeta do Povo, de 20 de fevereiro, mostrou que, enquanto a situação de 9 mil famílias que moram no Guarituba está sendo regularizada pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), do governo federal, outras mil famílias já ocupam terrenos irregulares dentro e fora da área restrita.
O Guarituba é uma Área de Proteção Permanente (APP) e a legislação proíbe qualquer tipo de mineração em regiões com esta denominação. No entanto, a liberação dos areais pelo município e pelo IAP se baseia na Resolução 369 de 2006 do Conselho Nacional de Meio Ambiente que abre exceções para os casos em que há utilidade pública, interesse social ou baixo impacto ambiental. Os órgãos consideram que o projeto atende esses requisitos, uma vez que visa à interrupção das ocupações em área de manancial, à criação de parques públicos e prevê compensações ambientais por parte do extrator.
Impactos
A extração de areia ocasiona uma série de impactos ambientais e de vizinhança. Entre eles está a supressão da vegetação, a alteração do solo e o afugentamento de animais. Os mais preocupantes, no caso de Piraquara, são a possibilidade de contaminação da água por graxas e óleos das máquinas ou por substâncias do próprio solo que são revolvidas e a alteração de lençóis freáticos.
"Não deveria haver extração nem moradias na região, pelo fato de ser uma área de manancial", julga o geólogo João Nogueira. "A solução ideal para as cavas seria a cobertura com lama devidamente tratada. Como a água da região já está contaminada pelos dejetos das moradias irregulares, a atividade não contribuiria muito para piorar a situação. A prefeitura aposta, inclusive, na contenção dessas moradias, mas tudo depende do prazo de exploração. Se o proprietário extrair por 20 anos, dá na mesma que uma nova ocupação."
A consultora ambiental Gisele Sessegolo explica que o risco de impacto no lençol freático é maior onde o veio dágua é superficial caso de Piraquara. "É possível minimizar os danos se obedecidos se obedecer certos parâmetros, mas algum impacto sempre haverá", pondera.
Por décadas, a extração de areia aconteceu ilegalmente em Piraquara, até 2001, quando o Ministério Público do Paraná impediu na Justiça a concessão ou renovação de licenças para a atividade pelo IAP visando proteger os mananciais da região. O coordenador do Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Proteção ao Meio Ambiente, procurador de Justiça Saint-Clair Honorato dos Santos, desconhecia a situação no município mas julga que a atividade não pode voltar. "Não importa que os órgãos tenham circundado a questão da APP: a área é de manancial e não pode ter areais", afirmou.
O secretário de Meio Ambiente de Piraquara, Gilmar Zachi Clavisso, afirma que o projeto é a única forma viável de conservar a área. "Somos o município mais pobre da região metropolitana, não há recursos para as desapropriações onerosas que cabem neste caso. Esse foi o melhor instrumento que encontramos para tomarmos conta dessas áreas", defende.